Embaixador Antonio José Ferreira Simões, Subsecretário-Geral da América do Sul, Central e do Caribe |
"É preciso que a sociedade brasileira se conscientize do que significa ser a 5ª economia do mundo. Grande parte da população ainda tem uma imagem do Brasil como país periférico, de menor importância no cenário internacional. Mas essa imagem é totalmente equivocada. O Brasil, ao lado dos Estados Unidos e da China, são os únicos três países que estão, ao mesmo tempo, na relação dos dez países de maior território, dos dez países mais populosos e dos dez países com maior PIB no mundo. O principal desafio da diplomacia brasileira é, portanto, mostrar à sociedade brasileira que o Brasil precisa ter uma atuação externa à altura de sua potencialidade econômica, política e social".
A avaliação do embaixador Antonio Simões fornece a moldura geral de sua
análise sobre os mais recentes episódios envolvendo o processo de
integração regional. O modelo de integração do MERCOSUL, defende o
diplomata brasileiro, é distinto do modelo europeu que atualmente
atravessa grave crise. "Aqui, optamos por um processo de integração em
que, mais importante do que haver uma economia-âncora, é que as
sociedades de todos os países estejam envolvidas no processo de
integração".
Carta Maior: A que se deve essa constante instabilidade que pressiona periodicamente o Paraguai?
Antonio Simões: Um problema central no Paraguai é a fragilidade de suas
instituições, agravado pelo fato de que apenas uma pequena parcela da
população está efetivamente integrada à vida política. Essas debilidades
– que, convém frisar, são comuns a outros países da região – estão
estreitamente associadas aos períodos de exceção experimentados pelo
Paraguai, dos quais o mais longo e conhecido é o governo de Alfredo
Stroessner. Naquele período, além das restrições às liberdades
fundamentais, próprias de governos autoritários, criou-se no Paraguai um
regime de “prebendas”, de concessões do Estado, que tinha como vértices
o Partido Colorado, grandes empresários e proprietários de terra e
altas patentes das Forças Armadas.
Se compararmos a duração do Governo Stroessner – 35 anos, de 1954 a 1989
– com o período de redemocratização do país, que mal completou 23 anos –
de 1989 a 2012, temos a dimensão de quão debilitado – e
justificadamente - ainda pode estar o ordenamento institucional
paraguaio.
É nesse contexto que se deve destacar a relevância dos processos de
integração regional, como o MERCOSUL e a UNASUL. Como se sabe, as
cláusulas democráticas desses órgãos desempenham importante papel de
“estímulo positivo entre pares”, com vistas a desestimular aventuras
antidemocráticas na região. Mas isso não é tudo. As diversas instâncias
em que se estruturam esses mecanismos vêm contribuindo de forma
significativa para o fortalecimento e a harmonização institucional em
nível regional.
CM: Até que ponto a questão da propriedade e da posse da terra - o
Paraguai tem uma concentração histórica de grandes áreas em poucas mãos
- contribui para essa instabilidade? Até que ponto a pressão dos
grandes proprietários foi determinante para a deposição do presidente
Fernando Lugo?
AS: O modo como se deu a apropriação da terra é um problema estrutural
da organização social e econômica do Paraguai. É um tema antigo e
complexo, cuja solução parece constituir elemento fundamental para a
real democratização do país. Segundo dados oficiais, apenas 0,005% da
população concentram 25% da terra; 80% da terra, por sua vez, são
propriedade de apenas 2% da população.
Na região oriental do país, onde vive mais de 90% da população, apenas
2% das propriedades ocupam mais de 80% da superfície de terras agrícolas
do país. No outro extremo, as áreas agrícolas de menos de 5 hectares -
cerca de 40% em número de propriedades - representam menos de 1% da área
cultivada.
Não se trata, naturalmente, de problema exclusivo do Paraguai. O Brasil
viveu realidade similar por muito tempo. Entre nós, no entanto, a
questão tem sido bem encaminhada por meio de programas de reforma
agrária e de apoio estatal às famílias reassentadas para sua integração à
estrutura produtiva nacional. A agricultura familiar é responsável pela
produção de 70% dos alimentos consumidos pelos brasileiros e ocupa
aproximadamente 75% da mão de obra rural. A agricultura familiar
constitui, no Brasil, fator fundamental para a estabilidade social no
campo.
CM: Existe uma real responsabilidade histórica de países como Argentina e Brasil com relação ao Paraguai?
AS: Entendo que todos os países da América do Sul têm responsabilidades
históricas com seus vizinhos. Por isso, é importante que todos juntemos
esforços, nos planos interno e regional, para a criação e consolidação
de instituições que venham a estruturar “espaços regionais comuns”, como
o MERCOSUL e a UNASUL.
É no âmbito desses espaços comuns que precisamos trabalhar, com
pragmatismo e solidariedade, em prol de melhores condições de vida para a
nação sul-americana.
Não se trata de retórica. No caso específico do Paraguai, podemos citar
um exemplo concreto, entre vários outros. Está sendo implantado naquele
país, com recursos de contribuições brasileiras ao Fundo de Convergência
Estrutural do MERCOSUL (FOCEM), da ordem de US$ 400 milhões, um sistema
de transmissão de energia elétrica em 500 kV entre Itaipu e Villa
Hayes, nos arredores de Assunção. Trata-se de obra fundamental para
garantir o suprimento de energia elétrica no país, de modo a evitar os
frequentes apagões verificados em momentos de pico de demanda.
Ademais, esse sistema tem potencial para constituir-se em fator decisivo
na transformação da realidade econômica do Paraguai, ao ensejar a
instalação de indústrias que, atualmente, ainda que atraídas pela oferta
de energia barata e abundante, não dispõem de suprimento confiável.
CM: É possível avaliar os benefícios concretos do Mercosul para o Paraguai?
AS: A primeira coisa que devemos ter em mente é que o Paraguai é um país
sem litoral. Grande parte do comércio exterior paraguaio é feito via
território brasileiro ou argentino. Só isso já demonstra a importância
do MERCOSUL para o comércio paraguaio. Além disso, o Brasil é o maior
parceiro comercial do Paraguai. Nós somos o destino de quase 15% das
exportações paraguaias. Se tomarmos o caso do MERCOSUL, veremos que, em
2011, o bloco respondeu por um quinto da corrente de comércio do
Paraguai. Talvez mais importante que os totais é a composição da pauta
de comércio entre o Paraguai e os sócios do MERCOSUL: segundo estudos do
CADEP (“Centro de Análisis y Difusión de la Economia Paraguaya”), quase
60% das exportações de manufaturados do Paraguai em 2011 foram
destinados aos países do MERCOSUL e associados.
Além dos óbvios benefícios comerciais, a integração no âmbito do
MERCOSUL também compreende uma dimensão socioeconômica mais ampla. É o
caso do FOCEM, criado em 2007, com o objetivo de promover projetos para
superar as assimetrias entre os países do bloco. O FOCEM é uma das
experiências mais bem sucedidas do Mercosul. O Paraguai é o maior
beneficiário do Fundo: contribui com apenas 1% e recebe 48% dos recursos
totais. Já foram aprovados 18 projetos do FOCEM no Paraguai, em um
valor total de US$ 644,5 milhões. São projetos em áreas como habitação,
transportes, incentivos à microempresa, capacitação tecnológica,
melhorias sanitárias, entre outros. Nesse universo de projetos, merece
destaque a construção, já mencionada, da linha de transmissão entre
Itaipu e Villa Hayes, que está orçada em US$ 555 milhões e conta com
contribuições voluntárias do Brasil ao FOCEM da ordem de US$ 300
milhões.
É importante mencionar que a suspensão do Paraguai dos órgãos decisórios
do MERCOSUL não afetará nenhum projeto do FOCEM no país. Pelo
contrário. Na Cúpula de Mendoza, a mesma reunião que decidiu pela
suspensão do Paraguai, foram desembolsados US$ 66 milhões do FOCEM para o
projeto da linha de transmissão Itaipu-Villa Hayes. Essa é a prova do
nosso compromisso com o bem-estar do povo paraguaio. Essa foi uma
determinação expressa dos Presidentes dos Países do MERCOSUL em Mendoza.
CM: Qual o significado político e econômico da entrada da Venezuela no bloco?
AS: É preciso ter presente, antes de mais nada, que esta é a primeira
ampliação do MERCOSUL desde a sua criação em 1991. Isso, por si só,
possui um grande significado político: demonstra que o bloco permanence
vigoroso como projeto de desenvolvimento compartilhado e que tem poder
de atração sobre os países vizinhos.
O ingresso da Venezuela dá novo contorno geopolítico ao MERCOSUL. Em
primeiro lugar, o MERCOSUL deixa de ter um projeto centrado no Cone Sul e
amplia sua capacidade de irradiação para o Caribe e para a América
Central. A dimensão amazônica do MERCOSUL também é reforçada, o que dá
um novo sentido para o bloco, da perspectiva do desenvolvimento da
região norte do Brasil.
A presença de um país como a Venezuela, com sua densidade econômica e
seus recursos naturais, sobretudo energéticos, altera de maneira
significativa o peso internacional do MERCOSUL. As reservas de petróleo
venezuelanas são as maiores do planeta. Esse dado, somado ao potencial
do pré-sal brasileiro, à nossa liderança em energias renováveis, às
reservas argentinas de petróleo e gás e ao potencial hídrico do conjunto
do MERCOSUL, faz do bloco uma potência energética de primeira grandeza.
Se considerarmos que o MERCOSUL já era um dos principais produtores de
alimentos, vemos agora que o bloco é peça central para a equação de duas
questões centrais para o futuro da sociedade global: a segurança
energética e a segurança alimentar.
Do ponto de vista estritamente econômico e comercial, os ganhos com a
entrada da Venezuela são facilmente verificados. A Venezuela tem o
quarto maior PIB da América do Sul e a quarta população do continente.
Se tomado como conjunto, o MERCOSUL passa a ser a quinta economia
mundial, com uma população de 270 milhões de habitantes (70% da
população da América do Sul) e um produto interno de US$ 3 trilhões
(mais de 80% do PIB sul-americano).
Mais importante ainda é o fato de que há complementaridade entre nossas
economias. A Venezuela é um grande importador de alimentos. Há, sem
dúvida, um potencial de comércio a ser explorado nesse setor. Na outra
ponta do espectro produtivo, o país está também empenhando em reforçar
suas capacidades industriais, o que abre perspectivas para nossos
setores de máquinas e equipamentos. Há muito a ser feito em matéria de
integração produtiva, principalmente no setor petroleiro. E há uma nova
fronteira de investimentos e empreendimentos comuns que se abre com o
ingresso de um sócio com o peso da Venezuela no MERCOSUL, que entra
definitivamente em uma nova etapa de sua história.
CM: Existe uma regra estabelecida pelos países do bloco, segundo a
qual as decisões devem sempre ser tomada por unanimidade. Durante muito
tempo o Paraguai vetou o ingresso da Venezuela no Mercosul. Quais as
razões que levavam o Paraguai a agir dessa forma ?
AS: É preciso esclarecer que, no MERCOSUL, as decisões são tomadas, como
regra, por consenso. No caso da solicitação de adesão de novos Estados
Partes – e não da incorporação em si – exige-se unanimidade. A
solicitação de adesão da Venezuela, feita ainda em 2005, foi aceita por
todos os países do MERCOSUL, inclusive pelo Paraguai, com a Decisão
29/05 e com a assinatura do Protocolo de Adesão.
Durante muito tempo, o Congresso paraguaio – e não o Paraguai como um
todo – tratou com muita reserva a questão da entrada da Venezuela no
MERCOSUL. É muito difícil avaliar as razões para isso.
Particularmente, acredito que o Paraguai tem muito a ganhar com a
entrada da Venezuela. O Paraguai, grande produtor e exportador de
alimentos, poderá se beneficiar muito com as facilidades de comércio da
adesão venezuelana. Quase 70% dos alimentos consumidos na Venezuela são
importados, fazendo do país potencial mercado para as exportações
paraguaias. Além disso, a Venezuela deverá aportar recursos adicionais
ao FOCEM, que poderão ser aplicados em novos projetos no Paraguai,
contribuindo efetivamente para a melhoria na qualidade de vida do povo
paraguaio.
CM: A crise da UE - um processo de integração de quase 50 anos que
esfarela sob o peso da crise mundial - traz que lições à agenda da
integração latino-americana?
AS: Durante muito tempo, o modelo de integração da UE foi apontado como
uma “receita infalível” que deveria ser seguida por outras regiões no
caminho da integração. Ainda hoje, críticos da nossa integração apontam
que nosso modelo estaria fadado ao fracasso, por não reproduzir os
passos dados na UE.
Acredito que a crise econômica na UE demonstra que não há receitas
prontas. Precisamente no momento em que as economias europeias
apresentam grandes dificuldades econômicas, os países do MERCOSUL exibem
resultados positivos.
O MERCOSUL demonstrou que um processo de integração deve respeitar os
ritmos e as sensibilidades de cada país. A impressão que tenho é que a
União Europeia buscou estabelecer um mesmo manual para todos os membros,
e hoje, eles se dão conta de que medidas como a implantação do euro
talvez devessem ter sido mais lentas, mais graduais. Já no MERCOSUL,
evoluiu o entendimento de que mais importante do que avançar rapidamente
na integração econômico-comercial é adotar medidas que traduzam o
processo de integração em verdadeira melhoria da vida das pessoas.
CM: O embaixador Samuel Pinheiro mencionou recentemente a nova
estratégia norte-americana na AL, de criação de mini-Alcas. Um exemplo, o
recente acordo do Pacífico. Como a Unasul poderia responder a esse
processo que ameaça retalhar a AL em estratégias díspares, dificultando
processos de desenvolvimento integrado?
AS: O modelo de criação de áreas de livre comércio teve seu auge nos
anos 1990, com a criação do NAFTA e o lançamento das negociações da
ALCA. Com o fracasso dessas negociações, os Estados Unidos passaram a
investir na estratégia de assinar acordos bilaterais de livre comércio,
com países como Chile, Peru e Colômbia. No entanto, há estudos do BID e
da CEPAL que demonstram que esses acordos apresentam benefícios
limitados, tendo, muitas vezes, impacto nulo sobre o PIB e sobre a
distribuição de renda.
Mesmo em termos estritamente comerciais, nota-se, em vários casos, que o
aumento das importações de produtos norte-americanos excede muito o
crescimento das exportações para aquele mercado, além de manter a pauta
exportadora concentrada em produtos tradicionais. Um estudo de 2011 do
Ministério de Relações Exteriores do Chile demonstra que, decorridos
sete anos da vigência do acordo de livre comércio com os EUA, as
exportações chilenas cresceram menos de 15%, enquanto que as importações
de produtos norte-americanos pelo Chile aumentaram em cerca de 200%. O
estudo conclui também que a pauta exportadora chilena aos EUA se
concentrou ao longo desses sete anos: o cobre passou, por exemplo, de
56% do total exportado em 2006 para 74% em 2009. Esses dados mostram que
os Acordos de Livre Comércio, mesmo em termos de acesso a mercados,
podem não ser tão benéficos quanto alguns defendem.
Por outro lado, a UNASUL é uma poderosa ferramenta de desenvolvimento
baseada no fato incontornável da geografia. É um processo de integração
muito mais amplo, com diversas iniciativas concretas para a promoção do
desenvolvimento conjunto da região.
Independentemente das opções específicas de política comercial de cada
país da região, continuaremos sendo vizinhos e compartilhando problemas
que requerem ação concertada. Isso vale para temas sociais e políticos,
como saúde, defesa, segurança, mas vale também para as aspirações de
desenvolvimento econômico. A carteira de projetos estratégicos do
COSIPLAN (Conselho de Infraestrutura e Planejamento da UNASUL), que
sucedeu a IIRSA, pode representar um divisor de águas, ajudando a
integrar fisicamente a região para que haja mais trocas comerciais e
mais investimentos recíprocos, gerando um ciclo de crescimento para
dentro.
Uma UNASUL fortalecida permitirá que a região tenha mais chances de
enfrentar com êxito seus enormes desafios, construindo seu próprio
modelo de cooperação e de desenvolvimento, adaptado à sua realidade e,
sobretudo, a seus interesses e aspirações.
A UNASUL incorpora, no nível regional, um conceito operacional que
nossos países já vem adotando com excelentes resultados: desenvolvimento
econômico indissociado de justiça social.
CM: A Alemanha foi de certa forma, o guarda-chuva financeiro da
integração de mercados na UE (hoje pode ser o coveiro desse processo).
De qualquer forma, a experiência indica que todo processo de integração
requer a âncora de uma economia forte que sirva de alicerce nuclear
entre os demais países. O Brasil tem condições de cumprir esse papel na
AL?
AS: Brasil, Argentina, Venezuela, e vários outros países poderiam ter
esse papel na América do Sul. Entretanto, é preciso, mais uma vez,
entender que o modelo de integração do MERCOSUL é distinto do modelo
europeu. Aqui, optamos por um processo de integração em que, mais
importante do que haver uma economia-âncora, é que as sociedades de
todos os países estejam envolvidas no processo de integração.
Temos, na América do Sul, grande produção de alimentos, grande produção
de minérios, e as maiores reservas mundiais de petróleo e de água doce.
Mas a existência de recursos por si só não produz desenvolvimento. O
processo de integração sul-americana é justamente o instrumento para
transformar os recursos potenciais da América do Sul em desenvolvimento
socioeconômico e melhoria de vida da população.
A experiência sul-americana mostra que, mais do que uma economia que
sirva de alicerce, o que precisamos é somar as capacidades individuais
em torno de um projeto de desenvolvimento compartilhado.
CM: Após a Rio+20, houve alguma mudança substancial no papel da questão ambiental na agenda política das nações?
AS: Precisamos pensar, em primeiro lugar, em como a questão ambiental
evoluiu na agenda internacional nos últimos anos. Em 1992, logramos
posicionar a questão do desenvolvimento sustentável no cenário político
internacional. Desde então, os países vêm incorporando esse conceito,
esse ideal, a suas políticas internas e à sua ação externa. Chegamos à
Rio+20 com o desafio de transformar uma ideia já consolidada na agenda
política dos países em metas comuns mais concretas para as próximas
décadas.
Em segundo lugar, é preciso considerar que há uma diferença fundamental
entre a Rio 92 e a Rio+20. A Rio 92 foi um ponto de chegada. Lá, foram
concluídas diversas negociações, que levaram anos, permitindo a
assinatura de diversos instrumentos, como a Convenção-Quadro sobre a
Mudança do Clima, a Convenção de Combate à Desertificação e a Convenção
sobre Diversidade Biológica. Já a Rio+20 foi um ponto de partida. Foi o
momento de traçar diversas linhas sobre como deverá ser o mundo nos
próximos anos. A Rio+20 teve como grande objetivo construir uma agenda
para levar a um mundo mais sustentável, mais inclusivo e mais justo.
CM: O Brasil, juntamente com os demais países do grupo BRICS, está
em condições, de produzir uma inflexão nas negociações multilaterais
nos grandes fóruns existentes hoje no sistema ONU?
AS: O peso econômico, social e político dos BRICS é grande, e será cada
vez maior. A importância dos BRICS vai além de sua enorme participação
no PIB e na população mundiais. O aspecto mais relevante dos BRICS é sua
capacidade de projetar a perspectiva do mundo em desenvolvimento, que
por muito tempo foi uma perspectiva lateral, para o centro das
principais discussões internacionais.
Os BRICS, por seu peso internacional e pela agenda que representam, têm a
capacidade de rearticular e de reprojetar o mundo em desenvolvimento.
Essa projeção depende não só do crescimento das economias dos BRICS. Ela
também evoluirá à medida que esses países consigam projetar,
internacionalmente, sua própria imagem como sociedades em
desenvolvimento.
CM: Qual é, na sua opinião, o principal desafio da diplomacia brasileira hoje.
AS: Ano passado, o Brasil se tornou a 6ª economia do mundo (em função de
diferenças cambiais, alguns argumentam que este ano seríamos a 7ª).
Projeções indicam que nos tornaremos a 5ª economia mundial em breve. O
principal desafio da diplomacia brasileira hoje, é, nesse sentido, se
consolidar como a diplomacia de uma quinta economia do mundo. Precisamos
mostrar que somos uma diplomacia dinâmica e criativa, que mantém fortes
relações com os países vizinhos, mas que também é capaz de agir em
termos globais, participando ativamente em instrumentos de articulação,
como o G20 e o BRICS.
Muito mais além, é preciso, sobretudo, que a sociedade brasileira se
conscientize do que significa ser a 5ª economia do mundo. Grande parte
da população ainda tem uma imagem do Brasil como país periférico, de
menor importância no cenário internacional. Mas essa imagem é totalmente
equivocada. O Brasil, ao lado dos Estados Unidos e da China, são os
únicos três países que estão, ao mesmo tempo, na relação dos dez países
de maior território, dos dez países mais populosos e dos dez países com
maior PIB no mundo. Isso é muito significativo.
O principal desafio da diplomacia brasileira é, portanto, mostrar à
sociedade brasileira que o Brasil precisa ter uma atuação externa à
altura de sua potencialidade econômica, política e social.
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