Além de previsível, por estranho que pareça julgo positiva a nova
insubordinação de cerca de cem chefes militares da reserva contra a
comandante-em-chefe das Forças Armadas, Dilma Vana Rousseff, que,
coincidentemente, é também a presidente da República Federativa do
Brasil, eleita em dia 31 de outubro de 2010 com 55.752.529 votos, os
quais contabilizaram 56,05% do total de votos válidos.
Os militares da reserva – que muitos chamam de militares de pijama,
mas que adotam discurso grandiloqüente e ameaçador que obriga a duvidar
de que sejam só velhinhos mal-humorados – deixam ver que continuam dando
tão pouco valor ao voto popular quanto davam há pouco menos de meio
século, quando jogaram no lixo outros tantos milhões de votos e puseram o
eleito para correr, após o que passaram a impedir que a sociedade
expressasse seus desejos políticos devido a que certamente achavam que
estes não seriam de seu agrado.
Como na época em que os militares aplicaram seu peculiar conceito de
democracia, conceito esse que passava pela nulidade do voto popular,
também temos hoje setores da imprensa falando pelos possíveis golpistas,
mandando recados ameaçadores a quem a vontade dos brasileiros
transmudou em comandante suprema das Forças Armadas.
Um peão que disputa com extensa fila de concorrentes o posto que
Carlos Lacerda ocupou um dia, saiu recitando trecho dos Lusíadas em que a
personagem de Camões recomenda “cuidado” aos portugueses, e faz isso no
mesmo texto em que critica a presidente por ter exigido de cada uma das
Forças Armadas que repreenda seus membros inativos e insubordinados.
Este blog vive recebendo comentários iguais. Recentemente, leitor
postou que se Dilma tentar aprovar uma leia da mídia os seus amigos
militares a derrubarão como derrubaram Jango Goulart. Esse tipo de
comentário, neste blog, é freqüente. Alguns dos que postam essas coisas
se dizem militares e dão a entender que são da reserva, apesar de que
não dão seus nomes.
A diferença desses para o tal colunista é a de que este está ligadão a
militares da reserva, aos amigos desses militares na política e,
supõe-se – devido à grandiloqüência de suas ameaças –, também aos
militares da ativa…
Nesse aspecto, julgo que esse episódio é positivo. Há, na esquerda,
uma moçada que não consegue sequer cogitar a hipótese de que hoje os
militares ousariam deixar os quartéis para derrubar o governo, fechar o
Congresso, estabelecer a censura, prender sem mandato, torturar e
assassinar como ocorreu há quase 50 anos e durante os vinte anos
seguintes.
Quem está certo, este cinqüentão ultrapassado ou a garotada confiante
na força da nossa democracia? Eles que se entendam com o tal colunista
que todos sabem que não passa de um boneco de ventríloquo, de forma a
descobrirem se a sua ameaça a Dilma é só para contentar idosos
preocupados em ter que prestar contas da valentia de há meio século ou
se é algo mais.
De qualquer modo, é bom que tenha ocorrido essa insubordinação. Se
realmente estivermos em 2012 em vez de em 1964, esses militares terão
que baixar a bola, terão que adotar o silêncio a que a opção pela
caserna os obriga constitucionalmente. Do contrário… Bem, prefiro nem
descrever o contrário.
Neste momento, portanto, há que saber se essas pessoas que o Estado
sustenta na aposentadoria podem ou não ser enquadradas nas leis que
regem a nação por questionarem a legitimidade do Poder Legislativo para
aprovar a Comissão da Verdade e por policiarem as opiniões da superior
hierárquica.
De uma coisa podemos estar certos: o desenlace desse episódio
revelará se estivemos brincando de democracia no último quarto de século
ou se ela é para valer. Se houver o risco de o voto dos brasileiros ser
novamente rasgado, pelo menos já iremos escolhendo logo entre lutar ou
capitular diante da ditadura até então camuflada, pois é melhor um fim
terrível do que um terror sem fim.
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