O debate "O Povo e o Poder no Brasil", entre o economista André Lara
Resende e o filósofo Marcos Nobre, mediado pelo jornalista da TV Globo
William Waack, foi o mais quente da noite de sábado (6) na Flip e um
retrato da polarização política que tomou conta do país depois das
manifestações. Não tanto pelos debatedores, que travaram um duelo
intelectual de alto nível, com opiniões divergentes, porém sempre
interessantes, mas pela reação do público, que reagia ora com vaias, ora
com aplausos. E o alvo mais constante dos apupos do público foi
William Waack.
Quase ao fim do debate, o estudante Gandhi Terra Ayres, 20, morador de
Paraty, aproximou-se do palco e gritou: "William Waack não representa a
luta popular." Um segurança o interpelou e Gandhi acabou caindo no
chão. O rapaz foi retirado do local do debate. Já do lado de fora da
tenda, disse: "Estou protestando porque William Waack é pago
pela mídia corporativa, que ajuda a escravizar o povo." Ele se disse
apartidário: "Nem título de eleitor eu tenho!"
Pouco depois, Waack, que fizera uma mediação muito competente,
imprimindo um ritmo acelerado à conversa e arrancando respostas claras e
concisas dos debatedores, pediu a palavra e, lembrando sua experiência
de cobertura jornalística em países como Argentina e Itália, que
também tiveram movimentos de repúdios a políticos e hoje estão em
situação econômica e social difícil, disse: "Minha experiência mostra
que movimentos sociais sem clara definição política provocam menos
mudanças que as esperadas pela população", causando aplausos e vaias do
público.
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O clima quente ficou claro já no início do debate, quando Waack foi
vaiado ao fazer um aparte perfeitamente justificável durante uma
resposta de André Lara Resende. Uma pessoa gritou, da platéia: "Olha o
monopólio da informação!"
No debate, André Lara Resende, ex-presidente do Banco Central e um dos
responsáveis pelo plano Real, e Marcos Nobre, professor de filosofia da
Unicamp e autor do livro eletrônico "Choque de Democracia: Razões da
Revolta", sobre os recentes protestos, concordaram em alguns pontos - a
ineficiência do Estado, a falta de representatividade popular dos
partidos políticos, a quase inexistência de uma oposição, de fato, ao
governo - e discordaram em outras.
Nobre disse que os protestos mostraram que o povo "retomou o poder".
Resende discordou: segundo ele, as manifestações mostraram a
discordância popular em relação ao cenário político e social, mas ainda
não evidenciaram uma tomada de poder popular. Nobre defendeu uma
democracia direta, Resende disse que, sem partidos, se perde a
polarização dos debates políticos.
Resende foi aplaudido ao afirmar que o modelo de governo de Lula foi
Nacional Desenvolvimentista, retrógrado e muito semelhante, segundo o
economista, ao modelo do governo militar. Nobre recebeu muitos aplausos
ao afirmar que o momento era de "discutir que tipo de sistema político
queremos."
Em entrevista coletiva hoje, o curador da Flip, Miguel Conde, disse que
"foi interessante o Waack interagir fora do estúdio com um público não
necessariamente simpático à TV Globo ou a ele."
"Quando se fala que há uma crise de representação em jogo nesses
protestos, ficou claro que isso passa pela imprensa também", disse
Conde.
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