O filme “Blue Jasmine”, de Woody Allen, é ao mesmo tempo uma consagração
e uma demolição. A consagração é da atriz Cate Blanchett, que nos dá,
sem exagero, uma das grandes interpretações da história do cinema.
Demolição é o que sofre a sua personagem no filme.
Há alguns exemplos de diretores que fizeram filmes especificamente para
suas atrizes brilharem, como acontece com “Blue Jasmine”. O exemplo
mais recente é do próprio Woody Allen, que fez “Annie Hall” para Diane
Keaton dar seu show — e, pelo que se diz, para levá-la pra cama.
Desta vez o presente é para Blanchett. Que, por justiça, deve dedicar o
Oscar que fatalmente ganhará no ano que vem a Allen. Já Jasmine, a
trágica personagem que ela interpreta, teria todo o direito de
processar o autor do filme por crueldade mental.
Woody Allen costuma homenagear diretores que admira em seus filmes. Já
brincou de Ingmar Bergman várias vezes, já fez sua versão do “Oito e
meio” de Fellini, e em “Blue Jasmine” evoca “Um bonde chamado desejo”,
que Elia Kazan fez de uma peça de Tennessee Williams.
Como a Blanche Dubois interpretada por Vivien Leigh naquele filme,
Jasmine é uma vítima dos homens e das suas próprias fantasias. No filme
de Kazan, a insensibilidade masculina que destrói a frágil Blanche é a
de um Marlon Brando brutal e suarento. Em “Jasmine”, o homem é um
sofisticado Alec Baldwin, do mundo das altas falcatruas financeiras. A
destruição é a mesma.
Allen faz tantos filmes seguidos que conversas sobre sua obra poderiam
sempre começar com a pergunta “Viste o deste ano?” Acho que não há outro
cineasta vivo ou morto com uma produção tão grande — fora, claro,
aqueles diretores do cinema primitivo que faziam um filme por semana.
Sua obra inclui algumas bobagens (aquele sobre Barcelona ele deve estar
querendo esquecer), mas a média é extraordinária. E “Blue Jasmine” é um
dos melhores.
Luis Fernando Veríssimo
Nenhum comentário:
Postar um comentário