É preciso entender que conflito entre o governo e parte do PMDB envolve interesses maiores do que vagas no Ministério
Depois de passar o mandato inteiro tomando pancada porque era acusada
de barganhar ministérios por minutos no horário político e permutar
verbas públicas por apoio no Congresso, agora Dilma Rousseff é criticada
porque definiu um limite para as tratativas e negociações com o PMDB.
A mais nova catástrofe anunciada de seu governo é a possibilidade do
partido de Michel Temer e Eduardo Cunha romper a coalização construída
em 2010. Como tantas catástrofes que expressam acima de tudo um
inconfessável desejo político, as chances de uma ruptura ocorrer são
reais, mas remotíssimas.
Não é isso que cabe discutir aqui, porém.
O visão criminalizante sobre o conflito entre o governo e o PMDB
sustenta que Eduardo Cunha quer mais empregos e mais verbas –
mercadorias que se costuma classificar como sujeira política, quando
praticada pelo adversário, ou como sacrifício necessário, quando se
trata de um aliado.
Em qualquer caso, descreve-se um jogo sem saída, que Dilma perderá em
qualquer hipótese no balanço final. Se atrair o PMDB, terá sido porque
sujou-se. Se não atrair, demonstrou incompetência e falta de apetite
para o jogo político como ele é.
Caso o PMDB fique na aliança, vamos descobrir quanto ganhou por isso. Caso vá embora, vamos apurar quanto Dilma perdeu.
Em qualquer caso, avançam nossos sábios, terá sido mais uma
demonstração de sua inferioridade diante de adversários supostamente
competentes, modernos, atualizados, preparados, simpáticos e
carismáticos, blá, blá, blá -- ainda que os números de intenção de voto
digam que ela tem chances matemáticas de levar a eleição no primeiro
turno. É isso, no fundo, que se pretende demonstrar.
Prisioneiros de um olhar moralista que tenta criminalizar toda
atividade política, impede debater interesses de fundo e diferenças
importantes para a maioria da população, procura-se fingir que não há
nada mais relevante do que um ministério a mais (ou a menos) em
Brasília.
O fenômeno é conhecido. Depois de criar uma lenda, é preciso, pelo menos, fingir que se acredita nela.
Vamos falar de política. Eduardo Cunha, Gedel Lima, Sandro Mabel e
outras estrelas do PMDB integram a parcela reacionária de um partido
desigual e disforme. Têm peso no Congresso, sim. Mas expressam
interesses de grandes empresários que, como todos aprendemos , sei lá,
desde que o capitalismo começou a funcionar em determinado ponto da
Escócia, não costumam ser os mesmos da maioria das pessoas.
Eles agem como adversários políticos de projetos essenciais para o governo e de interesse da maioria dos brasileiros.
Cunha, por exemplo, é o principal porta-voz dos interesses das empresas
de telefonia que querem acabar com a neutralidade do Marco Regulatório
da Internet. Um negócio que vale bilhões para as empresas e que,
conforme a decisão dos parlamentares, irá transformar a rede – até agora
um espaço público – numa feira de negócios e cobranças indevidas para
empresas privadas, prejudicando milhões de usuários.
Sandro Mabel é o profeta da eliminação da CLT, que pretende trocar por
um projeto de terceirização completa do mercado de trabalho. Dá para
acreditar? Eliminar a Era Vargas estava no programa de Fernando Henrique
Cardoso, não de Lula.
Geddel Lima é um tucano que permanece no PMDB por interesses
particulares, utilizando o apoio ao governo federal para receber
recompensas de praxe. Não gosta e nunca gostou de Dilma, nem de Lula nem
do PT.
Você pode concordar – ou não – com os pontos de vista de Cunha, Mabel, Geddel e tantos outros.
Só não vale fingir que eles não tem relevância e interesse. Esse é o
truque: mascarar a diferença política para transformar tudo em jogos de
aparelhos, cargos públicos e dinheiro pesado, é a melhor forma de
despolitizar a democracia e deseducar o eleitorado.
Nivelando por baixo, todos ficam iguais. Acho que dá para entender, não?
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