O grande problema de Deus é que não o conhecemos senão na mente e no
coração dos homens. E os homens constroem a sua fé com a frágil
experiência de seus limitados sentidos, suficientes apenas para o
trânsito no mundo em que vivemos. Os olhos podem crescer nos telescópios
e ir ao fundo dos universos, ou na perscrutação das moléculas e átomos,
mas isso é pouco para encontrar Deus, e menos ainda para construí-lo.
Sendo assim, e desde que há comunidades políticas, o monoteísmo tem
servido para identificar ou acerbar as razões ou desrazões nacionais.
O Ocidente judaico-cristão não assimilou a chamada terceira revelação, a
de Maomé, embora ela não tenha significado nenhuma apostasia essencial
ao hebraísmo. O problema se tornou político, com a expansão dos povos
árabes pelo norte da África e a invasão da Península Ibérica. Os
islamitas sempre toleraram os cultos judaicos e cristãos nas áreas sob
sua jurisdição política, mas a política recomendava aos reis cristãos a
expulsão dos árabes da Europa e a guerra, continuada, fosse para
contê-los, fosse para fazê-los retroceder ou para eliminá-los.
As cruzadas ainda não acabaram, e se tornaram menos românticas e mais cruéis por causa do petróleo.
Agora, um filme de baixa qualidade técnica e artística – conforme a
opinião de especialistas – traz novo comburente às velhas chamas. Sem
nenhum fundamento histórico, um fanático israelita (é o que se sabe)
produz película eivada de insultos e ódio contra o fundador do
islamismo, como se Maomé tivesse sido o mais infame e desprezível
personagem da História. Como o filme foi produzido nos Estados Unidos, a
reação imediata foi contra as representações diplomáticas nos países
islâmicos. Essa reação, que culminou com a morte do embaixador
norte-americano na Líbia, ainda não se encontra contida, e é provável
que ainda se agrave, apesar das declarações do governo norte-americano,
que busca distanciar-se dos insultos.
Os republicanos, em plena campanha eleitoral, devem ter exultado. A
morte do Embaixador (asfixiado no incêndio do Consulado em Benghazi)
pode ter sido uma baixa para os seus quadros, mas representa um trunfo
contra Obama: sua política não tem conseguido dar segurança absoluta aos
cidadãos norte-americanos. É essa a mensagem de Romney ao eleitorado
dos Estados Unidos. A resposta de Obama, enviando dois destróieres à
Líbia, não foi a melhor para reduzir as tensões; ela pode
intensificá-las.
O que o governo de Washington e os republicanos não dizem é que o apoio,
incondicional, aos radicais de Israel, que pregam abertamente a
eliminação dos muçulmanos do mundo — assim como os nazistas desejavam a
eliminação de todos os judeus – estimulam os insultos infamantes ao Islã
e a resposta espontânea e violenta dos fanáticos do outro lado contra
aqueles a quem atribuem a responsabilidade maior: os norte-americanos. E
há ainda a hipótese, tenebrosa, mas provável, diante dos precedentes
históricos, de que as manifestações tenham partido de agentes
provocadores dos próprios serviços ocidentais – ou israelistas, o que dá
no mesmo.
A mentira de Blair e Bush – dois homens que o bispo Tutu, da África do
Sul, quer ver no banco dos réus em Haia – custou centenas de milhares de
civis mortos no Iraque e no Afeganistão, e muitos milhares de jovens
norte-americanos mortos, feridos, enlouquecidos nos combates inúteis.
Nada é pior para os capitalistas do que a paz – e nada melhor do que a
guerra, que sempre os enriquece mais, e na qual só os pobres morrem.
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