BRASÍLIA - Uma inusitada parceria entre o lobby da Confederação Nacional
da Indústria (CNI) e parlamentares católicos e evangélicos impediu
nesta quarta-feira a aprovação de projeto que cria a Contribuição Social
das Grandes Fortunas (CSGF), recurso que seria destinado exclusivamente
para a saúde. Essa união de forças se deu na Comissão de Seguridade
Social e Família da Câmara. O autor do pedido de verificação de quórum
na comissão, uma manobra para impedir
aprovação de projetos, foi do deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS),
médico que se apresenta como defensor da saúde. Desde o início da sessão, assessores da CNI e de deputados evangélicos negociaram boicotar a reunião.
O interesse dos religiosos era evitar, mais uma vez, um projeto que
tramita há anos no Congresso e que cria direitos previdenciários para
dependentes de homossexuais. Este nem chegou a ser apreciado. E o da
bancada da CNI era impedir a votação do projeto que taxa as grandes
fortunas. E conseguiram. Parlamentares desses dois grupos esvaziaram a
sessão. O projeto que taxa as grandes fortunas tem como autor o deputado
Doutor Aluizio Júnior (PV-RJ). Pela proposta, são criadas nove faixas
de contribuição a partir de acúmulo de patrimônio de R$ 4 milhões e a
última faixa é de acima de R$ 115 milhões. O projeto atinge 38 mil
brasileiros, com patrimônios que variam nessas faixas.
- São R$ 14 bilhões a mais para a saúde por ano. Desse total, R$ 10
bilhões viriam de 600 pessoas, mais afortunadas do país. Vamos insistir
com o projeto - disse Aluizio Júnior.
A relatora do projeto foi a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), que deu
parecer favorável. O projeto das grandes fortunas chegou a ser votado e
14 parlamentares votaram sim e três, não. Foi nesse momento que Perondi
pediu a verificação de quórum e eram precisos 19 votantes ao todo. E
tinham 17. Faltaram apenas dois para a matéria ser considerada aprovada.
Quando começou a votação, parlamentares do PSDB e do DEMo deixaram o plenário.
O deputado Doutor Paulo César (PSD-RJ) fez um parecer contrário ao de
Jandira e argumentou que taxar grandes fortunas iria espantar os
investimentos e empresários levariam dinheiro para fora do país. Mas a
derrota, no final, pode ser atribuída a dois parlamentares evangélicos.
Um deles, Pastor Eurico (PSB-PE) chegou a fazer um discurso a favor da
taxação das grandes fortunas e afirmou até que a Câmara está cheio de
lobbies de interesses. Chegou a ser aplaudido, mas, na hora de votar,
atendeu ao apelo da parceria CNI-religiosos, e deixou o plenário. Nem
sequer votou. Outro deputado, Marco Feliciano (PSC-SP), defensor dos
interesses religiosos deixou o plenário quando se inicia a votação.
O advogado Paulo Fernando Melo, um assessor das bancadas religiosas e que atuou na parceria com a CNI, comemorou o resultado.
- Tinham duas matérias polêmicas na pauta (pensão para gays e taxação de
grandes fortunas). No final, a articulação desses dois setores, que é
regimental, deu certo e os dois lados saíram vitoriosos - disse Paulo
Fernando.
No O Globo
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