Resenha de ‘A privataria tucana’ causa demissão de jornalista na revista da Biblioteca Nacional
Gabriel Bonis
Gabriel Bonis
A demissão de dois profissionais da revista de História da Biblioteca
Nacional semanas após a publicação de uma resenha favorável ao livro “A
Privataria Tucana”, do jornalista Amaury Ribeiro Jr – fato que despertou
a ira de parlamentares do PSDB, alvo de denúncias na obra – colocou o
veículo no centro de uma polêmica sobre uma suposta intervenção do
partido no caso. A demissão foi apontada na imprensa na coluna do
jornalista Elio Gaspari, na Folha de S. Paulo, da quarta-feira 28.
Publicado em 24 de janeiro, o texto do jornalista Celso de Castro
Barbosa foi alvo críticas de tucanos, que liderados pelo presidente do
PSDB, Sérgio Guerra (PE), ameaçaram processar a publicação, editada pela
Sociedade de Amigos da Biblioteca Nacional (Sabin) e que da Biblioteca
Nacional recebe apenas material de pesquisa e iconografia.
Como resultado, a revista retirou a resenha do ar. “Fui censurado e injuriado”, diz o jornalista em entrevista a CartaCapital.
Barbosa destaca que a remoção do texto ocorreu apenas “após o chilique
do PSDB” em 1º de fevereiro, nove dias depois da publicação em destaque
na primeira página do site da revista. O motivo seria uma nota divulgada
em um jornal carioca, segundo a qual a cúpula do partido estava
“possessa” com a revista, tida pela legenda como do governo.
A evidente pressão externa fez com que o jornalista recebesse um chamado
do editor-chefe da publicação, Luciano Figueiredo, naquele mesmo dia.
“Ele [Figueiredo] disse concordar com quase tudo que havia escrito, mas o
Gustavo Franco [ex-presidente do Banco Central no governo FHC] leu, não
gostou e resolveu mobilizar a cúpula tucana.”
Para conter o movimento, relata, o editor-chefe se comprometeu a
escrever uma nota assumindo a culpa pela publicação do texto. “Eu disse:
‘Culpa de que? Ninguém tem culpa de nada. É uma resenha de um livro.’”
No dia seguinte o diário O Globo destacou a história e um pronunciamento
da Sabin a dizer que os textos da revista são analisados pelos
editores, mas aquela resenha não havia sido editada. “Subentende-se que
publiquei por minha conta”, ironiza Barbosa.
Por outro lado, em matéria publicada na terça-feira 27 no site do
Sindicato dos Jornalistas do Rio de Janeiro, dois editores da revista,
Vivi Fernandes de Lima e Felipe Sáles, desmentem a Sabin e confirmam ter
editado a resenha antes da publicação no site.
Críticas a Serra
O texto de Barbosa destaca a vivacidade do jornalismo investigativo no
livro e sugere que José Serra esteja “morto”. O ex-governador de São
Paulo também é citado como a figura com a “imagem mais chamuscada” pelas
denúncias, além de questionar a origem de seu patrimônio. (Leia o texto
aqui)
Inconformado com a resenha, Guerra chegou a enviar cartas de protesto à
ministra da Cultura, Ana de Hollanda, e a Figueiredo. Outros tucanos
alegaram que a publicação era pública, trazia os nomes da presidenta
Dilma Rousseff, e de Hollanda no expediente e recebia verba da
Petrobrás. Logo, deveria se manter isentada de questões políticas.
Mas Barbosa destaca que a dona da revista é a Sabin. “Uma entidade privada, composta inclusive por bancos.”
O patrocínio, defende, não seria impedimento para a manifestação de
opiniões no veículo. “Não está escrito na Constituição que em revista
patrocinada pela Petrobras a manifestação contra eventuais adversários
do governo é proibida.”
A revista, por outro lado, preferiu divulgar nota pedindo desculpas aos
ofendidos pelo texto, além de alegar não defender “posições político-
partidárias”.
Em meio ao ocorrido, Barbosa afirma ter sido ameaçado com um processo
por Guerra e, após a pressão dos tucanos, seus editores avaliaram que
seria menor que trabalhasse em casa.
Devido à situação, o jornalista revela ter questionado o posicionamento
de Figueiredo em um email aberto à redação, no qual perguntava sobre a
nota que o editor-chefe escreveria em seu apoio. “Ele escreveu uma nota
mentirosa e deu para o presidente da Sabin assinar. Depois, em 29 de
fevereiro, me demitiu.”
Sobre a reação tucana, Barbosa acredita que o partido poderia ter agido
de outra forma. “Vivemos em um país livre e a Constituição me garante o
direito à opinião.”
O jornalista se refere a declarações de parlamentares do PSDB, que o
chamaram de “servidor público a favor do aparelhamento do Estado”. “Se
há algum erro no tom, é deles [tucanos], não meu. Sequer tinha carteira
assinada e cumpria jornada sem direito trabalhista.”
Um dos motivos pelo qual Barbosa processa a revista. “Na ação, também
peço indenização por danos morais e uma retratação pela nota mentirosa.”
Procurada, a Sabin informou, via nota assinada pelo presidente da
instituição, Jean-Louis Lacerda Soares, que “não interfere no conteúdo
editorial da revista”, pois a “atribuição relacionada ao conteúdo é do
Conselho Editorial”.
A sociedade nega ter sofrido interferência externa nas demissões e diz
que o jornalista Celso de Castro Barbosa foi demitido pelo então editor
Luciano Figueiredo, por sua vez, dispensado “exclusivamente por razões
administrativas.”
A reportagem de CartaCapital também contatou Luciano Figueiredo por meio
da assessoria de imprensa da Universidade Federal Fluminense,
instituição na qual leciona, e foi informada de que o historiador não
poderia dar entrevistas.
Outra tentativa foi realizada por email, mas não houve resposta do professor até o fechamento desta reportagem.
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