“Yoani denuncia Cuba e está livre. Bradley Manning denunciou atrocidades dos EUA e pode ser condenado à morte”
No Diário do Centro do Mundo
— Roberto Locatelli
O calvário de Bradley Manning, o recruta acusado de ter vazado documentos para o Wikileaks.
A Personalidade do Ano, segundo os leitores do Guardian, foi Bradley Manning.
Clap, clap, clap. De pé.
Só que Manning está na cadeia há mil dias, completados hoje, sob a
acusação de ter vazado os célebres documentos com os quais o Wikileaks
mostrou ao mundo a natureza da Guerra do Iraque.
Sem julgamento, além de tudo.
Um leitor do Guardian expressou assim sua escolha por Manning: “Ele se
manteve firme em sua batalha pelo uso democrático da informação, a
despeito da imensa pressão física, moral e psicológica posta sobre ele
por seus superiores bas Forças Armadas, incluído o presidente dos
Estados Unidos.” Palavras do editor do Guardian que coordenou o projeto:
“Aprendemos um bocado sobre nossos leitores e sobre nossos herois “.
Manning, se fez mesmo o vazamento, o que é provável, combateu o bom
combate. Não é à toa que muitas pessoas o indicaram para o Nobel da Paz.
Mas o que ele ganhou mesmo foi um regime de prisão solitária capaz de
destruir a sanidade rapidamente. Manning só saiu da solitária por
pressão de ativistas, entre os quais se destaca o jornalista americano
Glenn Greenwald. Greenwald foi a primeira voz a denunciar as condições desumanas em que vivia Manning.
Graças ao vídeo vazado, o mundo pôde ver o que era a Guerra do Iraque.
Pôde ver, também, o caráter das guerras movidas no Oriente Médio pelos
Estados Unidos em nome da civilização e da democracia. Pôde ver, ainda,
o terror da Guerra ao Terror.
Os iraquianos viviam melhor sob Saddam Hussein do que sob os
americanos. Da mesma forma, os afegãos viviam melhor sob o Talibã do que
sob os americanos.
Manning contribuiu para que todos pudéssemos entender melhor as
coisas. Você não resolve um problema se não consegue enxergá-lo.
Manning nos ajudou a todos a enxergar o problema.
Pessoas nas ruas comemoram a chegada das tropas americanas |
A humanidade como que acordou depois dos vazamentos atribuídos a
Manning. A Primavera Árabe é, em boa parte, fruto dos documentos que
foram publicados. A corrupção e a violência de governos de países como o
Egito e a Tunísia ficaram dramaticamente expostas. E isso foi
essencial para que as pessoas tomassem as ruas e varressem
administrações predadoras — apoiadas, aliás, pelos Estados Unidos.
A Primavera Árabe acabou contagiando até os americanos. O movimento Ocupe Wall St foi inspirado nela.
Com tudo isso, a agenda planetária mudou. Foi numa atmosfera
internacional de protesto e inconformismo que emergiram estatísticas que
mostram a espetacular concentração de renda ocorrida nos países ricos
nos últimos trinta anos. Bradley Manning está na origem dessa mudança
formidável que vai se operando no mundo.
Por isso é um herói, como reconheceram os leitores do Guardian. Leia mais: ‘Estava certo de que ia morrer naquela cela animalesca’ Leia mais: “Peço ao presidente Obama para fazer a coisa certa”
Paulo NogueiraNo Diário do Centro do Mundo
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