Não têm limites as táticas sujas da mídia dominante quando o assunto é
regulação da mídia, quer dizer, quando a ideia é a manutenção de seu
poder oligopólico/monopólico. O artifício mais comum é a distorção de
conceitos, como “liberdade de imprensa”, “liberdade de expressão”,
“mídia independente” e “censura”, mas também a omissão de informações e
debates são formas recorrentes através das quais os conglomerados
midiáticos procuram manter sua hegemonia em detrimento da democracia na
comunicação.
Nesta
quinta-feira, o jornalista Ricardo Noblat, em seu blog, rasgou seus
livros sobre a prática jornalística e simplesmente suprimiu os dois
últimos parágrafos ao republicar uma matéria do Estadão. A reportagem em
questão fala sobre uma conferência realizada em São Paulo pelo relator
especial para promoção e proteção do direito à liberdade de opinião e
expressão da Organização das Nações Unidas (ONU), Frank La Rue,
presente em um debate promovido pelo “Fórum Nacional pela
Democratização da Comunicação (FNDC), movimento que reivindica um novo
marco regulatório para a mídia”, como explica o Estadão. La Rue é um
defensor, por exemplo, da Ley de Medios argentina, e apoia iniciativas
que busquem democratizar a comunicação e acabar com os monopólios e
oligopólios no setor.
O título do Estadão, porém, afirma o contrário: “’Imprensa não deve
sofrer regulações’, diz relator especial da ONU”. Na verdade, como
explica a própria matéria, La Rue posicionou-se contrário à regulação do
conteúdo, mas favorável aos ataques aos monopólios, quer dizer, à
regulação.
Também a primeira frase da matéria do Estadão distorce a realidade: “O
relator especial para promoção e proteção do direito à liberdade de
opinião e expressão da Organização das Nações Unidas (ONU), Frank La
Rue, afirmou nesta quinta-feira, 13, em São Paulo, que a imprensa não
deve sofrer regulações, especialmente de conteúdo”. Na verdade, La Rue
defende que a imprensa não deve sofrer regulações de conteúdo, e apenas
de conteúdo.
Para além dessas duas questões, a matéria do Estadão apresentou o
factual, apenas. E encerraram o texto dois parágrafos importantes, que
também vão contra a impressão causada pelo título, de que La Rue
pronunciava-se em relação à uma possível regulamentação da mídia no
Brasil, e que apresentam a informação de que há uma organização em
defesa dessa regulamentação por trás da vinda dele ao país. Foram esses
os parágrafos excluídos por Noblat em seu blog, sem que o jornalista
fizesse referência à incompletude do texto que publicou:
O relator da ONU chegou ao País na terça-feira, a convite do Fórum
Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), movimento que
reivindica um novo marco regulatório para a mídia. (…)
O relator, no entanto, evitou fazer comentários sobre questões relativas ao Brasil, pois, segundo ele, está aqui para participar de eventos acadêmicos e não em missão oficial.
O relator, no entanto, evitou fazer comentários sobre questões relativas ao Brasil, pois, segundo ele, está aqui para participar de eventos acadêmicos e não em missão oficial.
Quando o tema é a regulamentação da mídia e a democratização da
comunicação, o jornalismo é deixado em um plano secundário para ascender
com força a vocação empresarial competitiva, em mais uma demonstração
de que, antes de canais de comunicação, esses conglomerados agem como
grandes empresas capitalistas, o que inverte e subverte a lógica do
jornalismo como espaço de informação e o transforma em mero instrumento
de lucro econômico e político.
Alexandre HaubrichNo Blog do Miro
Nenhum comentário:
Postar um comentário