sábado, 24 de abril de 2010

Como se tornar cidadão

24/04/2010

Criei este blog em fevereiro de 2006, ano da última sucessão presidencial. Escolhi o nome “cidadania” para um blog de política porque pretendia estimular as pessoas a agirem como cidadãs através do meio mais legítimo e representativo que entendia – e que continuo entendendo – existir, que é fazendo escolhas políticas e lutando por elas.

Justamente porque entendera que a afazia política do brasileiro estava na raiz de nosso subdesenvolvimento, pois finalmente me dera conta de que a aristocracia étnico-econômica-regional brasileira trabalhava duro, através de seus meios de comunicação, para afastar a sociedade da política para que as escolhas que cabiam a todos lhes fossem delegadas por omissão de uma maioria ignara.

Pouco me importa se alguém não acreditar: afirmo que criei este blog com a finalidade de dar bons exemplos de conduta como cidadão e como ser humano porque entendo que há fartura de maus exemplos sendo continuamente veiculados pelo que se convencionou chamar de “mídia”, raiz da idéia insensata que infesta esta sociedade de que “não adianta se importar com a política porque todos os políticos são iguais”.

Para ser compreendido, terei que lhes contar mais sobre a minha vida. Começando pela adolescência, que irrompeu durante a fase mais dura do regime militar. Então, eu pertencia a uma família abastada e centenária da capital paulista e, talvez por isso, tinha uma mentalidade da qual hoje me envergonho e a qual sinto que devo confessar.

Era um playboyzinho inconseqüente que só sabia torrar dinheiro e ridicularizar outros da minha idade que se envolveram com política e até tombaram por seus ideais. Gosto de acreditar, porém, que eu era assim devido a problemas familiares.

Meus avós terminaram de me criar porque meu pai se casou com a minha mãe para tentar dar um “golpe do baú”. Não obtendo sucesso, abandonou a família quando eu tinha cinco anos, enquanto que aquela que me pôs no mundo faleceu quando eu tinha onze.

Só fui começar a “acordar” para a vida porque torrei minha herança na farra e, como se não bastasse, casei–me muito cedo. Constituí família porque, como já não tinha mais família de origem além de minha avó, que já era uma anciã, queria construir uma família só minha, pois me sentia só no mundo. Desta maneira, eu e minha Cristina nos casamos sem que eu jamais tivesse trabalhado na vida, tendo, até então, só estudado.

Como se pode imaginar, comemos o pão que o diabo amassou. Eu era orgulhoso e não aceitava nada da família dela. Eu, que fui criado nos salões das elites paulistanas, que estudara nas melhores escolas da capital, tais como Dante Aligheri, São Luis e São Bento, agora, aos 22 anos, tinha ido viver em um cortiço com mulher e filha e trabalhava como estoquista, de macacão, em uma distribuidora de autopeças.

Talvez por isso eu tenha passado de filhinho de papai mimado e irresponsável a alguém que passou a perseguir a cidadania como quem caça um tesouro e que nunca mais soube o que era ser irresponsável, tendo constituído uma família maravilhosa, com mulher, quatro filhos, dois genros, uma neta e um cachorro.

Porém, nunca, nesta vida, fiquei desempregado. E nunca parei de estudar. Não tinha mais condições financeiras de prosseguir com os estudos, depois que me casei, porque ganhava nem dois salários mínimos e a minha mulher, que para poder trabalhar deixava a nossa filha primogênita – que ainda era um bebê – com a mãe, ganhava outro tanto.

Então passei a me auto-instruir. Pegava livros emprestados e os copiava na copiadora da empresa em que trabalhava. Todos os dias, ao fim do expediente, lia, avidamente – às vezes até tarde, antes de ir para casa – aquele exemplar do Estadão que os patrões jogavam fora.

Aliás, faço uma digressão para destacar que ler o Estadão era um costume de família que adotei aos 13 anos. Ou seja: quando eu era aquele “playboyzinho irresponsável”, meu “crime” era mais grave porque sabia o que acontecia no país, que era oprimido por uma ditadura. E, apesar de saber que o que estavam fazendo com o país era errado, achava que não me dizia respeito.

Mas eu sabia o que era ser cidadão. Comecei a ler pensadores ainda na infância. Minha mãe – mulher de grande cultura, socióloga, advogada e fluente em sete idiomas – me fez ler todos os mais importantes clássicos da literatura infanto-juvenil entre os seis e os sete anos – Conde de Monte Cristo, Moby Dick, A Ilha do Tesouro, As Viagens de Gulliver etc. Aos sete anos, eu desenhava histórias em quadrinhos de super-heróis, com legendas e enredo.

O resultado foi o de que dez anos depois eu era empresário. Lembro-me da primeira vez em que estive em Paris, depois de participar de uma feira do meu segmento (autopeças) em Frankfurt. Lá do alto da Torre Eiffel, contemplava a Cidade Luz e me espantava com a forma como conseguira mudar minha vida em uma única década: através do autodidatismo.

Contudo, por não ser “doutor”, achava que aquela gana por dar à sociedade o que eu negara na juventude jamais teria conseqüência, pois não tinha a formação formal necessária. Enfim, não podia fazer nada por um país que a ditadura tornara ainda mais injusto, egoísta e incivilizado, sendo, então, um dos mais desiguais do mundo.

Tudo começou a mudar a partir de 1989, quando passei a conhecer melhor aquele líder sindical que surgira havia alguns anos e que provocara efervescência social e um ímpeto libertário no país com as greves que desencadeou e comandou no ABC paulista.

Até o segundo turno da primeira eleição presidencial depois de duas décadas de ditadura, porém, deixara-me engabelar por essa imprensa que está aí. Tinha uma mentalidade muito mais conservadora, formatada por aquele vírus de conformismo que jornais, revistas, tevês e rádios disseminavam.

Julgava Lula um “radical”. Contudo, quando Fernando Collor de Mello surgiu no cenário e ameaçou se eleger, trazendo consigo as forças políticas que haviam compactuado com os ditadores, e quando vi o meu jornal e o resto da imprensa compactuarem com aquilo, percebi que ser radical era bom, num país como o Brasil.

Votei em Lula em 1989, então, e nunca mais parei. Até que ele se elegesse presidente, porém, achava que, por não ter títulos, eu jamais seria ouvido ou levado a sério, apesar de saber muito bem o que se passava no país.

Mas tudo mudou com a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva. Foi-me uma inspiração. Um homem que tivera uma vida muito mais dura do que a minha, que superara barreiras que eu, apesar de tudo que sofrera, nem sequer podia imaginar – sobretudo o preconceito, a maior de todas –, tornara-se o primeiro mandatário da República.

Lula me fez acreditar que um homem comum, que qualquer cidadão, mesmo sem títulos, sem maiores credenciais, pode, sim, mudar os rumos da nação. É por isso, portanto, que criei este blog. É por isso que acredito que posso ajudar a mudar a realidade brasileira, que posso influir em qualquer coisa tanto quanto qualquer um de vocês que me lêem. E é por isso que escrevi este texto.

Qualquer um pode fazer o que tenho feito com outros que pensam como eu, pois vimos fazendo apenas com idéias na cabeça e teclados de computador nas mãos. Se mais brasileiros se tornarem cidadãos, elite nenhuma, nem com todas os seus jornais, tevês, rádios e portais de internet poderá impedir que este país se torne justo para todos.

Este texto pretende mostrar que qualquer um pode se tornar cidadão porque todos têm os meios. Seja com blogs, seja difundindo cidadania, bons exemplos de solidariedade e de humanismo. Jamais se acomodando e dizendo sim quando é imperativo dizer não, jamais cedendo a esse vírus comodista com que as elites infectaram a nação.

Não deixe de ler o post anterior a este

Se você não leu o post anterior, não deixe este blog sem ler. Trata-se da reprodução da Representação que o Movimento dos Sem Mídia fez ao Ministério Público Eleitoral pedindo que TODAS as pesquisas de opinião divulgadas ou que ainda serão feitas sejam auditadas pela Justiça Eleitoral.

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Escrito por Eduardo Guimarães às 13h16

Matéria publicada por Leda Ribeiro (Colaboradora do Blog)

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