Colunista do Globo, Miriam Leitão
publica importante artigo sobre a "direita hidrófoba"; segundo ela,
Reinaldo Azevedo é, sim, um rottweiler, que já rosnou para ela várias
vezes e pediu até que se desculpasse diante do ex-senador Demóstenes
Torres; outro representante da tchurma, o economista Rodrigo
Constantino, que também é colunista do Globo, produz "indigências
mentais"; numa delas, ao falar sobre a nova presidente do banco central
americano, perguntou: "O que importa o que a liderança do Fed tem entre
as pernas?"
A jornalista Miriam Leitão, colunista do Globo, publicou um importante
artigo neste domingo sobre a "miséria do debate" brasileiro.
No texto, ela bate duro em dois representantes da "direita hidrófoba"
brasileira: o colunista Reinaldo Azevedo, de Veja e Folha, e o
economista Rodrigo Constantino, que tem colunas em Veja e no próprio
Globo.
"Os epítetos 'petralha' e 'privataria' se igualam na estupudez
reducionista. São ofensas desqualificadoras que nada acrescentam ao
debate", diz a jornalista.
Dizendo-se alvo dos dois lados, de quem a critica pela esquerda e pela
direita, Miriam passou a tratar então de Reinaldo Azevedo.
"Recentemente, Suzana Singer foi muito feliz ao definir como um
'rottweiler um recém-contratado pela Folha de S. Paulo (...) ele já
rosnou para mim várias vezes, depois se cansou como fazem os que ladram
atrás das caravanas".
Miriam resgatou ainda um texto revelador, em que Reinaldo cobrava dela um pedido de desculpas ao senador Demóstenes Torres (leia aqui).
Depois de tratar de Reinaldo, Miriam saltou para Rodrigo Constantino, o
mais caricato personagem da nova direita brasileira, que, segundo a
jornalista do Globo, produz "indigências mentais". Miriam se refere à
resposta agressiva que recebeu quando defendeu a nomeação de Janet
Yellen para o Federal Reserve, o banco central americano. "O que importa
o que a liderança do Fed tem entre as pernas?", perguntou Constantino
em Veja (leia aqui).
Miriam conclui seu texto afirmando que tais tipos de desqualificação são apenas "lixo". Nada mais.
Leia, abaixo, seu artigo:
Miséria do debate
O Brasil não está ficando burro. Mas parece, pela indigência de certos
debatedores que transformaram a ofensa e as agressões espetaculosas em
argumentos. Por falta de argumentos. Esses seres surgem na suposta
esquerda, muito bem patrocinada pelos anúncios de estatais, ou na
direita hidrófoba que ganha cada vez mais espaço nos grandes jornais.
É tão falso achar que todo o mal está no PT quanto o pensamento que
demoniza o PSDB. O PT tem defeitos que ficaram mais evidentes depois de
dez anos de poder, mas adotou políticas sociais que ajudam o país a
atenuar velhas perversidades. O PSDB não é neoliberal, basta entender o
que a expressão significa para concluir isso.
A ele, o Brasil deve a estabilização e conquistas institucionais
inegáveis. A privatização teve defeitos pontuais, mas, no geral,
permitiu progressos consideráveis no país e é uma política vencedora,
tanto que continuou sendo usada pelo governo petista. O PT não se resume
ao mensalão, ainda que as tramas de alguns de seus dirigentes tenham
que ser punidas para haver alguma chance na luta contra a corrupção. Um
dos grandes ganhos do governo do Partido dos Trabalhadores foi mirar no
ataque à pobreza e à pobreza extrema.
Os epítetos “petralhas” e “privataria” se igualam na estupidez
reducionista. São ofensas desqualificadoras que nada acrescentam ao
debate. São maniqueísmos que não veem nuances e complexidades. São
emburrecedores, mas rendem aos seus inventores a notoriedade que buscam.
Ou algo bem mais sonante. Tenho sido alvo dos dois lados e, em geral,
eu os ignoro por dois motivos: o que dizem não é instigante o suficiente
para merecer resposta e acho que jornalismo é aquilo que a gente faz
para os leitores, ouvintes, telespectadores e não para o outro
jornalista. Ou protojornalista. Desta vez, abrirei uma exceção, apenas
para ilustrar nossa conversa.
Recentemente, Suzana Singer foi muito feliz ao definir como
“rottweiller” um recém- contratado pela “Folha de S.Paulo” para escrever
uma coluna semanal. A ombudsman usou essa expressão forte porque o
jornalista em questão escolheu esse estilo. Ele já rosnou para mim
várias vezes, depois se cansou, como fazem os que ladram atrás das
caravanas.
Certa vez, escreveu uma coluna em que concluía: “Desculpe-se com o
senador, Miriam”. O senador ao qual eu devia um pedido de desculpas, na
opinião dele, era Demóstenes Torres. Não costumo ler indigências
mentais, porque há sempre muita leitura relevante para escolher, mas
outro dia uma amiga me enviou o texto de um desses articulistas que
buscam a fama. Ele escreveu contra uma coluna em que eu comemorava o
fato de que, um século depois de criado, o Fed terá uma mulher no
comando.
Além de exibir um constrangedor desconhecimento do pensamento econômico
contemporâneo, ele escreveu uma grosseria: “O que importa o que a
liderança do Fed tem entre as pernas?” Mostrou que nada tem na cabeça.
Não acho que sou importante a ponto de ser tema de artigos. Cito esses
casos apenas para ilustrar o que me incomoda: o debate tem emburrecido
no Brasil. Bom é quando os jornalistas divergem e ficam no campo das
ideias: com dados, fatos e argumentos.
Isso ajuda o leitor a pensar, escolher, refutar, acrescentar, formar seu
próprio pensamento, que pode ser equidistante dos dois lados. O que tem
feito falta no Brasil é a contundência culta e a ironia fina. Uma boa
polêmica sempre enriquece o debate. Mas pensamentos rasteiros,
argumentos desqualificadores, ofensas pessoais, de nada servem. São
lixo, mas muito rentável para quem o produz.
No 247
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