Celso de Mello. Foto: Nelson Jr./SCO/STF |
Os dias que antecederam à decisão, e mesmo as declarações subsequentes
de alguns ministros, foram marcados pela ideia de que a opinião pública
queria a rejeição desses embargos. Que a maioria do país exigia barrar
o direito de os acusados, mesmo aqueles considerados inocentes por
quatro juízes, serem submetidos a novo julgamento.
Da quinta-feira anterior, quando a sessão do plenário para deliberar
sobre o tema foi interrompida, ao dia da decisão, o tom do discurso
oposicionista no Congresso, na sociedade e na mídia “anti-lulopetista”
seguiu por esse caminho.
Os parlamentares da oposição, com alguma cautela, os colunistas da
“grande imprensa” sem qualquer embaraço. Todos desejavam evitar o
acolhimento dos embargos e lançavam ameaças veladas aos juízes caso o
fizessem. Anunciavam a ira da população sobre os ombros dos magistrados
se não mandassem todos os acusados imediatamente para a cadeia.
Último a se pronunciar e responsável pelo voto definitivo a favor dos
recursos, o ministro Celso de Mello mencionou a pressão. O tribunal,
frisou durante a leitura de seu voto, não pode “expor-se, submeter-se,
subordinar-se à vontade de maiorias contingentes”.
Ou seja, falou como se houvesse redigido seu voto contra o desejo da
nação, ou da sua parcela maior. Como se existisse qualquer evidência da
existência dessas “maiorias” e como se, caso confirmadas, devessem ser
consideradas “naturais”.
Cada um a seu modo, os veículos da mídia oposicionista fizeram de tudo
para dar substância à tese (e reforçar a pressão sobre o tribunal). O
Datafolha foi convocado a pesquisar as opiniões na capital paulista de
forma a permitir a manchete “Em São Paulo, maioria rejeita a reabertura
do mensalão”.
Um jornal mineiro esmerou-se” na quarta 18, estampou na primeira página
uma “carta a Celso de Mello”, escrita e assinada em nome (!?) dos
“cidadãos do estado de Minas Gerais”.
De maneira “técnica” ou tosca invocavam a “opinião pública”.
Como chegou o Datafolha ao resultado?
A pergunta sobre a aprovação ou rejeição à “reabertura do julgamento”
seguia-se a duas outras. A primeira pedia ao entrevistado que dissesse
se considerava o chamado “mensalão” um esquema de corrupção (…) com uso
de dinheiro público” ou “de arrecadação de dinheiro” para campanhas
eleitorais. A segunda afirmava: “Pessoas condenadas à prisão (…) querem
que o STF reveja (o julgamento)” e perguntava se o entrevistado estava
de acordo.
Em outras palavras, mencionavam-se expressões como “corrupção”, “uso de
dinheiro público” e “pessoas condenadas à prisão”, antes de indagar a
respeito dos recursos. Até quem nada sabe de pesquisa é capaz de
imaginar as respostas.
A pesquisa revelava, porém, outras nuances: a proporção de paulistanos
bem informados (o que está sempre associado ao interesse) sobre o
mensalão era de 19% e apenas 39% dava notas maiores que 6 para o
desempenho do STF durante o julgamento (considerado “ótimo” ou “bom”
por não mais de 21% dos entrevistados).
Tais números não são muito diferentes daqueles obtidos pelo Vox Populi
em pesquisa nacional realizada no ano passado, ainda no auge do
julgamento. Naquela época, aqueles que se acreditavam bem informados
sobre o assunto somavam 18%, mas apenas 12% sabiam dizer, de forma
espontânea, o nome do tribunal onde o julgamento ocorria.
Apesar do desinteresse e da desinformação, 30% dos entrevistados
consideravam que a “responsabilidade dos acusados estava provada”. Sob
outro ângulo, significa que 70% não tinham essa convicção. Mais: 30%
entendiam que apenas as culpas de alguns estavam comprovadas e 39% não
se julgavam em condições de responder. Não surpreendentemente, apenas
29% defendiam punições a todos os acusados.
Só 29% concordavam com a tese central da acusação, da existência de um
esquema de desvio de verbas públicas para comprar o apoio de deputados.
Informados do fato de os parlamentares acusados serem na sua maioria
do PT, 33% dos entrevistados consideravam “sem sentido” a imputação (e
38% não tinham opinião).
Em outras dimensões, via-se a força dos estereótipos. Apesar da baixa
(ou nenhuma) informação, 65% supunham que os acusados “ficaram ricos”.
Entre a minoria que se acreditava capaz de calcular o montante dos
recursos movimentados, 25% cravaram “mais de 1 bilhão de reais”.
A frase bombástica de que o mensalão teria sido “o maior escândalo” de
nossa história era subscrita por não mais de 21%. Para uma ampla
maioria (57%), haveria “outros casos, maiores ou iguais” (entre
indivíduos com educação superior, a proporção alcançava 69%). (PS.JCMA:
aqui a casa caiu!!!).
Em suma, ao se levarem em conta os resultados das pesquisas
disponíveis, pode-se dizer que não chega a um terço o contingente da
população crente na narrativa a respeito do mensalão criada pela
oposição, especialmente seu braço midiático. A meia dúzia de
mal-educados a destilar ódio pela internet e chatear os juízes não
expressa o conjunto da sociedade.
A opinião pública brasileira não concorda com a corrupção e anseia pela
punição dos corruptos. De todos. Ela não aceita a sonegação de
impostos de megacorporações de mídia, o estímulo de autoridades a
cartéis de fornecedores em troca de “apoio”, a existência de entidades
“sociais” que desviam recursos ou o caixa 2 em campanhas praticado
rotineiramente pelos partidos.
Quando alguém invoca “o sentimento da opinião pública” e atribui ao
conjunto da sociedade o pensamento de uma minoria, nada mais faz do que
um jogo político de segunda classe.
Do Blog COM TEXTO LIVRE.
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