Ao opinar fora dos autos, ministros desrespeitam direito do cidadão
JOAQUIM FALCÃO
ESPECIAL PARA A FOLHA
JOAQUIM FALCÃO é professor de direito constitucional da FGV Direito-Rio.
JOAQUIM FALCÃO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Alguns ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) têm comentado, em público e nos bastidores, o julgamento do mensalão.
Mas a Lei Orgânica da Magistratura determina: "É vedado ao magistrado
manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo
pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre
despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais".
Programa de televisão não é exercício de magistério. Microfone de rádio
não é obra técnica. Jornais não são autos. Nem juiz é comentarista de si
mesmo. Esta lei abrange todos os magistrados. Ministro do Supremo é
magistrado.
É difícil identificar o início do hábito de falar fora dos autos. Mas
2002 é ano seminal. Após a morte da cantora Cássia Eller, seu pai e sua
companheira disputaram a guarda de seu filho.
O caso vai à Justiça em 8 de janeiro. Dois dias antes, o ministro Marco
Aurélio Mello, então presidente do STF, vai ao "Jornal do Brasil" e diz:
"A guarda do menino teria que ficar com o avô".
O presidente do Supremo opinava sobre questão judicializável na primeira
instância do Rio. Estimulou, com certeza involuntariamente, uma minoria
a ir à mídia fora dos autos.
A cultura do opinar judicial sem que advogados sistematicamente
protestem se propaga com a ajuda do princípio da vitaliciedade, isto é,
os magistrados o são para toda a vida. Inexiste controle externo.
O silêncio que a lei requer dos magistrados é direito dos cidadãos.
Decorre do direito a um juiz independente e imparcial. Ao opinar fora
dos autos, o juiz parece ignorar esse direito.
Alguns abrem exceção a este princípio apenas para o presidente do
Supremo e apenas em matéria de política judicial administrativa. Ninguém
nega a imensa contribuição, entre teimosias e incoerências, o brilho
intelectual do ministro Marco Aurélio ao Judiciário.
Mas, na véspera do mensalão, o ministro se pronunciou na mídia sobre eventual suspeição ou impedimento do colega Dias Toffoli.
Com todo o respeito, não contribuiu. Acirrou ânimos internos. Sem
pretender, ajudou a perturbar a crença democrática na imparcialidade do
Supremo.
JOAQUIM FALCÃO é professor de direito constitucional da FGV Direito-Rio.
Leia mais em: O Esquerdopata
Under Creative Commons License: Attribution
Do Blog O Esquerdopata.
Nenhum comentário:
Postar um comentário