domingo, 5 de agosto de 2012

A história do mensalão por trás da cortina da mídia

Foto: Montagem/247  

Foi o maior e mais atrevido escândalo de corrupção da história ou uma farsa montada para derrubar o governo Lula? Defendemos aqui uma terceira hipótese: a de que o escândalo foi fruto de um acidente provocado por Carlos Cachoeira, que produziu reações em cadeia nas principais redações do País, como Veja, Época, Folha e Istoé Dinheiro

O que foi o mensalão? O maior e mais atrevido escândalo de corrupção de todos os tempos no Brasil, como quer o procurador Roberto Gurgel, ou uma farsa montada pela imprensa golpista para derrubar o presidente Lula, como argumentam os petistas?

As duas hipóteses estão em discussão, no momento em que o Brasil assiste ao “julgamento do século”. Nós, do Brasil 247, defendemos uma terceira hipótese: a de que o escândalo, ao menos nos meios de comunicação, foi fruto de um acidente, provocado por Carlos Cachoeira, que produziu um autêntico “efeito-borboleta”. Uma sucessão de causas e efeitos, que culminou na Ação Penal 470. E cujos impactos foram bem maiores do que Cachoeira seria capaz de prever.

Neste fim de semana, a revista Veja conta uma mentira. Diz que o mensalão foi denunciado pela revista, em 2005, na reportagem em que Maurício Marinho aparece recebendo uma propina de R$ 3 mil.

Ao contrário da história que hoje Veja escreve, aquela reportagem, de 18 de maio de 2005, nada tinha a ver com o mensalão e denunciava um alvo bem específico, que não era o presidente Lula, mas sim um de seus aliados: o deputado Roberto Jefferson, presidente nacional do PTB (leia aqui a íntegra). Eis alguns trechos do texto de Policarpo Júnior:

“Há uma cena recorrente na política nacional: são os políticos disputando, com unhas e dentes, a ocupação de cargos em todos os níveis de governo, da Esplanada dos Ministérios às câmaras municipais (...) Por que os políticos fazem tanta questão de ter cargos no governo? Para uns, o cargo é uma forma de ganhar visibilidade diante do eleitor e, assim, facilitar o caminho para as urnas. Para outros, é um instrumento eficaz para tirar do papel uma idéia, um projeto, uma determinada política pública. Esses são os políticos bem-intencionados. Há, porém, uma terceira categoria formada por políticos desonestos que querem cargos apenas para fazer negócios escusos – cobrar comissões, beneficiar amigos, embolsar propinas, fazer caixa dois, enriquecer ilicitamente. Quem tem intimidade com o poder em Brasília sabe que esses casos não são exceção – e em alguns bolsões de corrupção são até mesmo a regra. Raro, mesmo, é flagrar um deles em pleno vôo. Foi o que VEJA conseguiu na semana passada. (...) Nos trechos mais relevantes da conversa, Maurício Marinho explica que está ali em nome de um partido, o PTB, e sob ordens de um político, o deputado Roberto Jefferson, presidente do PTB. "Ele me dá cobertura, fala comigo, não manda recado", diz Marinho, mostrando toda sua intimidade com o cardeal petebista."
A reportagem de Veja, produzida pela equipe de Cachoeira, espalhou a cizânia no governo Lula, mas nem o mais maquiavélico dos contraventores seria capaz de prever as consequências. Nas eleições presidenciais de 2002, Cachoeira apostou no PT – e não no PSDB – prevendo que, assim, conseguiria legalizar o jogo no Brasil. Talvez tenha recebido alguma promessa, que não foi cumprida. Ao provocar a denúncia contra Maurício Marinho, atirou fezes no ventilador, mas ninguém poderia imaginar, naquele momento, o que faria Roberto Jefferson.

E a primeira reação do presidente do PTB não foi destemperada. Jefferson procurou o então aliado, José Dirceu, ministro da Casa Civil, porque já havia rumores de que outras matérias contra ele seriam publicadas na imprensa. Dirceu disse que conseguiria segurar as Organizações Globo, mas não a Veja, que seria, segundo o relato de Jefferson, “meio tucana”.

O fato é que Dirceu não segurou. E a revista Época, numa reportagem de capa datada de 6 de junho de 2005, mas que circulou no dia 2 do mesmo mês, denunciou um suposto laranja de Roberto Jefferson, na região do Vale do Paraíba, base eleitoral do deputado do Rio de Janeiro. Era assinada por Nelito Fernandes e o texto apontava um sorveteiro como laranja (leia trechos aqui).

Percebendo que seria triturado pelo PT, como aliás ocorre ainda hoje com tantos aliados do partido (Alfredo Nascimento, Wagner Rossi, Orlando Silva...), Jefferson foi à guerra. E decidiu então conceder uma primeira entrevista à jornalista Renata Lo Prete, no dia 6 de junho de 2005. Nela, afirmou que o PT pagava uma mesada aos partidos da base aliada (leia mais aqui).

O PT sofreu um baque, mas ainda era possível resistir. Líderes do partido afirmavam que Jefferson era um delator sem credibilidade. No dia 13 de junho de 2005, o presidente do PTB, em vez de recuar, avançou e concedeu então uma segunda entrevista a Renata Lo Prete, apontando Marcos Valério como operador do esquema.

Foi então que a revista Istoé Dinhero publicou uma entrevista com a ex-secretária de Marcos Valério, Fernanda Karina Somaggio, dando credibilidade ao que o deputado dizia. Karina dizia ter testemunhado os acordos para a entrega dos recursos via Banco Rural. O texto foi publicado no dia 15 de junho de 2005.

Estava aberta a porteira. Dois dias depois, José Dirceu caiu e foi substituído por Dilma Rousseff – hoje, presidente da República.

Eis o que é o efeito-borboleta. Insatisfeito com o governo Lula, que ensaiou uma legalização dos bingos, mas não cumpriu a promessa, Cachoeira plantou uma denúncia contra Roberto Jefferson em Veja. No jogo da concorrência, agindo estimulada por Cachoeira ou até pelo PT, que queria se livrar de um aliado incômodo, Época reagiu. Sentindo-se abandonado, Jefferson foi para o tudo ou nada. Quando falou em Valério, de onde menos se esperava – a revista Istoé Dinheiro – surgiu uma testemunha. Hoje Cachoeira está preso e 36 réus aguardam seu destino no “julgamento do século”.


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