Quem tem medo da mensagem das urnas
Paulo Moreira Leite
Confesso que o sorriso amarelo dos coveiros de Lula e do PT é um dado preocupante de nosso momento político.
Explico. Nos tempos da ditadura, o grande Ulysses Guimarães,
personalidade maior da resistência, dizia que era preciso ouvir a voz
das ruas. É que naquele tempo, com a imprensa censurada, os deputados
cassados, os partidos reprimidos, o país falava pelas ruas. Eram
passeatas, protestos e greves.
Quem ouviu a voz das ruas se deu bem. Percebeu o rumo da história,
modificou prioridades, apostou na direção do futuro. Quem não entendeu
isso ficou olhando a vida passar pela janela.
A voz das urnas de 2012 é muito clara. Olhe só:
a) o PT recebeu o maior número de votos da campanha. Ou seja: no país
inteiro, 17, 3 milhões de brasileiros saíram de casa, há dois dias, para
votar em candidatos deste partido; o PSDB teve 3 milhões de votos a
menos;
b) o PT ganhou 14% a mais de prefeituras, enquanto o PSDB perdeu 12% e o PMDB perdeu 14%;
c) entre as cidades de mais de 200 000 habitantes, o PT foi melhor que
os outros; emplacou 8 prefeitos no primeiro turno e disputará 22
prefeituras em segundo turno; o PSDB, que ficou em segundo, ganhou 6 e
disputa 17;
d) entre partidos menores, o PSB cresceu muito. O número de prefeituras
aumentou 43%. Vamos lembrar: o PSB não é um partido de oposição nem é
neutro. Faz parte da base do governo Dilma e colhe os benefícios do
crescimento do Nordeste, acelerado a partir de 2003. A maior vitória do
PMDB ocorreu no Rio de Janeiro e envolve uma aliança federal e
municipal entre o Planalto e os peemedebistas de Sérgio Cabral e Eduardo
Paes. Eles também são aliados de Lula e Dilma. Numa cidade célebre por
seu oposicionismo, onde se vaia até minuto de silêncio, a situação teve
64% dos votos.
e) o PSD surgiu hoje como a quarta legenda. Vamos lembrar: quando
Gilberto Kassab disse que ia fazer um partido que não era de esquerda
nem de direita, ele queria dizer que estava indo da direita para a
esquerda – e se aproximava de Dilma. Tomou porrada por isso. Não por uma
suposta impureza ideológica.
Estes dados me parecem sólidos o suficiente para dizer quem ganhou a
eleição. Em função do segundo turno, é cedo para medir o resultado pelo
número final de prefeituras conquistadas. Este aspecto é
importantíssimo.
Mas para medir a vontade do eleitor, este é o melhor momento. Todo
mundo teve direito de levar sua mensagem a TV, dar porrada, levar
porrada, e o saldo está aí.
Voltando à mensagem da rua e das urnas.
Quem não entendia a mensagem da rua, no tempo da ditadura, partiu para a
ignorância. O povo dizia que queria democracia e eles até atrapalhavam a
abertura lenta e gradual. Matavam presos políticos para criar crises e
elevar a tensão. Promoviam atentados terroristas, com a mesma
finalidade. Fizeram a bomba do Rio Centro, explodiam bancas de jornal.
Assassinaram dona Lida, secretaria da OAB. Infiltravam-se em greves,
assembleias, passeatas.
Essa reação criminosa é inaceitável mas pode ser explicada. Incapaz de
dar respostas à história, o que dificulta até o dialogo com os próprios
filhos, o sujeito procura ressuscitar o passado através de ações
criminosas.
É aquela cena de filme de terror classe B em que o morto vivo ressurge de dentro da terra.
Também temos, em 2012, quem não consegue sequer ouvir a voz das urnas.
E isso é um problema?
Eu acho. Não digo que leva o cidadão para o terrorismo. Não obrigatoriamente rsrsrsrs.
Mas leva ao jogo sujo. Leva a mentira, a trapaça. Por que? Porque a
pessoa parou de trabalhar com a realidade, deixou de olhar para aquilo
que eu e você podemos ver – e que o números de domingo mostram – para
jogar com sua própria fantasia. Não aceita que a maioria dos cidadãos
aprove um governo que realizou mudanças modestíssimas, precárias, etc,
mas que lhe permite viver um pouco melhor, comer um pouco melhor e
assim por diante.
E é da democracia aceitar que a maioria – mesmo a mais humilde, menos
educada formalmente – tem o direito de optar por seu destino. É
democrático procurar entender o que a maioria diz e pretende. Até para
tentar convencê-la a mudar de pensamento, se for o caso.
Quem não enxerga a maioria, não compreende o que ela diz, tem reações
autoritárias. Parte para o baixo nível, o jogo sujo, a mentira.
E é este, só este, meu receio para o segundo turno. Negar o que as urnas
disseram, há dois dias, é procurar um caminho para a baixaria que todos
conhecemos e lamentamos. Ou será que para alguns não há alternativa?
Deu para entender, certo?
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