O tucano José Serra esgotou seu repertório antes de terminar a campanha.
Seu maior problema nesses dias que restam da disputa em SP é decifra o
enigma: o que mais dizer ao eleitor que não o ouviu até agora?
A percepção mais grave é que sua narrativa perdeu significado para o
próprio PSDB. Pior: a imensa rejeição que atrai tornou-o um estorvo
ambulante para o futuro do partido.
A obsolescência contagiosa prenuncia-se em isolamento. Este se reflete
nos recados de pavões partidários, sempre ágeis em se desvencilhar do
legado de uma derrota. Sobretudo, quando tende a deixar sequelas na
opinião pública simpatizante da legenda.
FHC e Sérgio Guerra vazam desapontamento com a condução das
coisas em SP. Contabilizam como erro primário a fusão da candidatura com
a agenda da intolerância.
O horizonte de uma vitória tucana em SP, associado a um termidor de
malafaias, colocou em alerta parcelas da classe média que orbitam em
torno do PSDB; adensou a percepção do partido como um agrupamento que
age e urdi na base do vale tudo que condena.
Não só. Muitos consideram inábil a sôfrega exploração do julgamento em curso no STF pela campanha em SP.
Serra está distribuindo milhões de adesivos com o slogan 'Diga não ao mensalão'.
A panfletagem é uma parceria calculada com o calendário desfrutável do
Supremo, que deve culminar esta semana com a deliberação de penas.
É o tour de force que lhe restou nas horas que correm. Pode siginificar
um desastrado saque contra o futuro, na avaliação de analistas
embarcados na sorte do PSDB.
A mão grande de Serra na cumbuca da Ação Penal 470 dessacraliza um
trunfo nacional contra o PT em 2014. Ademais de arguí-lo com uma derrota
nas urnas em São Paulo, subtrai ao julgamento um cerimonial de
ecumenismo e equidistância que o legitimaria.
Serra ignora limites e ponderações. A soberba é o seu ponto forte.
Do alto dela, o ex-governador menosprezou a importancia de uma
plataforma consistente para concorrer em SP. Um aggionamento
programático de seu perfil teria sido estratégico para suavizar as
marcas ainda recentes de um abalroamento triplo, a saber: a) a segunda
derrota presidencial em 2010, desta vez para uma adversária que ele
próprio definia como 'um poste'; b) o bom governo e a elevada aprovação
popular que 'o poste' exibe hoje, desautorizando-o como avalista de um
desastre que não se consumou; e, ao contrário, c) o desastre executivo
de proporções ferroviárias da gestão que bancou como a melhor para São
Paulo - a de seu afilhado Gilberto Kassab, catalisador de um sentimento
de rejeição quase unânime na cidade, expresso no desejo de mudança
administrativa de 88% da população; sendo este o principal flanco da
candidatura tucana.
O raciocínio político tosco é outro traço que os próprios amigos da Unicamp creditam a Serra.
O ferramental rudimentar definiu o teto de sua liderança com um pé
direito insuficiente para acomodar todo o PSDB e convencer a sociedade a
lhe conceder a delicada tarefa de presidir a Nação.
A falta de grandeza e a moderada argúcia levaram-no ao erro de avaliação que pode selar agora sua despedida da política.
Serra apostou que o manejo do ódio ao petismo, do qual se tornou o maior
expoente com a derrocada dos Demos, seria abastecido just in time pela
artilharia do STF. A entrega de munição à campanha deste ano culminaria
numa apoteose, com a definição das penas em plena boca de urna do 2º
turno.
As togas fizeram e fazem a sua parte nessa guerra de politização da
justiça e vice versa. Mas o excesso caramelado pelo jogral enjoativo do
dispositivo midiático conservador torna qualquer enredo desinteressante;
em certa medida, suspeito.
A trama caricata chega ao seu epílogo - deliberadamente associado ao
desfecho das eleições - tropeçando em inconsistências que transpiram
mais engajamento do que credibilidade.
É desse paiol molhado que depende a munição dos últimos dias de campanha de Serra.
Por tudo isso, seu futuro político está entregue às togas, muito mais do
que o dos petistas que demoniza. Com uma desvantagem robusta nas
pesquisas, o recurso reiterativo deve adicionar pouco à insuficiência já
acumulada.
Não é inusitado na história que o algoz tenha o destino concebido às
suas vítimas; não raro, como alma penada de um ostracismo sem similar.
Serra preenche os requisitos para ser um desses vultos capturados pelas
suas próprias armadilhas.
Saul LeblonNo Blog das Frases
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