Da Carta Maior - 30/06/2012
A FIESP decidiu contratar o ex-embaixador Rubens Barbosa como seu pensador político e porta-voz corporativo. O diplomata, conhecido por sua posição francamente neoliberal, vem combatendo com insistência, a política externa brasileira. Mas, pelo que parece, está prestando mau serviço à indústria de São Paulo, que tem, na Venezuela, um excelente mercado comprador.
Mauro Santayana
Em artigo famoso, Assis Chateaubriand qualificou, há 60 anos, os industriais de São Paulo de seu tempo, reunidos na FIESP e no Centro das Indústrias do Estado, como os fazedores de crochê. A FIESP decidiu contratar o ex-embaixador Rubens Barbosa como seu pensador político e porta-voz corporativo ao mesmo tempo. O diplomata, conhecido por sua posição francamente neoliberal, vem combatendo, com irritante insistência, a política externa brasileira, mesmo que o Itamaraty, sob o chanceler Antonio Patriota, tenha deixado de ser o que foi sob o governo Lula.
Barbosa acusou, ontem, sábado, a Argentina de estar destruindo o Mercosul, ao transformá-lo em instrumento político, em detrimento de sua natureza comercial, e criticou a inclusão da Venezuela no bloco. Talvez porque os grandes empresários de São Paulo, desde sempre, se nutrem do Estado, ele não atacou diretamente o governo brasileiro, nestas declarações mais recentes. O ex-embaixador em Londres e Washington – durante o governo Fernando Henrique - está sendo coerente com a sua posição ideológica e seu alinhamento conhecido aos interesses das grandes finanças. Mas, pelo que parece, está prestando mau serviço à indústria de São Paulo, que tem, na Venezuela, um excelente mercado comprador. Só no ano passado, exportamos US$ 4 bilhões e 591 milhões, e importamos US$ 1 bilhão e 270 milhões, e o superávit comercial com aquele país de US$ 3 bilhões e 321 milhões.
Como está sendo costumeiro, no Brasil – a exemplo dos Estados Unidos – os altos funcionários do Estado se tornam consultores de grandes negócios, tão logo se aposentam. Esse foi o caminho de Rubens Barbosa que, além de chefiar seu escritório de consultoria, tornou-se presidente do Conselho Superior do Comércio Exterior da Fiesp. Mas, como vemos, seu ódio ao governo venezuelano, chefiado por Chávez, levou-o a essas declarações, que contrariam os interesses dos exportadores paulistas.
A manifestação de Rubens Barbosa confirma a orquestração da direita, nacional e internacional, contra a entrada, automática – diante da ausência do Paraguai – no Tratado do MERCOSUL. Ora, daqui a poucos meses serão realizadas eleições presidenciais na Venezuela e, conforme as pesquisas, o presidente Chávez, debilitado pela enfermidade, talvez possa ser derrotado pelo seu oponente, Henrique Capriles. Ora, se isso ocorrer, o novo presidente poderá, se quiser, deixar o Mercosul e alinhar-se totalmente aos Estados Unidos. Não há nada, portanto, para que Rubens Barbosa faça do episódio uma tragédia.
O novo governo paraguaio ameaça deixar o Mercosul, mas o povo paraguaio não o acompanha, se dermos crédito aos comentários dos leitores dos jornais. O diário Última Hora, de Assunção, em seu lúcido editorial de ontem, recomenda a Federico Franco, e a seu chanceler, moderar a linguagem e buscar bom entendimento com os vizinhos. Com quase unanimidade, seus leitores responsabilizam os golpistas do Parlamento pelas medidas tomadas pelos países vizinhos.
Os oligarcas do Paraguai ameaçam deixar a Unasul e o Mercosul, e isolar-se – e esse é um direito do país -, mas é improvável que o povo os acompanhe. O Paraguai sabe que terá de se entender com os vizinhos, mesmo porque depende dos portos de Buenos Aires e de Paranaguá para o seu comércio internacional.
Os mais extremados sonham com uma aliança descarada com os Estados Unidos e a transformação do país em uma espécie de Israel, a ser armado e financiado pelo dinheiro americano. Outros falam em uma associação do país com a China. É claro que não podemos subestimar os ardis dos norte-americanos, que gostariam de transformar o Paraguai em uma base militar contra a América do Sul.
Mas, como disse, certa vez, o então governador Tancredo Neves a um embaixador norte-americano, o Brasil – apesar dos quislings e vassalos dos estrangeiros - é bem maior do que o Vietnã.
*Mauro Santayana é colunista político do Jornal do Brasil, diário de que foi correspondente na Europa (1968 a 1973). Foi redator-secretário da Ultima Hora (1959), e trabalhou nos principais jornais brasileiros, entre eles, a Folha de S. Paulo (1976-82), de que foi colunista político e correspondente na Península Ibérica e na África do Norte.
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