Telegramas revelam intenções de veto
e ações dos EUA contra o desenvolvimento tecnológico brasileiro com
interesses de diversos agentes que ocupam ou ocuparam o poder em ambos
os países
Os
telegramas da diplomacia dos EUA revelados pelo Wikileaks revelaram
que a Casa Branca toma ações concretas para impedir, dificultar e
sabotar o desenvolvimento tecnológico brasileiro em duas áreas
estratégicas: energia nuclear e tecnologia espacial. Em ambos os casos,
observa-se o papel anti-nacional da grande mídia brasileira, bem como escancara-se, também sem surpresa, a função desempenhada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso,
colhido em uma exuberante sintonia com os interesses estratégicos do
Departamento de Estado dos EUA, ao tempo em que exibe problemática
posição em relação à independência tecnológica brasileira. Segue o
artigo do jornalista Beto Almeida.
O primeiro dos telegramas divulgados, datado de 2009, conta que o
governo dos EUA pressionou autoridades ucranianas para emperrar o
desenvolvimento do projeto conjunto Brasil-Ucrânia de implantação da
plataforma de lançamento dos foguetes Cyclone-4 – de fabricação
ucraniana – no Centro de Lançamentos de Alcântara , no Maranhão.
Veto imperial
O telegrama do diplomata americano no Brasil, Clifford Sobel, enviado
aos EUA em fevereiro daquele ano, relata que os representantes
ucranianos, através de sua embaixada no Brasil, fizeram gestões para que
o governo americano revisse a posição de boicote ao uso de Alcântara
para o lançamento de qualquer satélite fabricado nos EUA. A resposta
americana foi clara. A missão em Brasília deveria comunicar ao
embaixador ucraniano, Volodymyr Lakomov, que os EUA “não quer” nenhuma
transferência de tecnologia espacial para o Brasil.
“Queremos lembrar às autoridades ucranianas que os EUA não se opõem ao
estabelecimento de uma plataforma de lançamentos em Alcântara, contanto
que tal atividade não resulte na transferência de tecnologias de
foguetes ao Brasil”, diz um trecho do telegrama.
Em outra parte do documento, o representante americano é ainda mais
explícito com Lokomov: “Embora os EUA estejam preparados para apoiar o
projeto conjunto ucraniano-brasileiro, uma vez que o TSA (acordo de
salvaguardas Brasil-EUA) entre em vigor, não apoiamos o programa nativo
dos veículos de lançamento espacial do Brasil”.
Guinada na política externa
O Acordo de Salvaguardas Brasil-EUA (TSA) foi firmado em 2000 por
Fernando Henrique Cardoso, mas foi rejeitado pelo Senado Brasileiro após
a chegada de Lula ao Planalto e a guinada registrada na política
externa brasileira, a mesma que muito contribuiu para enterrar a ALCA.
Na sua rejeição o parlamento brasileiro considerou que seus termos
constituíam uma “afronta à Soberania Nacional”. Pelo documento, o Brasil
cederia áreas de Alcântara para uso exclusivo dos EUA sem permitir
nenhum acesso de brasileiros. Além da ocupação da área e da proibição de
qualquer engenheiro ou técnico brasileiro nas áreas de lançamento, o
tratado previa inspeções americanas à base sem aviso prévio.
Os telegramas diplomáticos divulgados pelo Wikileaks falam do veto
norte-americano ao desenvolvimento de tecnologia brasileira para
foguetes, bem como indicam a cândida esperança mantida ainda pela Casa
Branca, de que o TSA seja, finalmente, implementado como pretendia o
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Mas, não apenas a Casa Branca e
o antigo mandatário esforçaram-se pela grave limitação do Programa
Espacial Brasileiro, pois neste esforço algumas ONGs, normalmente
financiadas por programas internacionais dirigidos por mentalidade
colonizadora, atuaram para travar o indispensável salto tecnológico
brasileiro para entrar no seleto e fechadíssimo clube dos países com
capacidade para a exploração econômica do espaço sideral e para o
lançamento de satélites. Junte-se a eles, a mídia nacional que não
destacou a gravíssima confissão de sabotagem norte-americana contra o
Brasil, provavelmente porque tal atitude contraria sua linha editorial
historicamente refratária aos esforços nacionais para a conquista de
independência tecnológica, em qualquer área que seja. Especialmente
naquelas em que mais desagradam as metrópoles.
Bomba! Bomba!
O outro telegrama da diplomacia norte-americana divulgado pelo
Wikileaks e que também revela intenções de veto e ações contra o
desenvolvimento tecnológico brasileiro veio a tona de forma torta pela Revista Veja, e fala da preocupação gringa sobre o trabalho de um físico brasileiro, o cearense Dalton Girão Barroso,
do Instituto Militar de Engenharia, do Exército. Giráo publicou um
livro com simulações por ele mesmo desenvolvidas, que teriam decifrado
os mecanismos da mais potente bomba nuclear dos EUA, a W87, cuja
tecnologia é guardada a 7 chaves.
A primeira suspeita revelada nos telegramas diplomáticos era de
espionagem. E também, face à precisão dos cálculos de Girão, de que
haveria no Brasil um programa nuclear secreto, contrariando, segundo a
ótica dos EUA, endossada pela revista, o Tratado de Não Proliferação de
Armas Nucleares, firmado pelo Brasil em 1998, Tal como o Acordo de
Salvaguardas Brasil-EUA, sobre o uso da Base de Alcântara, o TNP foi
firmado por Fernando Henrique. Baseado apenas em uma imperial
desconfiança de que as fórmulas usadas pelo cientista brasileiro
poderiam ser utilizadas por terroristas , os EUA, pressionaram a Agência
Internacional de Energia Atômica (AIEA) que exigiu explicações do
governo Brasil , chegando mesmo a propor o recolhimento-censura do livro
“A física dos explosivos nucleares”. Exigência considerada pelas
autoridades militares brasileiras como “intromissão indevida da AIEA em
atividades acadêmicas de uma instituição subordinada ao Exército
Brasileiro”.
Como é conhecido, o Ministro da Defesa, Nelson Jobim, vocalizando
posição do setor militar contrária a ingerências indevidas, opõe-se a
assinatura do protocolo adicional do Tratado de Não Proliferação de
Armas Nucleares, que daria à AIEA, controlada pelas potências nucleares,
o direito de acesso irrestrito às instalações nucleares brasileiras.
Acesso que não permitem às suas próprias instalações, mesmo sendo claro o
descumprimento, há anos, de uma meta central do TNP, que não determina
apenas a não proliferação, mas também o desarmamento nuclear dos
países que estão armados, o que não está ocorrendo.
Desarmamento unilateral
A revista publica providencial declaração do físico José Goldemberg,
obviamente, em sustentação à sua linha editorial de desarmamento
unilateral e de renúncia ao desenvolvimento tecnológico nuclear
soberano, tal como vem sendo alcançado por outros países, entre eles
Israel, jamais alvo de sanções por parte da AIEA ou da ONU, como se faz
contra o Irã. Segundo Goldemberg, que já foi secretário de ciência e
tecnologia, é quase impossível que o Brasil não tenha em andamento algum
projeto que poderia ser facilmente direcionado para a produção de uma
bomba atômica. Tudo o que os EUA querem ouvir para reforçar a linha de
vetos e constrangimentos tecnológicos ao Brasil, como mostram os
telegramas divulgados pelo Wikileaks. Por outro lado, tudo o que os EUA
querem esconder do mundo é a proposta que Mahmud Ajmadinejad ,
presidente do Irà, apresentou à Assembléia Geral da ONU, para que fosse
levada a debate e implementação: “Energia nuclear para todos, armas
nucleares para ninguém”. Até agora, rigorosamente sonegada à opinião
pública mundial.
Intervencionismo crescente
O semanário também publica franca e reveladora declaração do
ex-presidente Cardoso : “Não havendo inimigos externos nuclearizados,
nem o Brasil pretendendo assumir uma política regional belicosa, para
que a bomba?” Com o tesouro energético que possui no fundo do mar, ou na
biodiversidade, com os minerais estratégicos abundantes que possui no
subsolo e diante do crescimento dos orçamentos bélicos das grandes
potências, seguido do intervencionismo imperial em várias partes do
mundo, desconhecendo leis ou fronteiras, a declaração do ex-presidente
é, digamos, de um candura formidável.
São conhecidas as sintonias entre a política externa da década anterior
e a linha editorial da grande mídia em sustentação às diretrizes
emanadas pela Casa Branca. Por isso esses pólos midiáticos do
unilateralismo em processo de desencanto e crise se encontram tão
embaraçados diante da nova política externa brasileira que adquire, a
cada dia, forte dose de justeza e razoabilidade quanto mais telegramas
da diplomacia imperial como os acima mencionados são divulgados pelo
Wikileaks.
Submissão e servilismo aos espiões não!
É de uma imensa falta de soberania o não esclarecimento imediato a nossa
população o que faz uma base da NSA americana (National Security
Agency) na capital de nosso país, em nossas barbas , em nossa casa,
monitorando nosso governo, nossos planos militares, nossas estratégias e
o pior, fazendo de bobo o povo brasileiro ao querer convencer- nos de
que isto é normal em um país democrático? Nossa embaixada em Washington
é “target” prioritária?
Agora sabemos que o monitoramento se dá através de satélites por nós
alugados dos nossos soberanos imperialistas que como quer convencer o
embaixador Shannon é um monitoramento corriqueiro, em explicação ao
nosso ministro Paulo Bernardo. Ridículo se não fosse grave.
Será que para entender isto temos que voltar a agosto de 2003, onde a
explosão até hoje não esclarecida pegou o Brasil e o Governo Lula de
surpresa quando misteriosamente explodiu nossa base militar de Alcântara
três dias antes do lançamento de nosso foguete transportador de um
satélite brasileiro? Sabe-se que dias antes mais de 20 “turistas
americanos” estavam há dias nas pequenas pousadas de Alcântara,
subitamente despertada para tão grande movimentação turística americana?
Onde foi parar a investigação daquele fato?
É sabido a aversão que os americanos desenvolvem com quem quer ter a
tecnologia de lançamento e construção de satélites própios, mas o que
diz nosso governo? Vamos fazer um protesto através da nossa chancelaria e
pedir explicações ao embaixador americano pensando que vamos ter um
esclarecimento claro como merece nossa soberania? Ou teremos uma
desculpa espalhafatosa e ficar por isso mesmo?
Nossa tecnologia espacial foi para o espaço com o custo da perda de 21
dos melhores técnicos e engenheiros aeroespaciais que tínhamos atrasando
em décadas nosso próprio satélite de comunicações e nós, mesmo sem
apurar o que aconteceu, se foi ou não um atentado de sabotagem, passamos
a usar através de aluguel satélites americanos para nossas comunicações
e deixamos para lá as investigações de quem foram os sabotadores?
Não custa lembrar que o Governo FHC quase transfere essa base de
Alcântara aos americanos e graças a um relatório do então Deputado
Waldir Pires o Congresso soberanamente após ver o absurdo daquela
operação onde o Brasil não poderia sequer entrar nas dependências da
mesma optou por rejeitar aquele crime de “lesa-pátria” que se estava
cometendo.
E hoje? Que respondemos ao Tio Sam? Vamos romper o contrato que mantemos
com eles e os seus satélites ou vamos pedir ao mexicano Slim que nos
empreste os dele para nossos planos estratégicos, sejam eles militares,
de comunicação ou segurança de nossas fronteiras?
E depois ainda tem gente que defende a privatização de tudo, inclusive de nossa soberania...
João Vicente GoulartDiretor do IPG- Instituto Presidente João Goulart
* * *
O dia em que o ministro Fernando Henrique Cardoso descobriu o que é “espionagem”: secretário de estado americano sabia mais sobre segredo militar brasileiro do que ele
Quando era ministro das Relações Exteriores do presidente Itamar
Franco, Fernando Henrique Cardoso teve, na prática, uma lição de como a
“espionagem” funciona. Durante uma escala nos Estados Unidos, a
caminho de uma missão diplomática no Japão, FHC ouviu do secretário de
estado americano, numa conversa privada, uma pergunta sobre um segredo
militar brasileiro. FHC desconhecia o assunto. Já na presidência,
Fernando Henrique soube que o projeto a que o secretário americano se
referia de fato existia. Em suma: o secretário de Estado americano
sabia mais sobre o Brasil do que o então ministro das Relações
Exteriores brasileiro.
Numa entrevista que fiz com ele ( publicada, na íntegra, no livro
DOSSIÊ BRASÍLIA : OS SEGREDOS DOS PRESIDENTES” – que traz,
também, depoimentos de José Sarney, Fernando Collor e Itamar Franco),
FHC descreve a cena:
Qual o grande segredo o senhor teve de guardar quando estava no poder mas pode revelar hoje?
FHC: “Não é um grande segredo. Aconteceu antes de eu estar na
presidência: quando estava indo para o Japão, como chanceler do
presidente Itamar, passei pelos Estados Unidos, onde o secretário de
Estado, Warren Christopher, depois de uma conversa agradável que teve
comigo e com várias pessoas, me disse que precisava me falar em
particular: “Ministro, temos informações de que o Brasil vem obtendo
material secreto da Rússia para fazer mísseis” . Fiquei surpreso !
Brinquei na resposta que dei ao secretário de Estado: “Se o Brasil e a
Rússia estão fazendo, só se for com financiamento americano porque
estamos em uma crise grande…”
Tempos depois, já como presidente da República, fui informado de que o
Brasil tinha, efetivamente, conseguido controlar o sistema de
lançamento de satélites – que, na verdade, é o mesmo ( usado para
mísseis). Era esse o fato.
Tomei, então, a seguinte decisão: “Vou anunciar ao mundo que o Brasil
dispoe da tecnologia”. Combinei com os ministros militares e com o
Itamaraty que iríamos propor que o Brasil entrasse para o sistema
internacional de controle – que se chama MTCR ( Missile Technology
Control Regime – ou Regime de Controle de Tecnologia de Mísseis).
Vim para São Paulo, fui até São José dos Campos, para o lançamento de
um avião da Embraer que faz tanto sucesso hoje: o 135. Fiz o discurso.
Tive, então, uma surpresa: ninguém no Brasil deu importância ao que eu
disse ! Só quando saiu publicado nos Estados Unidos é que deram
importância. De fato, tínhamos nos apoderado da tecnologia para o
lançamento de satélites”.
O governo americano estava mais bem informado do que o senhor?
FHC: “O governo americano sabia ! Quando voltei daquela viagem, falei
com o presidente Itamar – que também não estava informado sobre o
assunto. Aquilo foi feito com discrição. Era uma coisa boa: um
desenvolvimento tecnológico nosso”.
Depois de eleito presidente, Fernando Henrique Cardoso teve conversas
privadas com o presidente americano Bill Clinton. Num desses encontros,
Clinton insinuou que o Brasil poderia ter uma presença militar na
Colômbia, país que enfrentava dois problemas gigantescos: os cartéis da
droga e a força da guerrilha:
O que é que o presidente Bill
Clinton dizia ao senhor em conversas privadas? O senhor foi convidado a
passar um fim de semana en Camp David, a residência de verão do
presidente…
FHC: “Fui a Camp David. O presidente Clinton queria que o Brasil
tivesse um papel mais ativo na Colômbia – e até no Oriente Médio. Os
americanos gostam que o Brasil tenha tenha um papel mais ativo em casos
assim. Mas eu eu era muito restritivo, sobretudo diante da sugestão de
que o Brasil fosse mais ativo na Colômbia, onde há guerrilha. Isso
signficava, no fundo, presença militar brasileira. O que havia, ali, não
era uma insistência de Bill Clinton: era uma conversa em que achava
que o Brasil poderia ter esse papel.
Conversamos bastante sobre História. Clinto sabe muito de História: é
um homem de cultura. Impressionou-me muito quando falou sobre a China e
sobre a Rússia. Disse o seguinte: “A deve sempre perguntar a um país
como esse: do que é que ele tem medo? Qual o medo histórico desse país?
Qual é a ambiçao? Por exemplo: a Rússia deve ter medo de ser invadida,
porque já sofreu invasões várias vezes. Já a China deve ter medo de ser
despadaçada pelos chefes da guerra. Deve-se perguntar: qual é a
ambição de países assim? São expansionistas? Não são expansionistas?”.
O senhor achou, então, que o presidente Bill Clinton esperava que o Brasil tivesse uma presença militar na Colômbia?
FHC: “Clinton não me disse com essas palavras, mas a verdade era essa.
Isso foi antes de os Estados Unidos terem essa presença tão ativa. O
que ele disse foi: “O Brasil poderia ter um pouco mais de
preocupação….”. Mas, nessa matéria, tínhamos uma posição muito mais
retraída e muito menos intervencionista”.
Que resposta, então, o senhor deu ao
presidente Bill Clinton quando ele fez essa insinuação sobre a
presença militar do Brasil em território colombiano?
FHC: “Clinton não falou nesss termos, em “militar”. É que havia, na
Colòmbia, a guerriha e a droga – a questão mais séria. A resposta que
dei foi a seguinte: “Temos no Brasil nossa política antidrogas, temos
também a floresta amazônica – que, de alguma maneira, mas não tanto, nos
protege”. A polêmica era a seguinte: os Estados Unidos queriam que
houvesse um comando único da repressão à droga. O Brasil não quis.
Queríamos ter nossa política. O fundo da questão é esse”.
Geneton Moraes NetoNo Dossiê Geral
Um comentário:
ALGUÉM TEM DÚVIDA DE QUEM EXPLODIU A BASE DE ALCÂNTARA?
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