Em julho passado, revelam fontes oficiais, 38 militares norte-americanos
se mataram. Um aumento de mais de 100% sobre os casos de suicídio do
mês anterior. Vinte e dois deles se encontravam em serviço. Os demais
haviam voltado para casa, mas já não se sentiam em seus lares. Eram
outros homens, desfeitos e refeitos pelo horror.
Provavelmente não se sentissem combatentes por sua pátria ou suas
idéias, e, sim, meros mercenários, enviados para assassinar em nome de
interesses que nada têm a ver com os de seu povo. Salvo nas duas guerras
mundiais, quando justa era a luta contra os alemães e o nazismo, os
soldados ianques lutam por Wall Street. O genocídio inútil de Hiroxima e
Nagasáki, ao manchar com a desonra o combate pelos valores humanos,
confirmou os exércitos dos EUA como bandos de pistoleiros do
imperialismo.
Os Estados Unidos nunca tiveram que lutar em seu solo, a não ser na
Guerra da Independência. Sempre invadiram o solo alheio, a partir da
guerra contra o México, em 1846, quando anexaram mais de 40% do
território do país vencido. A Guerra da Independência, bem antes, se
travara contra homens iguais, da mesma etnia, da mesma fé, e poderíamos
dizer, quase das mesmas idéias. O mesmo veio a ocorrer no conflito
interno, o da Guerra da Secessão, apesar da crueldade dos combates e a
bandeira ética do Norte contra a escravocracia do Sul.
Esse enorme privilégio – o de não conhecer as botas dos ocupantes
estrangeiros – transformou-se em maldição. Os militares ianques já não
encontram na alma, desde a derrota no Vietnã, quaisquer razões para a
luta. Assim, são corridos pela depressão, ou se transformam em animais,
como os que se deixaram fotografar em Abu Ghraid, com seus cães. A
depressão os leva a desertar das fileiras, de forma absoluta, ao
estourar a cabeça ou o coração com suas próprias armas.
O filósofo espanhol Ortega y Gasset tem uma tese interessante sobre os
militares e as guerras. Ele considera o cerco de Granada, pelos Reis
Católicos, em 1492 – o mesmo ano da descoberta da América por Colombo –
como o fim do soldado que combatia com honra, e o início do soldado
“técnico”, que atua como simples extensão de sua arma.
No cerco de Granada, e na vitória que se seguiu, os castelhanos usaram o
planejamento tático e estratégico, superando, e em muito, os gregos e
os romanos no projeto de suas operações. Segundo Ortega, ali morreu a
bravura, e nasceu o combatente moderno, mera máquina de matar, sem honra
e sem sentimentos, a não ser os do ódio induzido.
Os soldados americanos que se matam, torturados pelo remorso, talvez
sigam o lema que os japoneses inscrevem nos sabres destinados ao
harakiri: saiba morrer com honra quem com honra não soube viver.
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