Planalto parte para o enfrentamento
Governo decide manter queda de braço com ruralistas e não vai negociar a votação do Código Florestal, pano de fundo para a rebelião da base aliada. Dilma está disposta a encarar ações judiciais em caso de veto ao projeto aprovado pelo Congresso
A presidente Dilma Rousseff bateu o pé e não pretende apresentar mudanças no texto do Código Florestal que foi aprovado no Senado e se transformou no principal embate com os ruralistas e a base aliada na Câmara.
Depois de uma semana difícil na relação com o Congresso, com os deputados governistas travando a pauta de votações da Casa, Dilma deu mais um sinal de que pretende esticar a corda ao máximo. Ela reuniu ontem, por mais de uma hora, todos os atores envolvidos no debate do Código Florestal no Congresso e examinou ponto a ponto o texto que está em debate no parlamento.
Como a presidente viaja no domingo para a Índia e só retorna ao país na sexta, a tendência é de que a matéria não seja colocada em pauta ao longo da próxima semana — mais uma demonstração do desejo da presidente de não arredar pé da queda de braço com os dissidentes. Alguns aliados acham que, se o Congresso ficar duas semanas completamente parado — daqui a 15 dias será véspera da Páscoa —, a crise terá se instalado de vez. No Planalto, conforme adiantou o Correio, a crise é encarada como um “estresse” e vem sendo vista sob uma perspectiva bem mais branda.
Da reunião no Palácio do Planalto, participaram a ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti; a chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann; a ministra do Meio Ambiente, Izabela Teixeira; do Desenvolvimento Agrário, Pepe Vargas; da Agricultura, Mendes Ribeiro; o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams; o líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP); além de assessores jurídicos de todas as pastas envolvidas na discussão.
No governo, a avaliação é de que o grande embate deste momento é o código e que os deputados insurgentes estão utilizando a Lei Geral da Copa como um pretexto para colocar a faca no pescoço do Planalto. Ao convocar assessores jurídicos para a reunião, Dilma explicitou também a disposição de enfrentar quaisquer questionamentos legais posteriores à aprovação do Código.
Nem mesmo a proximidade do fim do prazo do decreto que altera as regras de desmatamento e as punições aos desmatadores deve servir para levar à votação. O decreto expira em 11 de abril. “Não tem importância, edita-se um novo decreto”, resumiu com tranquilidade um assessor da presidente.
Para deputados da base governista, o esforço da presidente Dilma em costurar um consenso entre ruralistas e ambientalistas no texto do Código Florestal não será suficiente para destravar a pauta da Câmara se não houver empenho equivalente em pacificar os ânimos dentro de partidos da base aliada — a começar pelo PT. A legenda, que já apresentava divisões internas aprofundadas pelo ano eleitoral, viu a rachadura em sua bancada parlamentar se aprofundar com a queda do ex-líder do governo na Câmara Cândido Vaccarezza (PT-SP), substituído no cargo por Arlindo Chinaglia (PT-SP).
O ex-líder pertence à corrente Novos Rumos. Chinaglia é do Movimento PT, corrente de menor porte, em ascensão na Câmara. “O grupo do Vaccarezza está indócil e vai querer dar o troco, sem sombra de dúvida”, diz um petista. “Essa é uma ferida que vai demorar a sarar”, completou. A primeira coisa que a Dilma tem que fazer é arrumar sua própria casa, seu partido, para tentar acalmar a crise entre os aliados. Além do PT, o Planalto precisará apagar os focos de incêndio disseminados em outros partidos aliados, a começar pelo PMDB, o primeiro “rebelado”, e passando pelos independentes.
Precedentes
Aliados da presidente lembram que a ausência de matérias que necessitem de quórum qualificado não significa que o governo pode se dar ao luxo de assistir à crise sem tomar providências. Um exemplo aconteceu em 1999, durante o segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso. O presidente tucano desvalorizou o Real logo após assumir como primeiro presidente reeleito da história do país. Foi bombardeado pelo Congresso Nacional e pela própria base de sustentação, que acusou o presidente de ter mantido a paridade do câmbio por uma estratégia meramente eleitoral.
No mesmo ano, foram protocoladas duas CPIs no Senado. Sem ascendência sobre o parlamento, FHC viu a disputa fratricida entre os então senadores Jader Barbalho (PMDB-PA) e Antonio Carlos Magalhães (DEM-BA) custar a renúncia a ambos. À crise política se sucedeu o apagão e o governo tucano encerrou de forma melancólica. “Uma confusão desse tamanho não derruba a presidente, mas pode amarrar o governo de tal forma que ela poderá passar o resto do mandato administrando o varejo”, alertou um aliado.
Pressão pelo acordo
Considerado o tucano mais próximo da presidente Dilma Rousseff, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso espera que o governo e a bancada ruralista se entendam para que o Código Florestal possa ser aprovado o mais rapidamente possível. “Eu espero bom senso. A agricultura precisa se desenvolver, afinal, o país está crescendo. Mas é importante manter um crescimento sustentável. Não há mais como pensar em crescimento sem pensar em meio ambiente, essa discussão já é superada”, disse. Ele aproveitou para fazer propaganda de sua gestão. “Aumentamos as áreas de preservação na Amazônia e reduzimos de 20 mil km² para 6 mil km² a devastação. Ainda é muito, e isso precisa ser trabalhado”, afirmou.
Três nós da nova lei ambiental
Confira os principais pontos de discórdia entre o governo federal e a bancada ruralista na Câmara
Emenda 164
» A bancada ruralista quer retomar o dispositivo que libera totalmente plantações e pastos abertos em APPs até 2008. A medida é considerada pelos ambientalistas como uma anistia ao desmatamento. O governo é contra e quer liberar apenas atividades de utilidade pública, interesse social ou baixo impacto ambiental.
Recomposição ambiental
» O governo quer retirar do código a obrigatoriedade de recomposição ambiental de 20m² para cada habitante, nas chamadas zonas de expansão urbana. Os ambientalistas resistem.
Recuperação de reservas
» Ruralistas querem de volta o texto da Câmara para recomposição de Áreas de Preservação Permanente (APPs) nas margens dos rios. O texto estabelece um limite mínimo para a recomposição, de 15 metros, e deixa faixas de recomposição maiores a critério da União e dos estados. Governo e ambientalistas concordam com a versão aprovada no Senado, com metragens de recomposição variáveis segundo a extensão do rio.
Governo decide manter queda de braço com ruralistas e não vai negociar a votação do Código Florestal, pano de fundo para a rebelião da base aliada. Dilma está disposta a encarar ações judiciais em caso de veto ao projeto aprovado pelo Congresso
» PAULO DE TARSO LYRA
» KARLA CORREIA
» KARLA CORREIA
Dilma reuniu ministros das áreas relacionadas ao Código Florestal para examinar ponto a ponto da proposta |
A presidente Dilma Rousseff bateu o pé e não pretende apresentar mudanças no texto do Código Florestal que foi aprovado no Senado e se transformou no principal embate com os ruralistas e a base aliada na Câmara.
Depois de uma semana difícil na relação com o Congresso, com os deputados governistas travando a pauta de votações da Casa, Dilma deu mais um sinal de que pretende esticar a corda ao máximo. Ela reuniu ontem, por mais de uma hora, todos os atores envolvidos no debate do Código Florestal no Congresso e examinou ponto a ponto o texto que está em debate no parlamento.
Como a presidente viaja no domingo para a Índia e só retorna ao país na sexta, a tendência é de que a matéria não seja colocada em pauta ao longo da próxima semana — mais uma demonstração do desejo da presidente de não arredar pé da queda de braço com os dissidentes. Alguns aliados acham que, se o Congresso ficar duas semanas completamente parado — daqui a 15 dias será véspera da Páscoa —, a crise terá se instalado de vez. No Planalto, conforme adiantou o Correio, a crise é encarada como um “estresse” e vem sendo vista sob uma perspectiva bem mais branda.
Da reunião no Palácio do Planalto, participaram a ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti; a chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann; a ministra do Meio Ambiente, Izabela Teixeira; do Desenvolvimento Agrário, Pepe Vargas; da Agricultura, Mendes Ribeiro; o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams; o líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP); além de assessores jurídicos de todas as pastas envolvidas na discussão.
No governo, a avaliação é de que o grande embate deste momento é o código e que os deputados insurgentes estão utilizando a Lei Geral da Copa como um pretexto para colocar a faca no pescoço do Planalto. Ao convocar assessores jurídicos para a reunião, Dilma explicitou também a disposição de enfrentar quaisquer questionamentos legais posteriores à aprovação do Código.
Nem mesmo a proximidade do fim do prazo do decreto que altera as regras de desmatamento e as punições aos desmatadores deve servir para levar à votação. O decreto expira em 11 de abril. “Não tem importância, edita-se um novo decreto”, resumiu com tranquilidade um assessor da presidente.
Para deputados da base governista, o esforço da presidente Dilma em costurar um consenso entre ruralistas e ambientalistas no texto do Código Florestal não será suficiente para destravar a pauta da Câmara se não houver empenho equivalente em pacificar os ânimos dentro de partidos da base aliada — a começar pelo PT. A legenda, que já apresentava divisões internas aprofundadas pelo ano eleitoral, viu a rachadura em sua bancada parlamentar se aprofundar com a queda do ex-líder do governo na Câmara Cândido Vaccarezza (PT-SP), substituído no cargo por Arlindo Chinaglia (PT-SP).
O ex-líder pertence à corrente Novos Rumos. Chinaglia é do Movimento PT, corrente de menor porte, em ascensão na Câmara. “O grupo do Vaccarezza está indócil e vai querer dar o troco, sem sombra de dúvida”, diz um petista. “Essa é uma ferida que vai demorar a sarar”, completou. A primeira coisa que a Dilma tem que fazer é arrumar sua própria casa, seu partido, para tentar acalmar a crise entre os aliados. Além do PT, o Planalto precisará apagar os focos de incêndio disseminados em outros partidos aliados, a começar pelo PMDB, o primeiro “rebelado”, e passando pelos independentes.
Precedentes
Aliados da presidente lembram que a ausência de matérias que necessitem de quórum qualificado não significa que o governo pode se dar ao luxo de assistir à crise sem tomar providências. Um exemplo aconteceu em 1999, durante o segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso. O presidente tucano desvalorizou o Real logo após assumir como primeiro presidente reeleito da história do país. Foi bombardeado pelo Congresso Nacional e pela própria base de sustentação, que acusou o presidente de ter mantido a paridade do câmbio por uma estratégia meramente eleitoral.
No mesmo ano, foram protocoladas duas CPIs no Senado. Sem ascendência sobre o parlamento, FHC viu a disputa fratricida entre os então senadores Jader Barbalho (PMDB-PA) e Antonio Carlos Magalhães (DEM-BA) custar a renúncia a ambos. À crise política se sucedeu o apagão e o governo tucano encerrou de forma melancólica. “Uma confusão desse tamanho não derruba a presidente, mas pode amarrar o governo de tal forma que ela poderá passar o resto do mandato administrando o varejo”, alertou um aliado.
Pressão pelo acordo
Considerado o tucano mais próximo da presidente Dilma Rousseff, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso espera que o governo e a bancada ruralista se entendam para que o Código Florestal possa ser aprovado o mais rapidamente possível. “Eu espero bom senso. A agricultura precisa se desenvolver, afinal, o país está crescendo. Mas é importante manter um crescimento sustentável. Não há mais como pensar em crescimento sem pensar em meio ambiente, essa discussão já é superada”, disse. Ele aproveitou para fazer propaganda de sua gestão. “Aumentamos as áreas de preservação na Amazônia e reduzimos de 20 mil km² para 6 mil km² a devastação. Ainda é muito, e isso precisa ser trabalhado”, afirmou.
Três nós da nova lei ambiental
Confira os principais pontos de discórdia entre o governo federal e a bancada ruralista na Câmara
Emenda 164
» A bancada ruralista quer retomar o dispositivo que libera totalmente plantações e pastos abertos em APPs até 2008. A medida é considerada pelos ambientalistas como uma anistia ao desmatamento. O governo é contra e quer liberar apenas atividades de utilidade pública, interesse social ou baixo impacto ambiental.
Recomposição ambiental
» O governo quer retirar do código a obrigatoriedade de recomposição ambiental de 20m² para cada habitante, nas chamadas zonas de expansão urbana. Os ambientalistas resistem.
Recuperação de reservas
» Ruralistas querem de volta o texto da Câmara para recomposição de Áreas de Preservação Permanente (APPs) nas margens dos rios. O texto estabelece um limite mínimo para a recomposição, de 15 metros, e deixa faixas de recomposição maiores a critério da União e dos estados. Governo e ambientalistas concordam com a versão aprovada no Senado, com metragens de recomposição variáveis segundo a extensão do rio.
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