De uns tempos para cá, começou a ganhar circulação a ideia de que
estamos marchando em direção à confluência de duas crises. Ambas graves.
De um lado, uma crise na economia, cujos sinais seriam já evidentes:
redução do ritmo do crescimento, diminuição do investimento externo,
retração na industria, queda no comércio internacional.
De outro, uma crise política, ainda não explicitada por completo, mas
latente. Indicando-a, os recentes problemas no relacionamento político
dentro da coalizão governista e uma presumida desarmonia na
administração federal.
Não se estabelece com clareza quando as duas se encontrariam. Mas fica
subentendido que antes de outubro de 2014. Ou seja, em tempo de
influenciar - ou mesmo revolucionar - o ambiente em que ocorrerá a
próxima eleição presidencial.
Trocando em miúdos: a sucessão de Dilma, antes previsível, estaria se
tornando incerta. O amplo favoritismo que tem hoje seria engolido pelas
crises, uma reforçando e amplificando a outra.
É desnecessário dizer que a tese da “crise perfeita que se avizinha” foi
elaborada e está sendo difundida pelas oposições, muito especialmente a
oposição não-partidária, na sociedade civil e na imprensa.
É difícil, atualmente, ler algum comentário ou interpretação que não a
mencione ao discutir o cenário político atual e suas perspectivas. Tudo
passou a ser visto em função dela.
Até coisas que nada têm de real.
Só um otimista irracional acreditaria que a economia brasileira poderia
atravessar incólume as intempéries que atingem os países avançados.
Vamos pagar um preço por elas e já o estamos pagando em alguns setores.
A questão não é, portanto, se teremos ou não dificuldades econômicas no
futuro imediato, mas qual sua intensidade e quais suas consequências na
política, mais especificamente na eleição de 2014. É isso que alguns
pintam com cores sombrias, pois não gostam da perspectiva que sejam
menos agudas.
Para estimar o que aguarda Dilma, convém não esquecer que Lula viveu a
manifestação anterior dessa crise na economia global sem solavancos na
popularidade.
Entre o final de 2008 e os primeiros meses de 2009, as pesquisas
mostraram um expressivo incremento das preocupações da população a
respeito de inflação, desemprego e perda de capacidade de consumo. Elas
atingiram seu pico em dezembro de 2008, quando, em pesquisa da Vox
Populi, 58% dos entrevistados disseram esperar a subida da inflação e
63% o aumento do desemprego.
Enquanto isso, a avaliação positiva do governo Lula sempre se manteve
elevada, indo, de acordo com dados do Datafolha, de 55% em março de 2008
a 65% um ano depois, em março de 2009. Em outras palavras, atravessando
a turbulência em ascensão.
O que vemos é que não há incompatibilidade entre percepção de problemas
econômicos e aprovação governamental. Ao contrário do que pensam alguns,
as pessoas são perfeitamente capazes de separar as duas coisas.
Quanto à “crise política”, o que estamos presenciando agora nada tem de
diferente do que sempre acontece às vésperas de eleições municipais.
Nelas, as alianças e coligações raramente repetem, em cada lugar, os
acordos nacionais. Quem anda junto na hora de escolher presidente pode
caminhar separado quando se discutem prefeituras.
Assim, as desavenças pontuais entre os partidos da base governista nada
sinalizam quanto ao comportamento que adotarão daqui a dois anos. Lá,
avançarão unidos - ou não - em função do que estiver acontecendo no
momento, sem nem se lembrar que se enfrentaram neste ou naquele
município.
Quem lê a imprensa internacional fica com impressão bem diferente do
horizonte à nossa frente. Ninguém aposta - ou deseja - a “crise
perfeita”.
No fundo, a tese nada mais é que a admissão de que, se nada de
catastrófico ocorrer, a política brasileira continuará fundamentalmente
como está.
O que equivale a reconhecer a força e a capacidade do “lulopetismo” e a julgar com severidade as oposições e suas lideranças.
Marcos Coimbra, sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi
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