O mais completo post de análise do dantesco episódio da condução coercitiva do blogueiro Eduardo Guimarães foi escrito, agora há pouco, por Luís Nassif. Em uma democracia, a este momento, os órgãos de controle do Judiciário estariam se movendo para enquadrar o abuso inominável de “encaçapar” alguém num camburão para que revele uma fonte de informação, ainda mais quando o próprio juiz move um processo contra esta pessoa. Coisa de delegacia da roça nos anos 50, mas que conta com o beneplácito de nossas altas luzes judiciárias.
Com o caso Eduardo Guimarães,
Moro atravessa o Rubicão
Luis Nassif, no GGN
Vamos entender porque, para efeito da
Lava Jato, o caso Eduardo Guimarães torna-se um divisor de águas – da
mesma maneira que o episódio da condução coercitiva de Lula.
O episódio Lula, mais a vazamento dos
grampos de Lula e Dilma, afastou de vez a presunção de isenção da Lava
Jato e mostrou seu alinhamento com o golpe de Estado em curso.
A condução coercitiva de Eduardo
Guimarães expõe de forma inédita o uso do poder pessoal arbitrário de
Moro para retaliar adversários. Não se trata mais de luta política,
ideológica, de invocar as supinas virtudes da luta contra a corrupção
para se blindar: da parte de Sérgio Moro, a operação atende a um desejo
pessoal de vingança.
Peça 1 – as pinimbas de Guimarães com Moro
Com seu Blog Cidadania, Eduardo é um
crítico implacável da Lava Jato. E autor de uma representação contra
Sérgio Moro junto ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça).
Em represália, Moro entrou com uma
ação contra Edu, baseada em uma frase mal construída. Na frase, Edu diz
(para o leitor) que as ações da Lava Jato irão ameaçar “seu emprego e
sua vida”, referindo-se ao emprego e vida do leitor.
Um Blog de ultradireita da Veja
interpretou que “seu emprego e sua vida” referia-se a Moro. Cada vez
mais ligado às milícias da ultradireita, Moro aproveitou a deixa para
processar Edu.
O Tweet remetia para um artigo onde
Edu praticava seu esporte predileto: brigar com outros grupos de
esquerda (https://goo.gl/UvpKWo), e mostrar a situação de caos na
economia, na qual seriam destruídas o emprego e a vida das pessoas.
Moro tropelou completamente a lei, que diz que um juiz não pode julgar um adversário.
Peça 2 – PF x MPF
A gestão vacilante do delegado geral
da PF, Leandro Daiello, deflagrou uma guerra de facções dentro da PF,
consolidada em diversos inquéritos abertos, de lado a lado, visando
identificar irregularidades.
Um dos inquéritos investiga membros da Lava Jato, pela colocação de escuta ilegal na cela do doleiro Alberto Yousseff.
Outra, procura identificar os autores
de um suposto dossiê contra a Lava Jato, cuja existência teria sido
denunciada pela Veja, nos tempos do jornalismo escabroso do diretor
Eurípides Alcântara – em uma capa em que mostrava Lula como uma
jararaca.
Fui intimado pela PF a prestar
depoimento nesse inquérito através de carta precatória – já que o
inquérito corria em Brasília Ressalto que fui tratado com toda a
fidalguia. Antes de receber a intimação, telefonaram de Brasília dizendo
que não era nada contra mim.
Compareci no dia marcado e fui
informado do teor do dossiê, sobre o reino da família Arns em Curitiba.
Mostrava a influência do ex-senador Flávio Arns na APAE (Associação de
Pais e Amigos de Excepcionais) do Paraná. Depois, a maneira como seu
sobrinho Marlus Arns, metido em várias jogadas políticas no Estado,
tornou-se titular de praticamente todas as ações das APAEs do estado na
vara de Curitiba. A diretora jurídica era a esposa de Sérgio Moro. E
Marlus tem um irmão dono de um curso de direito à distância, tendo como
professores procuradores e delegados da Lava Jato. Finalmente, com a
saída de Beatriz Catta Preta, Marlus assumiu diversos clientes do
milionário mercado de delação premiada.
Poderia ter lançado dúvidas sobre a
contabilidade desse curso à distância, mas me ative às informações que
consegui coletar na Internet, no Tribunal de Justiça de Curitiba e no
site da Secretaria de Educação do Estado.
Informei os delegados que conhecia o
conteúdo do material, mas que não recebera de ninguém pela relevante
razão de ter sido o autor da matéria original. O tal dossiê era
meramente uma cópia de um post antigo do Blog.
A ação contra Edu também se insere nesse quadro de disputas internas da PF.
Peça 3 – MPF x PF
Há uma pesada disputa entre a PF e o Ministério Público Federal pelo protagonismo da Lava Jato.
Ontem, durante congresso da categoria
em Florianópolis, o presidente da Associação Nacional dos Delegados da
PF, Carlos Eduardo Sobral, foi objetivo em conversa com jornalistas
(https://goo.gl/BtV4TA). Disse que o MPF assumiu o protagonismo da Lava
Jato devido à estratégia de publicidade e o apoio institucional para as
investigações, incluindo recursos fartos. Sobral admitiu que o país
enfrenta um “cabo de guerra institucional”. E se queixou de que a
sociedade vê a PF como mera cumpridora de mandatos.
Completou dizendo que “não queremos
nos transformar em quarto ou quinto poder. Não buscamos a falta de
controle. Não buscamos o arbítrio ou abuso. Buscamos simplesmente a
capacidade de continuar realizando combate ao crime organizado e à
corrupção”.
Peça 4 – o caso Eduardo Guimarães
É por aí que se insere o caso Eduardo Guimarães.
Ele foi convocado para depor no inquérito que apura o vazamento da condução coercitiva de Lula. Tinha data marcada para depor.
Hoje de manhã, a PF invadiu sua casa,
intimidou ele e sua esposa, levou celulares e computadores, sem nenhuma
necessidade. Aparentemente já sabiam quem havia vazado a informação.
Reforça a suspeita de que a
autorização dada por Moro, além de arbitrária, serviu aos propósitos de
revanche contra um cidadão que o denunciou ao CNJ e está sendo
processado pelo próprio Moro.
Mais, a Constituição assegura sigilo
de fonte. Quando questionado pelo dpeutado Paulo Teixeira no Congresso, a
alegação de Moro foi a de que Eduardo não é jornalista.
Recentemente, o decano do STF, Celso
de Mello, considerou o sigilo de fonte como direito da sociedade, não de
jornalistas. Além disso, ao não reconhecer mais o diploma de jornalista
como pré-condição para a prática da profissão, o STF acabou com a
classificação restrita de jornalista.
Peça 5 – as consequências
Agora se chega no busílis da questão.
Eduardo foi efetivamente feito
prisioneiro, ainda que por algumas horas. Chegando à PF, foi interrogado
por delegados sem a presença de um advogado.
Sua casa, seu lar, foi conspurcado
com a invasão da PF. Tanto a ação movida por Moro, quanto a operação
atual, são juridicamente insustentáveis. Mas Moro conseguiu se valer de
seu poder de juiz para cometer uma arbitrariedade, com o agravante de
agir de forma triplamente ilegal: decretar a condução coercitiva de quem
não se negou a depor; obrigar uma pessoa a abrir mão de seu sigilo de
fonte e agir contra uma pessoa com quem mantem uma disputa jurídica.
Depois de sofrer ataques da direita, o
Ministro Luís Roberto Barroso resolveu se blindar: tornou-se o
principal avalista do Estado de exceção de Curitiba, alegando que a Lava
Jato enfrenta um quadro de exceção. Caminha para se tornar o Ministro
símbolo do MBL e congêneres, assim como Moro e os procuradores da Lava
Jato.
Irá se pronunciar agora? A prisão e
humilhação de um cidadão brasileiro, a invasão injustificada de seu lar,
não obedeceu sequer à real politik da Lava Jato. Foi um ato de vingança
pessoal, que atropela normas fundamentais de direitos civis.
Moro se comportou como um imperador, acima das leis, porque, no episódio do vazamento dos grampos, foi tratado acima das leis.
Sua atitude, agora, mostra um sujeito
desequilibrado, utilizando o pesadíssimo poder conferido pelo apoio da
mídia e de Ministros descompromissados com direitos civis, para exercer o
arbítrio em causa própria.
Se fosse contra um jornalista da Rede
Globo, o Ministro Barroso permaneceria calado? Certamente, não. Se fica
calado agora, endossa a tese do direito penal do inimigo.
No final, fica-se sabendo que a
sombra projetada por Barroso é infinitamente maior do que seu verdadeiro
tamanho. Se não for contido agora, se a imprensa se calar – porque a
vítima é um adversário – estará em marcha definitivamente a escalada do
arbítrio.
O episódio mostra definitivamente que Sergio Moro está em estado de desequilíbrio emocional. Até onde irá, não se sabe.
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