Nos últimos dois anos, segundo a PF em Itajaí, a quantidade de imigrantes da Europa dobrou
Manuela Cendron, natural da Itália, escolheu Balneário Camboriú para cursar faculdade e decidiu ficar
Foto: Marcos Porto / Agencia RBS |
A oportunidade de trabalho no exterior levou, por muito tempo, milhares
de brasileiros aos países da Europa. Mas a crise que assola o Velho
Mundo tem obrigado os europeus a fazer o caminho inverso. Nos últimos
dois anos, segundo a Polícia Federal em Itajaí, a quantidade de
imigrantes vindos da Europa que chegaram à região dobrou.
Espanhóis, italianos e portugueses têm redescoberto o Brasil - e a nossa
região - e encontram na facilidade de comunicação e na oferta de
empregos uma oportunidade de driblar a crise. Assim como há mais de 500
anos, o país volta a representar a promessa de uma vida melhor.
- Há muito descontentamento na Europa desde a instalação do Euro. Tive
muita sorte no Brasil, demonstrei meu valor e achei pessoas interessadas
no meu trabalho. Sinto-me privilegiado porque hoje tenho dois países -
diz o chef italiano Amedeo Scavello, 38 anos, que saiu da Calábria para
viver em Balneário Camboriú.
Scavello já havia morado em São Paulo e Porto Seguro, mas acabou
conquistado pelo ar europeu do Sul. Como ele, a portuguesa Pâmela Abreu,
44 anos, também tinha São Paulo como primeira escolha - mas não
adaptou-se à cidade e a trocou por Balneário Camboriú. Pâmela deixou em
março a Ilha da Madeira para viver com o marido, que já estava há um ano
no Brasil. Coordenador de marketing, ele encontrou aqui as
oportunidades que já não tinha na terra-natal.
- A crise econômica é muito grave, o governo vem aumentando impostos, o
preço de tudo aumentou e as pessoas têm dificuldade em pagar as contas.
Com isto, o dinheiro não roda, muitos comércios fecham. Não há trabalho e
o desemprego continua a subir - relata Pâmela.
Formada em Turismo, ela coordenou por 12 anos um resort cinco estrelas e
fala fluentemente inglês, francês e espanhol - mas o currículo tem sido
empecilho na hora de buscar emprego. Para viver, Pâmela tem feito uso
da habilidade em terapias naturais.
- Não sei se é porque as pessoas não me conhecem, ou porque imaginam que
vou querer um salário muito alto, mas me surpreendi com a dificuldade
que estou tendo em trabalhar na minha área.
Na agência do Ministério do Trabalho, em Itajaí, é comum aparecerem
europeus em busca de informações para retirada da carteira de trabalho.
Deise Cristina da Silva, chefe substituta da agência, diz não ter uma
estimativa de quantos já fizeram a retirada do documento, mas lembra de
ter atendido pelo menos três solicitações nas últimas semanas. A maioria
dos estrangeiros, segundo ela, acaba em empregos com menor qualificação
do que teriam na Europa.
- Atendemos um casal de portugueses que tinha um açougue, mas tiveram
que fechar e vieram trabalhar como empregados. Também um espanhol que
conseguiu emprego no porto, como tradutor.
Delegado chefe da Polícia Federal em Itajaí, Luciano Raizer explica que,
embora existam acordos com alguns países que facilitam a entrada e
permanência dos estrangeiros no Brasil, para trabalhar regularmente por
aqui é preciso ter visto especial:
- Se a intenção é trabalho, é preciso solicitar o visto ainda no país de origem, no consulado brasileiro.
Oportunidade convence estudantes a ficar
Enquanto parte dos europeus que chegam à região vêm em busca de
trabalho, outros escolheram o Litoral Centro-Norte para a experiência de
um intercâmbio de estudos no exterior - e não pensam em voltar. A falta
de emprego nos países de origem é apontada como o principal motivo para
que se mantenham longe de casa.
Italiana, Manuela Cendron, 23 anos, sempre gostou de viajar. Acabou
escolhendo Balneário Camboriú para cursar a faculdade de Turismo três
anos atrás. Prestes a ingressar nos últimos semestres de estudos, conta
que desistiu da ideia de exercer a profissão na Itália:
- Meus pais e meus amigos me aconselham a arrumar trabalho aqui, porque
não tem emprego para ninguém lá. As pessoas têm estudo, mas a
concorrência está muito elevada.
David Ganzon, 23, passa por situação parecida. Espanhol, chegou à
Univali como intercambista no curso de Comércio Exterior, cinco meses
atrás. Conseguiu uma vaga de estágio em uma empresa de logística, em
Itajaí, e está convencido a permanecer no Brasil:
- Com a situação da Europa em crise, o elevado desemprego, penso que devo ficar.
Crise é consequência de má administração
A crise europeia está diretamente ligada à má administração pública,
segundo a professora Cláudia Beatriz Batschauer da Cruz, mestre em
Estudos Europeus. Investimentos grandes e desnecessários feitos durante
décadas, aliados ao excesso de mão de obra no funcionalismo público,
afetaram principalmente países como Grécia, Portugal, Irlanda e Itália.
- Endividados, os países não puderam mais emitir moeda e gerar inflação. Se viram sem saída - explica Cláudia.
Como resultado, subiram os índices de desemprego e, consequente, o
endividamento da população. Nos países mais atingidos pela crise, são
comuns os protestos contra a perda de vagas de trabalho. Quem está
empregado também sofre com a suspensão de benefícios.
Segundo Claudia, embora nem todos os europeus consigam empregos
condizentes com a formação que têm, a falta de mão de obra qualificada
no Brasil representa uma boa oportunidade de se manter ou se inserir no
mercado de trabalho.
Para entrar no Brasil
- Estrangeiros que entram no país podem usar permissão para turismo, que
é válida por 90 dias, ou visto de trabalho, que deve ser solicitado
antes do embarque, junto ao consulado brasileiro no país de origem
- Quem entra como turista, mas decide trabalhar, precisa solicitar visto, sair do país e entrar novamente
- Nem toda profissão pode ser exercida livremente por estrangeiros no
Brasil. Médicos e engenheiros, por exemplo, precisam de documentação
especial para trabalhar na área
- Imigrantes ilegais estão sujeitos a multa e, quando notificados, têm oito dias para deixar o país
Dagmara Spautz | dagmara.spautz@osoldiario.com.brNo O Sol Diário
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