domingo, 30 de março de 2014

Capas da Veja: Quem quer ser a próxima vítima a perder dinheiro?


Essa estória de que a pesquisa Ibope influenciou tanto a Bolsa de Valores está muito mal contada, e quem conhece minimamente como funciona os bastidores do mercado financeiro é muito difícil engolir essa versão que estão contando.

O cheiro é de tubarões espalhando boatos para pegar o rico dinheirinho de calouros na Bolsa, ingênuos e amadores que aplicam conforme os boatos realimentados no noticiário.

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Sabemos que tucanos, banqueiros e especuladores são almas gêmeas. Nasceram uns para os outros. Se amam e adorariam que Aécio Neves ou mesmo o neo-vendilhão Eduardo Campos ganhasse a eleição.

Mas são profissionais e não rasgam dinheiro nem pelo "amor" carnal que tem pelos tucanos.

Duas pesquisas feitas simultâneas (só divulgadas com 7 dias de diferença), uma mostrando que a popularidade de Dilma "caiu", e mesmo assim as intenções de votos continuaram extremamente favoráveis à presidenta e desfavoráveis à oposição, não influiria nas decisões de profissionais no mercado financeiro. Só se a pesquisa trouxesse de fato uma forte possibilidade de virada é que influiria.

O resto são profissionais inescrupulosos espalhando boatos para influenciar os mais inocentes e amadores a caírem como uns patinhos.
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Nesse negócio de ações em Bolsa, ser bem informado e ter informação na frente dos outros vale literalmente ouro. Nenhuma pesquisa que demorou 10 dias para ser publicada influiria nos ânimos dos profissionais de mercado. E encomendada logo por uma entidade patronal como a Confederação Nacional da Indústria, dificilmente não vazaria antes para o mercado financeiro.

Só na Bovespa, o dinheiro eletrônico que gira por dia é mais de R$ 6 bilhões. Se qualquer flutuação em pesquisa eleitoral fizesse a Bolsa subir ou descer até 4%, todos os investidores profissionais que aplicam muita grana fariam pesquisas diárias, cujo custo é abaixo de R$ 100 mil, muito pouco perto dos volumes de dinheiro negociados na bolsa.

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Nestes últimos dias de alta, a Bovespa teve a melhor entrada de capital estrangeiro nos últimos seis meses, muito dinheiro vindo de fundos, inclusive fundos de pensão que aplicam a médio e longo prazo. O mais provável é que as ações da Petrobras e Eletrobras, que estão baratas, tiveram muita procura. Os profissionais que giram no curto prazo acham que elas ainda vão subir lentamente este ano e ainda não é hora de comprar. Mas são papéis muito seguros, com alto grau de confiança de que subirão nos próximos anos. É um tipo de papel que interessa a fundos de pensão, que precisam ter boa parte dos investimentos com baixo risco, mesmo que com menor rentabilidade. Isso explica a procura.

É possível que espertalhões resolveram unir o "útil ao agradável". Espalharam que tinha a ver com a "queda" de Dilma. Assim fazem campanha para Aécio nas "suas bases" (os eleitores que trabalham ou gravitam em torno do mercado financeiro), e ao mesmo tempo estes que sabem o que estão fazendo quando espalham os boatos, induzem os amadores a comprarem ou venderem na hora errada, de forma a perderem dinheiro para eles que se aproveitam e ganham.

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O economista e gestor de investimentos Pedro Paulo Silveira dá uma opinião que parece honesta, e que deve ser semelhante a que profissionais sérios falam nos bastidores:

"O fato é que o otimismo voltou com a expectativa que os agentes têm de uma reversão no quadro eleitoral; com a derrota da presidente. No entanto, insisto nessa questão, a pesquisa divulgada ontem não se refletirá, necessariamente, em intenções de votos para a oposição. Apesar dos dados ruins de inflação, o mercado de trabalho e a renda dos trabalhadores continuam firmes e são um cabo eleitoral nada desprezível e que compensa, de longe, a inflação a as contínuas denúncias que saem na imprensa. É cedo demais para apostar em uma reversão do quadro eleitoral. Mais sensato seria apostar na continuidade, ou na elevação, da volatilidade dos mercados, aqui e lá fora."

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Esta nota é ilustrada pela capa da revista Veja "Eike Xioping" de 2012 que chegou às bancas em um sábado, dia 14 de janeiro. Na segunda-feira seguinte, dia 16, a cotação da principal empresa de Eike Batista na época, a OGX Petróleo, subiu 5,79%. Na quarta acumulou alta de 12,22% sobre a cotação de sexta-feira, chegando ao valor de R$ 15,89. De lá para cá o valor despencou e está em R$ 0,25 (28/03/2014).

Pausa para uma explicação: a matéria da Veja não aconselhou diretamente ninguém a comprar ações. A matéria foi sobre futilidades ("jornalismo ostentação"), e não propriamente de economia. A revista apenas colaborou para espalhar a imagem de que tudo o que Eike fizesse daria muito dinheiro, sem tocar no assunto de que alguns investimentos eram de alto risco, ou seja, tanto podiam ganhar como perder muito dinheiro.

Se algum profissional do mercado financeiro disser que as ações subiram por causa da capa da Veja vira motivo de piada. Esse tipo de notícia pode até influir algo na disposição de amadores que compram ações, mas não o suficiente para provocar um estouro de manada que produza altas significativas. Deve ter havido outros fatores naquela data.

Agora, a capa desta semana trata como verdade uma relação entre pesquisa e Bolsa que é mera especulação. Acaba servindo para reforçar o golpe dos espertalhões sobre os tolos que comprarem ou venderem errado por causa da próxima pesquisa. Para eles, só resta advertir: "sorriam, vocês estão sendo tapeados".

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