A mídia vai expor publicamente suas mazelas?
Se 2011 foi o ano em que se expuseram as vísceras do corporativismo no Judiciário, 2012 pode ser o ano da imprensa.
Liminares que obstruíram apurações, limitação das competências do CNJ,
verbas recebidas de forma irregular por desembargadores. Poucos assuntos
renderam tanto nas manchetes dos jornais e revistas como os desvios da
Justiça no ano que passou.
2012 começou, no entanto, com a destruição de um dos mitos mais
cultuados pela própria imprensa em defesa da moralidade, o senador
Demóstenes Torres. Demóstenes foi flagrado em um sem-número de conversas
telefônicas prestando serviços e recebendo presentes de um expoente da
contravenção.
Mas as conversas gravadas, além de insinuar conluio de políticos e
empresários, o que infelizmente não é nenhuma novidade, dessa vez também
descortinaram uma outra particularidade: a aproximação do crime
organizado com jornalistas para influir e auxiliar na produção de
reportagens contra políticos, autoridades e seus concorrentes em geral.
A profusão de indícios das malversações de Carlinhos Cachoeira já
provocou a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito, que
parece ser desejada e ao mesmo tempo temida por governo e oposição.
Mas a pergunta principal é saber como a grande imprensa vai se portar em relação à exposição de suas próprias mazelas.
Em questão, a dimensão ética do que se acostumou a chamar de jornalismo
investigativo e os percalços que envolvem os interesses que geraram
algumas destas “reportagens-bombas”.
Pelo que já se divulgou, um jornalista teria sido, inclusive, um dos
interlocutores mais frequentes do Poderoso Chefão goiano. E várias
conversas entre Cachoeira e seus assessores versavam justamente sobre
elaboração de matérias que alavancavam seus interesses, ao prejudicar
desafetos.
O assunto já é um dos trending topics das redes sociais, mas praticamente não é tratado pela grande mídia.
O momento é precoce para qualquer julgamento.
Conversas telefônicas, fruto de interceptações judicialmente
autorizadas, jamais deveriam se tornar públicas, pois estão sempre
abrangidas pelo sigilo de justiça.
O propalado “interesse público” faz tempo tem servido de álibi para a
imprensa, que estimula o vazamento por servidores que permanecerão
ocultos em razão da garantia de sigilo da fonte.
Mas e quando estas conversas que não deveríamos estar ouvindo trouxerem
revelações sobre o modus operandi de alguns órgãos da imprensa?
Serão eles mesmos os juízes da divulgação de seus erros? Estarão aptos
para o ritual de cortar na própria carne ou esse “interesse público”
também servirá de justificativa para todo e qualquer desvio de conduta?
Que Elianas Calmons da imprensa se apresentarão para impedir que o
corporativismo oculte os interesses privados que existem por detrás de
grandes denúncias ou a forma ilícita com que foram obtidas?
Poucos atributos são tão indispensáveis à democracia quanto a liberdade de expressão.
Mas o recente episódio dos jornais de Rudolph Murdoch na Inglaterra
mostrou que sem limites éticos, o vale-tudo da imprensa para obter
informações ou destruir reputações, pode ser tão violador quanto os
direitos que se propõe a defender.
Marcelo SemerNo Sem Juízo
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