Freud e Marx, os mais censurados na não ficção
Tudo o que são clássicos e grandes obras da literatura mundial passaram
pelo crivo dos delegados de estudos do Opus Dei. Por isso é difícil
encontrar um grande escritor que não tenha sido 'censurado' pela obra.
Dos últimos 15 prémios Nobel da Literatura só um não tem livros
proibidos. Os restantes 14 têm 72 obras 'proibidas'. Na não ficção, que
inclui obras de grande importância científica, Marx, Freud ou Nietzsche
estão entre os que não escaparam ao 'lápis azul' da organização.
As aventuras de Leopold Bloom a fazer a sua odisseia por Dublim (em
Ulisses, de James Joyce), a chegada de Cândido a Lisboa após o terramoto
de 1755 (em Cândido, de Voltaire) ou as dúvidas existenciais de
Zuckerman (obras de Philip Roth) são histórias que os membros do Opus
Dei não podem desfrutar. Grandes nomes da literatura e das ciências
sociais mundiais fazem parte da lista de 33 573 livros proibidos pela
obra.
Olhando, por exemplo, para os últimos 15 prémios Nobel da Literatura,
apenas um (Le Clézio) escapou à lista negra de livros do Opus Dei. Só
nos três mais elevados níveis de proibição (ver infografia na página 31)
existem 72 obras. O peruano Mario Vargas Llosa (Nobel em 2010) conta
com 17 obras nestes níveis de proibição. É imediatamente seguido pelo
português José Saramago, com 12 títulos (ver páginas 30 e 31). Mas a
lista não para por aqui: Doris Lessing (nove livros), John Coetzee
(oito), Günter Grass (sete) e Elfriede Jelinek (quatro) são outros dos
mais castigados. Orhan Pamuk apenas foi brindado com um livro proibido e
os dois últimos nóbeis (Mo Yan e Tomas Tranströmer) têm livros
classificados com níveis de interdição mais baixos.
E a lista de grandes autores proibidos está longe de se esgotar nos
últimos laureados pelo maior prémio da literatura. O romance Ulisses, de
James Joyce - um marco do modernismo literário -, tem o mais elevado
nível de proibição (6; L-C3). O mesmo acontece com livros de autores
como Albert Camus, Gabriel García Márquez, Samuel Beckett, Jean-Paul
Sartre (também eles Nobéis), Voltaire, Aldous Huxley, Henry Miller,
Truman Capote, Philip Roth ou Vladimir Nabokov.
Também "censurados", mas com níveis de proibição mais baixos, surgem os
nomes de Ernest Hemingway, Orwell, Jorge Luis Borges, Dostoievski, Kafka
ou F. Scott Fitzgerald.
O líder do Opus Dei Portugal, José Rafael Espírito Santo, explica que
esta lista é "no fundo estar a procurar um conselho para defender a fé",
lembrando que "o Papa João Paulo II antes de ler um livro consultava e
perguntava se era um livro adequado". O vigário regional do Opus Dei
utiliza ainda uma metáfora para justificar a lista: "Há medicamentos que
só se vendem com receita médica. Porquê? Porque uma pessoa que não
saiba, em vez de fazer bem à saúde, pode fazer mal. A fé não se apoia na
razão. E, portanto, pode haver modos de empregar a razão que sejam
nocivos para o próprio ser humano porque a verdade é só uma."
Marx e Freud, os mais odiados
Em matéria de não-ficção, o psicanalista Sigmund Freud e o sociólogo
Karl Marx são os mais censurados pela obra. Sozinho, Karl Marx tem 19
livros no mais elevado nível de proibição das obras que não são
literatura (P-C3). O Capital ou o Manifesto do Partido Comunista fazem,
naturalmente, parte deste lote. O sociólogo só é mesmo batido por
Sigmund Freud, o autor mais proibido, com 21 obras, que inclui títulos
como A Interpretação dos Sonhos ou os Três Ensaios sobre a Teoria da
Sexualidade.
Os filósofos Nietzsche (dez livros), Thomas Hobbes (três), Émile
Durkheim (cinco), Karl Popper e Francis Bacon (ambos com um livro)
também não escaparam aos delegados de estudos do Opus Dei.
Há ainda realizadores de cinema que são censurados, não pelos seus
filmes (embora também haja uma lista - ver topo da página), mas pelos
livros que escreveram. É o caso de Woody Allen, Pasolini, Buñuel ou
Almodóvar. Políticos como Lenine, Trotsky, Fidel Castro, Salvador
Allende (particular- mente odiado pelo Opus Dei, que ajudou ao seu
derrube no Chile) e Hillary Clinton também têm livros na lista.
Rui Pedro AntunesNo Diário de Notícias
Veja também: Os segredos do Opus Dei - Grande Investigação - I - II - III - IV
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