E lá vai o Estadão ladeira abaixo...
Travestido de "novo projeto gráfico", o jornalão anunciou na sexta-feira o maior passaralho* dos últimos anos. Ninguém sabe ao certo, mas dizem que cerca de 40 jornalistas foram demitidos.
Na redação, segundo informaram colegas, o clima era de velório.
"Nunca tinha visto algo assim em todo esse tempo em que estou aqui", contou uma das sobreviventes da chacina.
"Me lembrou a Gazeta Mercantil", resumiu, lembrando outro massacre histórico sofrido pela categoria.
A rádio peão informa que o jornal teve de fazer um empréstimo bancário para pagar o salário do mês.
Dizem ainda que, nos últimos dois anos, a circulação caiu 30% e a publicidade segue igual caminho.
Na notícia em que explica as mudanças, o diretor-presidente do grupo
Estado, Francisco Mesquita Neto, dá uma informação preciosa:
"Nossas pesquisas confirmaram o que já vínhamos detectando: as pessoas
querem mais eficiência no consumo da informação, sem abrir mão do
aprofundamento e da análise."
Em outras palavras: as pesquisas mostraram que nem o leitor do Estadão conseguia mais ler o Estadão.
Noutro trecho da nota, Mesquita Neto indica qual será o futuro do jornalão:
"Estamos evoluindo com nosso portfólio de produtos e processos em direção a um mundo mais veloz, mais digital."
Ou seja: o Estadão demorou uns 20 anos para descobrir a internet!
O novo Estadão praticamente acabou com os cadernos, recuando para um
modelo gráfico que havia abandonado no fim da década de 80, quando criou
o Caderno de Economia.
A "cadernização", diziam na época, era mais confortável para o leitor,
pois permitia, por exemplo, que numa família assinante do jornal, cada
um escolhesse a sua seção preferida para ler sem incomodar os outros.
Hoje, o mesmo argumento é usado para juntar todas as editorias num mesmo caderno.
O jornal deixará também de fazer o chamado "2º clichê", rodada que vai
para os locais mais próximos, com as notícias mais quentes.
Assim, sinaliza que não poupará a gráfica dos cortes.
No ano passado, o passaralho visitou o prédio do bairro do Limão pelo menos três vezes, abocanhando dezenas de jornalistas.
Por enquanto, não há notícias sobre a visita da sangrenta ave à concorrente Folha de S. Paulo.
Mas nenhum jornalista tem esperanças de que ela poupará os ocupantes do edifício da Barão de Limeira.
É só uma questão de tempo: o tempo necessário para que os frios números
dos relatórios dos tecnocratas mostrem que um jornal que é feito por
100 jornalistas pode muito bem ser feito por 50.
Principalmente com a qualidade desses que existem por aí.
*Demissões, na gíria jornalística
No Crônicas do Motta
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