quarta-feira, 14 de março de 2012

A cibercensura da Santa Inquisição e a liberdade de blogar


O Dia Mundial Contra a Cibercensurafoi celebrado, nesta segunda (12), com o objetivo de engajar por uma internet sem restrições e acessivel a todos. Em um momento em que manifestações sociais usam a rede mundial de computadores como plataforma, a luta por liberdade de expressão online é essencial.
Vira e mexe alguém pede a minha humilde e reles cabeçorra em público por conta do que escrevo. Ou acusa ela de algo subversivo. Sim, sou o mal encarnado na forma de um japonês de cabelo encaracolado e sorriso simpático.
Já tive o prazer de ser alvejado da tribuna do Senado por Kátia Abreu (PSD-TO), senadora e presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária – quando defendi as equipes de fiscalização que combatem o trabalho escravo. Ou de ser criticado pelo então deputado Aldo Rebelo (PC do B-SP), que me chamou de “vaca holandesa” (hehehe – ninguém pode dizer que ele não tem senso de humor), devido às minhas críticas às mudanças no Código Florestal. Isso não limita a lista de ilustres. Particularmente, acho tudo isso instrutivo e não me incomodo. Afinal de contas estamos em uma democracia e o debate público, se não leva ao Nirvana, pelo menos ajuda a avançarmos na efetivação da cidadania por dar transparência às relações sociais e trazer informação ao público. Ou não.
De tempos em tempos, representantes de diferentes denominações cristãs também escrevem algo contra o meu blog. Dessa vez, foi na página de Luiz Bergonzini, bispo emérito de Guarulhos, e colega jornalista. Eles postou o texto que está no final deste post há alguns dias, fato que só chegou ao meu conhecimento hoje. Aliás, me coloco à disposição para um debate no Tuca sobre direitos humanos e religião se ele topar.
Desde que comecei a lecionar Jornalismo na PUC-SP, a frequência das reclamações têm aumentado. Há pessoas que acham um absurdo uma universidade católica ter, entre seus quadros, um professor que defende o direito ao aborto e à eutanásia, o Estado laico, a adoção de crianças por pessoas do mesmo sexo, o Palmeiras, enfim, o direito a ter direito.
A PUC e sua direção, pelo menos no que diz respeito ao uso que faço da minha liberdade de expressão, têm adotado um comportamento que se espera de uma universidade, garantindo o debate, o livre pensamento e a pluralidade de opiniões. Ou seja, não recebi até agora nenhum pedido para que não exponha posições ou divulgue informações, mesmo que em desacordo com o que prega a fé católica. Desde que a discussão que proponho fique no âmbito dos argumentos e não desqualifique o argumentador, não creio que tenha que temer qualquer censura. Não acredito que uma instituição, que foi resistência contra a ditadura, mude de posição.
Fico imaginando que certos sacerdotes não leram o Novo Testamento, ficando apenas com o resumo executivo. Estudei muito tempo em escola religiosa, noves fora o bico de coroinha na paróquia São Judas Tadeu, e posso dizer que conheço um pouco as escrituras cristãs. Por isso, creio que, ao pedir o silêncio, eles continuam não captando nadica de nada da idéia que está na origem de sua própria religião, da mesma forma que aqueles que vieram antes deles na Contra-reforma.
Sugiro, humildemente, que procurem a turma da Teologia da Libertação para entender que o espírito (seja isso o que for) não estará livre se o corpo também não estiver. Na prática, esses religiosos católicos realizam a fé que muitos temem ver concretizada ou não conseguem colocar em prática. Pessoas como Pedro Casaldáliga, Tomás Balduíno, Henri des Roziers e Xavier Plassat, que estão junto ao povo, no Brasil profundo, defendendo o direito à terra e à liberdade, combatendo o trabalho escravo e acolhendo camponeses, quilombolas, indígenas e demais excluídos da sociedade.
Como aqui já disse, imaginem se Casaldáliga fosse papa e, como primeiro discurso na Praça São Pedro, retomasse palavras que proferiu há tempos: “Malditas sejam todas as cercas! Malditas todas as propriedades privadas que nos privam de viver e amar! Malditas sejam todas as leis amanhadas por umas poucas mãos para ampararem cercas e bois, fazerem a terra escrava e escravos os humanos.”
Não creio. Mas se isso ocorresse, passaria a crer.
Segue, abaixo, o texto publicado no site do bispo.
Em tempo: Este blog foi indicado para o prêmio de cidadania digital da organização Repórteres Sem Fronteiras, concorrendo com outras experiências da China, Rússia, Vietnã, Síria, Egito – fato que deixou seu autor muito orgulhoso. Ele é dado a pessoas e grupos que ajudaram a promover a liberdade de expressão na internet.
Mesmo com muita gente rezando contra.
Graças a Deus, a PUC não é uma “progressista universidade comunista”!
Tempos atrás, a PUC quase foi palco de um movimento em favor da liberação da maconha. A reitoria foi obrigada a fechar o campus para impedir tão abjeto evento. Outro dia escrevemos o post sobre o professor da PUC, o jornalista Leonardo Sakamoto, que propaga a liberação do aborto. Depois disso, ele escreveu outro texto, defendendo a liberação da eutanásia.
Em razão daquele texto, um leitor que se diz aluno de uma PUC, nos escreveu dizendo que, dependendo do professor que está na sala de aula, a universidade parece uma “progressista universidade comunista”. Como dissemos naquele post, PUC significa Pontífícia Universidade Católica, que provém do Pontífice e a ele está subordinada, regida pela Constituição Apóstólica Ex Corde Ecclesiae.
Nesta semana, recebemos a notícia de um evento realizado na PUC-SP, provavelmente convocado pelo grão-chanceler, Cardeal Dom Odilo Scherer e pelo reitor Dirceu de Melo. Foram convidados para o evento todos os Bispos e todo o clero da Arquidiocese de São Paulo.
O reitor, Dirceu de Melo, e o grão-chanceler, Cardeal Dom Odilo Scherer, reuniram a diretoria, os bispos, párocos, vigários paroquiais, diáconos transitórios e permanentes da Arquidiocese de São Paulo,para declarar que “A PUC-SP é da Igreja Católica.” (matéria no final)
Se a PUC é da Igreja Católica, deve seguir o Evangelho e a Moral Cristã. Não pode ter em seu corpo docente professores contrariando os ensinamentos da Igreja Católica, dentro ou fora da sala de aula.
É um direito de cada pessoa ter e defender as idéias que quiser. Porém, as escolas e universidades católicas não são obrigadas a admitir empregados com posições contrárias aos seus ensinamentos.
Qualquer empregado, ao ser admitido, assina um contrato se comprometendo a trabalhar pelos objetivos da empresa e dentro dos princípios dela: “1. uma inspiração cristã não só dos indivíduos, mas também da Comunidade universitária enquanto tal; 2. uma reflexão incessante, à luz da fé católica, sobre o tesouro crescente do conhecimento humano, ao qual procura dar um contributo mediante as próprias investigações; 3. a fidelidade à mensagem cristã tal como é apresentada pela Igreja; 4. o empenho institucional ao serviço do povo de Deus e da família humana no seu itinerário rumo àquele objectivo transcendente que dá significado à vida. [17] ” (Ex Corde Ecclesiae) Os objetivos da Pontifícia Universidade Católica são de formar profissionais competentes, mas observando a Doutrina Cristã, em absoluta sintonia com o Papa Bento XV.
Os professores abortistas, defensores da eutanásia, da liberação da maconha, da ideologia homossexual ou comunistas podem procurar escolas que defendam essas ideias, por exemplo UnB, para lecionar nelas. Não podem lecionar numa escola católica, que é totalmente contrária a esses posicionamentos.
No caso dos alunos, em qualquer escola, no ato da matrícula, eles assinam um compromisso de obediência ao regulamento interno da escola, inclusive com seus princípios. Os alunos que prestam vestibular para a PUC já sabem que ela obedece os princípios do catolicismo. No ato da matrícula, eles assinam o compromisso de obedecer o regimento interno. A partir daí, eles estão obrigados a cumprir as regras da PUC. Eles não estão obrigados a cursar a PUC. Há inúmeras faculdades por aí. Se forem adeptos do aborto, da eutanásia, da ideologia homossexual, da liberação das drogas, do comunismo, podem procurar faculdades com essas ideias para estudar.
As afirmações do reitor, Dirceu de Melo, e do grão-chanceler, Cardeal Dom Odilo Scherer, que a PUC é da Igreja Católica, na presença de todo clero da Arquidiocese, tem um simbolismo importante.
POR COERÊNCIA, é preciso que, aqueles que têm autoridade, tomem as providências necessárias para que os princípios cristãos e o catolicismo sejam respeitados pelos professores e alunos.
Graças a Deus, a PUC não é uma “progressista universidade comunista.” Graças a Deus, a PUC é uma universidade da Igreja Católica!
~ o ~
“Seria salutar que o bispo debatesse comigo em público”, diz Sakamoto sobre religioso
D. Luiz Gonzaga Bergonzin, bispo emérito de Guarulhos, conhecido por seu estilo conservador, disse em seu blog que docentes da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP) favoráveis à descriminalização de aborto, eutanásia, maconha ou que mantenham ideologia homossexual ou comunista deveriam procurar outra instituição.
Bergonzini e Sakamoto
Bergonzini citou em seu blog o jornalista e professor Leonardo Sakamoto afirmando que ele propaga a liberação do aborto. Em sua página, Sakamoto convidou o bispo para um debate sobre o assunto e afirmou que a PUC sempre respeitou suas posições e sua liberdade de expressão.
À IMPRENSA, Sakamoto fala sobre a polêmica e reforça o convite ao bispo para que ele venha discutir seus argumentos publicamente.
IMPRENSA – O que você diz sobre as declarações do bispo?
Leonardo Sakamoto - Acho que ele tem direito de comentar tudo o que quiser, reclamar, me xingar porque estamos em uma democracia. Mas espero que ele continue debatendo e que debata publicamente. Eu o convidei para que venha debater publicamente, porque essa questão está relacionada a direitos individuais.
Por que ele citou somente seu nome?
Eu estranho o fato de ele ter “pedido minha cabeça”. Acho que o argumento tem que ser comentado e debatido e não o argumentador combatido. Eu acredito que quando você tem fé no que defende deve colocar aquilo à prova e sustentar. Por isso, repito: 'vamos debater'.
A PUC cerceia algum tipo de opinião sua?
A PUC nunca cerceou minha liberdade e acredito que meus alunos vão concordar. Eu não fico dando aula para fazer proselitismo. Simplesmente levo o debate dos direitos humanos para a sala. Mas acredito que não haverá problemas, até porque a PUC teve uma posição democrática, o mínimo esperado de uma universidade. Reitero que o bispo poderia debater em público. Seria extremamente salutar essa discussão.

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