O Conversa Afiada reproduz artigo do professor Venício Lima, do Observatório da Imprensa:
Os avanços de 2011
Por Venício A. de Lima em 13/12/2011 na edição 672
Mais um fim de ano. Tempo de balanços, de reavaliar metas, de planejar o futuro. Sobretudo, tempo de refletir sobre o que se fez e o que se deixou de fazer no campo das comunicações.
Ao contrário do rotineiro, e
para evitar a repetição do já escrito ao longo do ano, arrisco um
balanço seletivo de 2011. Sem qualquer ordem de relevância e sem
pretender ser exaustivo, registro dez pontos que, numa perspectiva
histórica, podem ser considerados como avanço no sentido da garantia
democrática de que mais vozes participem e sejam ouvidas no debate
público.
Dez avanços
1.Relatório do special
rapporteur para a “promoção e proteção do direito à liberdade de opinião
e expressão” do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, tornado
público no dia 3 de junho, reconhece o acesso à internet como um
direito humano (ver, neste Observatório, “Na pauta da igreja e da ONU”).
Os últimos dados sobre a
internet no Brasil indicam, segundo a agência F/Nazca, que somos 81,3
milhões de internautas (a partir de 12 anos). Para o Ibope/Nielsen,
somos 78 milhões (a partir de 16 anos – setembro/2011). De acordo com a
Fecomércio-RJ/Ipsos, o percentual de brasileiros conectados aumentou de
27% para 48%, entre 2007 e 2011 (ver aqui).
Neste contexto, um projeto de
lei para definir regras sobre direitos, deveres e princípios para o uso
da internet (marco civil) foi enviado pela Presidência da República ao
Congresso Nacional em agosto (ver aqui).
2.O crescimento e
fortalecimento dos movimentos pró-criação dos conselhos estaduais de
comunicação social (CCS) em vários estados da federação (ver “Onde
estamos e para onde vamos”).
A pioneira Bahia elegeu os
representantes da sociedade civil para o CCS-BA – 10 entidades do
segmento empresarial e 10 do movimento social – que tomam posse no dia
12 de dezembro, juntamente com os 7 membros indicados pelo governo do
estado.
No Rio Grande do Sul, o pleno
do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES) aprovou, no dia
1º de dezembro, a recomendação ao governador do estado de criação do
CCS-RS. Agora será formado um grupo de trabalho composto por membros do
CDES e da Casa Civil para elaborar o projeto de lei a ser encaminhado a
Assembleia Legislativa.
3.A realização do II Encontro
Nacional de Blogueiros Progressistas, em Brasília, em junho; e do I
Encontro Internacional de Blogueiros, em Foz do Iguaçu, PR, em outubro.
Os dois encontros sinalizam a consolidação da organização dos blogueiros
progressistas no Brasil e o início de uma articulação internacional.
4.A construção e divulgação da
“Plataforma para um novo Marco Regulatório das Comunicações no Brasil”,
em outubro. O texto que contem as 20 propostas prioritárias, resulta de
um trabalho histórico que convergiu na realização da I Conferência
Nacional de Comunicação (Confecom) e foi inicialmente sistematizado no
seminário “Marco Regulatório – Propostas para uma Comunicação
Democrática”, realizadopelo Fórum Nacional pela Democratização da
Comunicação (FNDC) e outras entidades nacionais e regionais, no Rio de
Janeiro, em maio (ver aqui).
5. A continuidade das
atividades quase heroicas de entidades como a Rede de Educação Cidadã
(Recid) e o Núcleo Piratininga de Comunicação (NPC) promovendoa
comunicação popular e sindical.
A Recid é uma articulação de
atores sociais, entidades e movimentos populares, vinculada à Secretaria
Geral da Presidência da República, que desenvolve um trabalho junto a
grupos vulneráveis econômica e socialmente (indígenas, negros, jovens,
LGBT, mulheres e outros), totalmente à margem da grande mídia. Um
exemplo das atividades da RECID foi a realização da IV Ciranda de
Educação Popular, em maio (ver “Direito à comunicação: o Fórum e a
Ciranda”). Já o NPC dedica-se à assessoria de comunicação – do jornal
impresso à internet, da oratória ao uso do rádio e do vídeo – e oferece,
por exemplo, cursos ligados a comunicação sindical e popular e a
história dos trabalhadores.
6.Os inúmeros observatórios de
mídia, ligados ou não à Rede Nacional de Observatórios da Imprensa
(Renoi), que surgem e se consolidam em vários estados brasileiros,
mobilizando grupos de jovens voluntários que trabalham pelo direito à
comunicação. Um exemplo: o Observatório da Mídia Paraibana, um projeto
de ensino, pesquisa e extensão, criado em 2010, por iniciativa de
estudantes da Universidade Federal da Paraíba, com o objetivo de
analisar a mídia do estado.
7.O processo de consolidação da
Empresa Brasil de Comunicação (EBC) que completou o mandado de sua
primeira diretoria e inicia uma nova gestão ampliando a construção e a
presença de um sistema público de comunicação no território nacional.
Registre-se a continuidade importante de programas como o pioneiro
Observatório da Imprensa na TV e o Ver TV, janelas solitárias para a
discussão da grande mídia na televisão brasileira, comandados,
respectivamente, pelos jornalistas Alberto Dines e Lalo Leal Filho.
8.A criação da Frente
Parlamentar pela Liberdade de Expressão e pelo Direito à Comunicação com
Participação Popular (Frentecom), em abril. A Frentecom, composta por
194 parlamentares e mais de uma centena de organizações da sociedade
civil e coordenada pela deputada Luiza Erundina (PSB-SP) e pelo deputado
Emiliano José (PT-BA), tem como objetivo acompanhar os debates sobre
direito à comunicação e liberdade de expressão no Estado brasileiro,
especialmente na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e
Informática da Câmara dos Deputados e no Ministério das Comunicações.
9.A disponibilização do
cadastro dos concessionários de radiodifusão do Ministério das
Comunicações (Dados de Outorga) cujo acesso voltou a ser permitido, a
partir de 30 de maio, em relação às entidades por localidadee aos sócios
e diretores por entidade.
10.A atitude corajosa de
membros do Judiciário que, na contramão de instâncias superiores,
enfrentam o poder da grande mídia nas suas respectivas áreas de atuação.
Dois exemplos ocorridos em outubro: a entrevista do presidente da
Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul(Ajuris) e a Ação Civil
Pública do Ministério Público da Paraíba, que pede suspensão de programa
por exibição de cenas de estupro de menor, cassação da concessão da TV
Correio (repetidora da TV Record) e pagamento de indenização de R$ 500
mil à menor, pelo uso indevido da imagem, violação da privacidade e
danos morais, além de danos morais à coletividade, no valor de R$ 5
milhões.
“Finalidade sem fim”
Tomo emprestado um pouco da
sabedoria e do otimismo do professor Antonio Cândido, em admirável
entrevista publicada no jornal Brasil de Fato, em julho. Explicando sua
opção socialista, o professor recorre a Kant, via Bernstein, e afirma:
“O socialismo é uma finalidade
sem fim. Você tem que agir todos os dias como se fosse possível chegar
ao paraíso, mas você não chegará. Mas se não fizer essa luta, você cai
no inferno.”
A regulação da mídia para a democratização da comunicação parece constituir uma dessas “finalidades sem fim” em nosso país.
Feliz 2012.
***
[Venício A. Lima é professor
titular de Ciência Política e Comunicação da UnB (aposentado) e autor,
dentre outros, de Regulação das Comunicações – História, poder e
direitos, Editora Paulus, 2011]
Clique aqui para ler o que disse o ansioso blogueiro num seminário de juízes do Rio Grande do Sul: “Na Comunicação, o Brasil é a ditadura perfeita”.Do Blog CONVERSA AFIADA.
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