“As massas de jovens e velhos precarizados do Occupy são o atestado de derrota da geração pós-neo-conservadora, pró-establishment e anti-tudo”
Márcia Denser |
Estou fechando minha coluna hoje, quarta, 23 de maio, aliás, dia do meu nat,
aproveitando para agradecer coletivamente, de todo o coração, às
dezenas de cumprimentos, lembranças e manifestações de afeto recebidas
de amigos das redes Facebook, Likedin, etc., aproveitando para tornar à
pauta do Occupy (ensaio publicado recentemente pela Boitempo), os movimentos de protesto que tomaram as ruas do planeta.
Chamou especialmente minha atenção um trecho do artigo do crítico
Vladimir Safatle, da USP, onde, a propósito, ele fala do tempo e da
questão geracional, com o título “A geração que quebrou o mundo”.
Diz ele: “Hoje, nem acredito, estou chegando aos quarenta anos. Lembro
que na idade de vocês, dezoito, dezenove, vinte anos, costumava ouvir
que não havia mais luta política a ser feita, que o mundo estava
globalizado e o que valia era a eficácia, a capacidade de assumir
riscos, de ser criativo, inovador, de preferência em alguma agência de
publicidade ou departamento de marketing”.
Segundo Vladimir, se assumissem essa “nova realidade”, as pessoas entrariam num futuro radiante onde só haveriam vencedores e raves,
onde os que ficassem para trás teriam um problema moral, pelo fato de
não assumir riscos e a necessidade de inovação, etc. Então, penso
ironicamente, de fato, realizar o “socialismo para os ricos”, salvando
bancos, etc., realmente SERIA um tarefa e tanto!
As pessoas que acreditaram em tal discurso há vinte anos – e que hoje
estão em torno dos quarenta – foram trabalhar no sistema financeiro e
conseguiram criar uma crise maior que a de 1929, da qual ninguém sabe
sair. Ou seja, admite Safatle, eles simplesmente conseguiram quebrar o
mundo! Para essa geração, não era possível que o futuro fosse diferente
do presente. Ela não acreditava, em nenhuma hipótese, na capacidade de
transformação da participação popular, considerando isso chavão
ideológico ridículo.
Diz ele: Como assim participação popular? Isso não existe mais!
Manifestações? Isso não existe (num mundo globalizado para cima)! Vocês
não deveriam existir! Por isso, essa geração é a primeira a dizer que
vocês não sabem o que fazem, são uns sonhadores, que, no máximo, só
podem aparecer como fundo em comerciais de jeans! Pois, se vocês
mostrarem que a força crítica do pensamento é capaz de reconstruir
nossas relações sociais, então eles se perguntarão: o que fizemos esse
tempo todo? Como fomos capazes de acreditar em algo que agora desmorona?
As massas de jovens e velhos precarizados do Occupy são o atestado de derrota dessa geração pós-neo-conservadora, pró-establishment e anti-tudo.
Por que a crise econômica ficou desse tamanho? E mais: como foi possível
que se praticasse este verdadeiro genocídio econômico? Os mesmos bancos
que, há três anos, estavam quebrados, hoje estão superavitários. Graças
ao dinheiro do Estado. Assim, que sistema político é esse que é
incapaz de colocar contra a parede quem destrói a vida, o direito ao
trabalho, à saúde, à educação e a propriedade das famílias?
Perto do que se fez hoje em termos de desapropriações – a expulsão das
famílias de suas casas em razão de hipotecas impagáveis –, a turma de
Lenin em 1917 foi piquenique de freiras! Como bem lembrou Slavoj Zizek,
alguém devia ter colocado essa turma para trabalhar durante a Revolução
Russa!
Mas voltando ao Occupy: ele é um primeiro passo, mas este grande
movimento está apenas começando e tais processos são lentos. Lembrando
Freud: “A razão pode falar baixo, mas não se cala”.
Aqui uno minhas idéias às de Safatle: realmente, não dá mais para
confiar em partidos, sindicatos, estruturas governamentais que não podem
funcionar como instrumentos de rupturas radicais, como é precisamente o
caso. Vladimir lembra que na Grécia governa um partido
social-democrata, o Pasok, de esquerda; na Espanha, um clássico partido
pseudo-esquerdista, o PSOE – Partido Socialista Operário Espanhol, e
isto para não falar nas estruturas políticas norte-americanas,
nacionais, etc.etc.etc: ora, com uma esquerda como esta, quem precisa de
direita? Todos jogam no mesmo time. E isto significa que a época em que
as pessoas se mobilizavam em torno de siglas e partidos acabou
radicalmente.
E o que vem por aí, só o futuro dirá, contudo o movimento Occupy
já acena com algumas respostas. E os ricos do planeta – aqueles mesmos
pertencentes à geração que quebrou o mundo – não vão gostar de ouvi-las.
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