"A participação da mídia brasileira é um
episódio que ainda está para ser plenamente contado. Há muitas lacunas e
zonas cinzentas nesta história. E isso não parece ocorrer por acaso.
Muitos dos compromissos que levaram uma parte importante da imprensa
brasileira a se aliar com setores golpistas e autoritários permanecem
presentes e se manifestam em outros debates da vida nacional. Enquanto a
sociedade não decidir que abrir essa caixa preta é uma condição para o
avanço da democracia no país, essas empresas, no Brasil, na Argentina e
em outros países da América Latina seguirão praticando um de seus
esportes preferidos: pisotear a memória e apresentar os seus interesses
privados como se fossem interesses públicos."
O editorial de O Globo e a caixa preta da relação da mídia com a ditadura
Sul21 - 02/09/2013 - Marco Aurélio Weissheimer
O jornal O Globo publicou editorial, dia 31 de agosto, admitindo que “o apoio editorial ao golpe de 64 foi um erro”,
ou um “equívoco” como também diz o texto. A decisão de tornar pública
essa avaliação, diz ainda o editorial. “vem de discussões internas de
anos, em que as Organizações Globo concluíram que, à luz da história, o
apoio se constituiu um equívoco”. Quase 50 anos depois do golpe
civil-militar que derrubou o governo constitucional de João Goulart, as
organizações Globo vêm a público falar desse “equívoco”, lembrando que
outros grandes jornais do país também aderiram ao movimento golpista
(cita o Estado de São Paulo, a Folha de São Paulo, o Jornal do Brasil e o
Correio do Brasil, “apenas para citar alguns”) e admitindo que as vozes
recentes das ruas afirmando que “a Globo apoiou a ditadura” são
inquestionáveis.
Mas o que poderia parecer uma autocrítica acaba descambando ao longo do
texto do editorial para um exercício cínico de justificação da decisão
tomada em 1964 e de ocultamento dos benefícios que a empresa teve por
seu apoio aos golpistas. O texto cita um editorial assinado por Roberto
Marinho em 1984, que “ressaltava a atitude de Geisel em 13 de outubro de
1978, que extinguiu todos os atos institucionais, o principal deles o
AI5, reestabeleceu
o habeas corpus e a magistratura (…)”. Logo em seguida, justifica o
apoio ao golpe destacando “os avanços econômicos obtidos naqueles vinte
anos” e a crença de que o golpe foi “imprescindível para a manutenção da
democracia e, depois, para conter a irrupção da guerrilha urbana”. O
argumento do editorial, em resumo, é: “à luz da história, olhando 50
anos depois, foi um erro, mas naquele momento foi imprescindível para a
manutenção da democracia”.
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