quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Brizola e os royalties


O grande amigo Apio Gomes, companheiro e fiel guardião da memória dos quase 600 textos publicados por Leonel Brizola em seus “tijolaços”, manda uma preciosa contribuição a esta história dos royalties do petróleo.
Pouca gente sabe, mas se o Rio não recebia nada pelo petróleo da Bacia de Campos. Conseguiu, a duras penas, ter o mesmo tratamento legal do petróleo extraído de outras áreas.
Deixemos que o próprio Leonel Brizola explique:
“O Congresso Nacional deverá estar decidindo, neste momento, sobre os chamados “royalties” do petróleo. O povo do Rio de Janeiro precisa saber, em detalhes, o que vem se passando com esta importante questão. Trata-se de uma causa mais que justa; um direito mesmo das populações de cujos estados se extrai petróleo, em terra ou em suas plataformas marítimas.(…)
Ao aprovar este projeto, o Congresso inspirou-se na legislação original que instituiu a Petrobras. Efetivamente, a Lei 2004/53, em seu artigo 27, § 4º, determinou que aos estados e municípios onde houvesse extração de petróleo caberia uma participação de 5%, também a título de indenização pelos problemas e transtornos decorrentes. Estes foram os objetivos e o espírito da Lei. Não se estabeleceu o mesmo em relação às plataformas submarinas porque, à época, não se previa este tipo de exploração. Tratou-se, por conseguinte, no atual projeto, de estender, com os mesmos fundamentos, benefícios e direitos já reconhecidos e consagrados em lei, há cerca de 30 anos. (28 de setembro de 1984.)
Só que, mesmo aprovado o projeto, o Congresso não derrubou o veto então Presidente João Figueiredo.
Veio a Nova República e José Sarney, cumprindo (na aparência) o compromisso firmado por Tancredo Neves com Brizola, retirou o veto. Retirou, mas não pagou.
“Como é do conhecimento de todos, o Governo Federal, através da Petrobras, deveria ter repassado ao Estado, no dia 2 deste mês, a quota correspondente aos royalties do petróleo do 1º semestre deste ano (cerca de 150 milhões de cruzados - nota: US$ 10, 7 milhões). É o que determina a lei. No dia 2 último, oficiamos ao Presidente da Petrobras, indicando a conta do Estado no Banco do Brasil, onde estes recursos do povo do Rio de Janeiro deveriam ser depositados. O Sr. Presidente da Petrobras informou que dependia de uma determinação do Conselho Nacional do Petróleo. Fomos ao Presidente do CNP, o qual nos declarou que o assunto está sendo discutido no Planalto (Ministro Marco Maciel) e no Ministério de Minas e Energia (Ministro Aureliano Chaves). Recolhemos a informação de que o pagamento ao Estado dependeria de uma nova lei (!). O Presidente Sarney sancionou a lei dos royalties em Campos, comprometendo, frente ao povo fluminense, a sua própria palavra. Se dependiam de alguma regulamentação para entregar estes recursos aos municípios, por que não tomaram estas providências nestes quase quatro meses? Mas, no caso do Estado, a rigor, não existe razão alguma para novas exigências. Não há o que regulamentar. A Petrobras sabe o óleo e o gás que extraiu e dispõe dos preços. Basta um simples cálculo, isto é, 1,5% sobre este total; e nada mais, senão depositar estes recursos em nome do Estado. O que se pretende, afinal?” (25 de abril de 1986)
O que se pretendia era não pagar os royalties enquanto Brizola estivesse no Governo. Seis meses depois, ele escrevia:
“Foram anos de luta. Aprovação unânime do Congresso. O Presidente Sarney veio a Campos promulgar a Lei. Vetou a restrição introduzida pelos politiqueiros do PMDB–PFL para que os pagamentos só se realizassem a partir do segundo semestre (eleições…) Vejam: este é o espírito e a letra da decisão presidencial. Antecipar e não retardar os pagamentos. Acima de tudo era a palavra do Primeiro Magistrado da Nação. E que se verificou? Quando, no dia 2 de abril, procuramos receber a primeira quota, nos termos da lei e do compromisso solene do Presidente da República, nos deparamos com esta vergonha. Todos se escusavam, pois ficaram quatro meses sem tratar do assunto. Há muito já deviam estar combinados. Foi, então, que mandaram um novo projeto de lei para o Congresso. Uma nova lei para regulamentar outra lei, invocando falsas razões. No caso do Estado, a lei é auto-aplicável. O que não queriam e não querem é repassar estes recursos ao Governo do Estado do Rio de Janeiro, por mesquinhas preocupações eleitoreiras. O Sr. José Sarney demonstrou ser um presidente fraco. Permitiu que o facciosismo e a politicagem tivessem mais peso que a sua palavra. O que é isso se não uma política discriminatória? E mais ainda, um procedimento faccioso e lesivo ao interesse público. Aos cúmplices que vivem aqui e se nutrem do Rio de Janeiro, não adianta argumento algum. As Organizações Globo, por exemplo, chegam a ponto de não considerar este episódio um fato jornalístico, digno de seu noticiário. Nos primeiros dias de abril, deveriam repassar ao Estado cerca de Cz$ 300 milhões (300 bilhões de cruzeiros). Daqui a uma semana, deviam estar repassando quantia igual. Tudo indica que o repasse de outubro também não será feito. Aí temos, portanto, quase 1 bilhão de cruzados (1 trilhão de cruzeiros – nota: cerca de US$ 75 milhões ) subtraídos à população e à economia do Estado do Rio de Janeiro. Entrego ao sereno julgamento da população este vergonhoso episódio.”
Os royalties do petróleo, afinal, só foram pagos ao Rio de janeiro quando Moreira Franco instalou-se no Palácio Guanabara.
Quem viveu esta história de discriminação não pode concordar que o Rio perca aquilo que levou tanto tempo para conquistar. Do mesmo modo que não pode, por uma questão de justiça, deixar de reconhecer que há tanto petróleo no pré-sal que não se pode pretender, para ele, o mesmo tratamento que se dava a jazidas muito menores.
Não existiam as participações especiais e os valores das receitas eram, como você viu, muitíssimo inferiores aos atuais, que chegam perto de US$ 6 bilhões, no total. Mesmo com a inflação do dólar nestes 25 anos, não são quantias comparáveis. Mesmo menores, porém, fizeram muita falta ao Estado.

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