Por Alexandre Figueiredo
Há cerca de 35 anos, a Música Popular Brasileira estava em crise. A
geração que causou impacto em 1967, seguida de uma outra que veio na
cola em 1973, era acusada de abrir mão da criatividade para se
estabelecer no mercado com fórmulas tendenciosas e pré-estabelecidas.
Canções com letras de amor mal resolvidas, em ritmo geralmente lento e
maçante, discos mal mixados - geralmente com a bateria mixada bem baixo e
os teclados e saxofones enfatizados - , arranjos de orquestras gravados
em Los Angeles, músicas que homenageiam surfistas, atores, modelos etc,
tudo isso virou clichê numa MPB que havia se acomodado.
Isso criou uma reação da crítica e do público que atingiram o ápice no
começo da década de 1980. Eu mesmo sou suspeito para escrever isso,
porque a MPB me entediava, nada dizia para mim. Preferia ouvir rock,
geralmente britânico, que era o que se aproximava de minhas perspectivas
na época.
Eu, um rapazinho saindo da infância para a adolescência, com a natural
energia juvenil em ebulição, ficava entediado ouvindo baladas românticas
de MPB, pachorrentas e melosas. Além disso, não poderia me identificar
com letras de amor mal resolvido se eu nem sequer era bem resolvido no
amor, porque boa parte das mulheres de quem eu estava a fim estavam
comprometidas com outros.
De fato a MPB, depois do breve ímpeto tropicalista, ficou escrava de
fórmulas. Boa parte da culpa era dos executivos de gravadoras e dos
produtores musicais que estavam presos a normas de hit-parade, uma
mentalidade puramente mercantilista que no Brasil ditatorial mergulhado
no neoliberalismo, se ascendeu surpreendentemente naqueles idos de
1977-1982.
Nessa crise envolvendo a MPB, os antigos heróis tropicalistas, Caetano
Veloso e Gilberto Gil, chegaram aos anos 70 como astros do mainstream e
travavam uma batalha verbal com a crítica, que exigia deles uma
politização devido ao contexto da época, de gradual redemocratização do
país. Os dois, no entanto, esnobavam ou atacavam a mídia, satisfeitos
com sua despolitização.
Nesse tempo todo, criou-se uma "tradição" anti-MPB que chegava ao
niilismo quase absoluto. Da parte de uma geração de intelectuais e
críticos que passaram a dominar o mercado e o establishment acadêmico de
hoje, seus heróis, na melhor das hipóteses, são os "malditos" ou os
artistas de MPB autêntica que tiveram um papel "secundário" na aparição
na grande mídia e seguem a herança pós-tropicalista.
São artistas que de alguma forma antecederam ou derivaram da trilogia
apreciada pela intelectualidade dominante de hoje, a tríade Jovem
Guarda-Tropicália-Sambalanço, de Marcos Valle a Arrigo Barnabé, de
Inezita Barroso a Zezé Motta, de Itamar Assumpção a Wilson Simonal.
Na pior das hipóteses, porém, a intelectualidade dominante, como quem
quer juntar o joio com o trigo, quer defender o brega-popularesco e, só
para impressionar, recorre a nomes esquecidos e relativamente "fora da
mídia": Odair José, Benito di Paula, Leandro Lehart, Luís Caldas, Raça
Negra, José Augusto e os finados Wando e Waldick Soriano.
Na verdade, são nomes que nem estão tão fora da mídia assim e que talvez
apenas "tiram férias" da grande mídia e do grande mercado, até porque
haja paciência para escutar suas músicas o tempo todo, em sucessivos
anos. A grande mídia e o grande mercado apenas "abandonam" eles a
contragosto, sob pressão de quem não suporta ouvi-los o tempo todo no
auge do sucesso deles.
Só que a intelectualidade não quer saber. Os bregas são "injustiçados" e
pronto. É a mesma pasmaceira que não resolve o problema da crise da
MPB. Só faz piorar essa crise, enquanto a opinião pública se torna
escrava dessa "panelinha" de intelectuais e críticos musicais
"tarimbados".
Do Blog Justiceira de Esquerda.
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