Crônicas do Motta
Passo os olhos pelas capas dos principais portais informativos da
internet. No da Folha, um título me chama a atenção: Para leitor, fala
de Dilma sobre bancos é 'populista'. Abro a nota e leio o seguinte:
"O arrogante e agressivo pronunciamento da presidente Dilma Rousseff
no rádio e na TV deixou claro o populismo de nosso governo, pois juros,
colocados aparentemente por equívoco no discurso presidencial do 1º de
Maio, passaram a fazer parte do repertório eleitoral, como se está
verificando.
Marketeiros comprovaram a força da expressão e esperamos muitas
referências a eles até as próximas eleições. Isso apenas lembra atos de
governos populistas recentemente ocorridos na América do Sul, com as
estatizações de uma petroleira na Argentina e de uma distribuidora de
energia na Bolívia, ambas estrangeiras.
Só para lembrar, os juros em cheque especial no Banco do Brasil no dia 27/4 eram de apenas 94%."
O sujeito que mandou a mensagem deve existir, mas é estranho que o
jornal escolha exatamente aquela que critica a presidente por pelo menos
tentar convencer os bancos privados a baixar as suas taxas. Mais
estranho ainda é o fato de que, de várias maneiras, os nossos jornalões
estão defendendo o juro alto, que, na teoria, é tão prejudicial a eles
quanto para o resto do empresariado ou dos trabalhadores.
O tal leitor que escreveu a mensagem pode muito bem ser um alto
funcionário de algum banco, pode mesmo ser um banqueiro, ou simplesmente
achar sinceramente que a presidente fez um pronunciamento "arrogante e
agressivo" para o 1º de Maio, que deixou explícito o seu "populismo".
Como este é um país que se supõe democrático, cada um pensa o que quiser
e age como quiser, desde que esteja dentro dos limites da lei. Isso é
bom porque por meio dessas opiniões variadas pode-se ter a noção do
acerto ou do erro de uma determinada medida.
Pela mensagem escolhida pela Folha o que se nota é uma preocupação com o
possível uso eleitoral da queda dos juros, comparada pelo sujeito que a
mandou às ações de estatização feitas pela Argentina e Bolívia - no seu
entendimento, os governos que baixam os juros e retomam o controle de
empresas de setores estratégicos para a economia são "populistas".
Enfim, cada um pensa o que quiser...
Mas é dessa forma dissimulada, sutil, que age a nossa imprensa em
determinados casos. Não seria adequado criticar a presidente de imediato
por ela querer baixar os juros, pois afinal é isso que 99,9% da
população brasileira quer. Então, se adota outra tática, espalha-se o
veneno em alguns lugares, planta-se a semente da dúvida aqui e ali para
convencer alguns incautos de que se o governo quer baixar os juros é
porque isso vai ser bom para ele e para mais ninguém.
Acho que é desnecessário dizer que os bancos são grandes anunciantes,
prestam uma grande ajuda aos nossos jornalões, e até um deles, o
Estadão, funciona, já faz alguns anos, sob a intervenção de banqueiros. A
pauta das editorias de economia é quase toda ditada pelos departamentos
econômicos das instituições financeiras, que distribuem com presteza e
generosidade dezenas de "papers" cheio de números com todo o tipo de
análise da área, obviamente que puxando a sardinha para o seu lado.
Há muitos anos a Fiesp e outras entidades empresariais deixaram de
apitar nos jornalões. A visão macroeconômica que é passada ao leitor é,
portanto, desequilibrada, aponta apenas para o lado do rentismo, do
mercado financeiro, e não da produção.
O governo Dilma pode mesmo ter pensado em faturar alguma coisa mais com a
queda dos juros. Claro que se os planos derem certo a sua popularidade
aumentará. E, com mais respaldo, poderá fazer outras coisas boas para o
desenvolvimento do Brasil, como, por exemplo, construir mais casas, mais
hospitais, mais escolas, mais estradas...
Isso é populismo? Se for, ótimo. Viva o populismo, então!
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