sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Eleição: devagar com o andor


Em 30 de julho de 2002 o então candidato Ciro Gomes (PPS) alcançou, segundo o Datafolha, 28% de intenção de voto estimulada, contra 33% de Lula (PT). Antes, em fevereiro, segundo o mesmo instituto, Roseana Sarney (PFL) havia alcançado 24% contra 27% de Lula. A história registrou que foram ao 2º turno daquela eleição Lula (46,4%) e Serra (23,1%). Ganhou Lula no 2º turno, com 61,2% contra Serra (PSDB) 38,7%.
Esse extrato da história eleitoral brasileira recente serve para registrar a ocorrência de um espasmo político circunstancial, havido naquele momento e que destoava do confronto eleitoral que a sociedade brasileira já vivenciava (1994/1998) e que posteriormente ficaria ainda mais forte. Ou seja: o Brasil estava polarizado entre duas forças políticas, PT e PSDB e ficaria, assim, por mais três eleições.
Evidente que vivemos em um momento diferente. Aliás, muito diferente. Na bancada do primeiro debate presidencial de 2014, na TV Bandeirantes, em 26.08, o PT esteve representado pela presidenta Dilma. Outros três candidatos saíram da costela petista: Marina, Eduardo Jorge e Luciana Genro. É uma amostra da importante contribuição política que o PT deu ao Brasil. Aécio Neves, representou o PSDB, enquanto Pastor Everaldo e Levy Fidelix fizeram o papel de coadjuvantes.
A marca específica do momento atual estaria localizada na ascensão e afirmação de uma terceira via política e eleitoral, representada por Marina, sua Rede Sustentabilidade e o PSB, partido onde está filiada apenas para disputar as eleições. Anabolizada pela trágica morte de Eduardo Campos, Marina entra na disputa já ocupando o segundo lugar nas intenções de voto e deslocando o PSDB e seu candidato Aécio Neves para o terceiro lugar.
Como ainda estamos há trinta e sete dias do primeiro turno, um olhar mais detalhado na história dessa e de outras eleições presidenciais no Brasil mostra que devemos ter cautela para afirmar categoricamente que a disputa eleitoral, nesta primeira fase, já estaria resolvida com a definição de um segundo turno entre Dilma e Marina Silva. Esta cautela passou a ser mais exigida depois de assistirmos ao primeiro debate, com o enfrentamento direto entre os candidatos.
Como o debate começou mais de 22h e terminou depois da uma da manhã é evidente que foram poucos os brasileiros que assistiram ao confronto, ainda mais por ser na Bandeirantes, que já tem normalmente uma audiência baixa. Os que resistiram até o fim, apesar das regras que engessaram o debate de ideias e propostas, puderam retirar importantes conclusões políticas.
Dilma é de fato a mais preparada. Mostra profundo conhecimento da administração do governo federal, apresentando e defendendo bem as muitas e importantes obras e programas, apresenta também as melhores propostas para avançar as mudanças no Brasil. Com uma postura sempre séria é incisiva, firme e clara nas suas respostas, aparentando algumas vezes irritação com críticas levianas levantadas, sobretudo, por Aécio Neves.
Aécio, uma mistura do Conselheiro Acácio com Pedro Bó, roda em torno de platitudes, aparentando ser um candidato genérico e vazio. Orienta apenas para o ataque ao PT e ao governo federal, sem conseguir apresentar propostas consistentes para melhorar o país. Como Aécio dependia deste primeiro debate para se afirmar frente a ameaça real de ficar fora do segundo turno, se deu mal com um desempenho fraco, marcado por uma postura rancorosa, estudada e maquinada para se impor pela arrogância.
Marina se saiu bem, até porque já tinha experiência deste tipo de debate nas eleições de 2010. Sabe falar olhando para a câmera e as mudanças em seu rosto apontam as variações de tonalidade e ênfase no que diz, ao contrário de Aécio que mantêm a fisionomia congelada, não importando o que esteja falando. Apesar desta postura televisiva favorável, Marina apresenta também uma postura de fragilidade ideológica, muita aparência e pouca consistência em suas análises políticas e propostas.
Sem responsabilidade, Marina aparenta ser corajosa, quando na prática está apenas flertando com o incerto e o perigo de uma postura política oca de conteúdo. Acena dar a condução econômica para o PSDB, numa tentativa de acalmar o mercado, em particular o agronegócio, e por outro lado, a parte social para o PT, na lógica de tentar conquistar eleitores simpatizantes do partido. Com isso, promete fazer uma catação (mistura heterogênea de sólidos) para administrar, o que pode gerar um desgoverno monstruoso e sem rumo, que acabará por devorar o que a população mais pobre conquistou em 12 anos de governos petistas. Enquanto a elite rica e endinheirada estará protegida pelo Itaú, que não terá mais intermediário e conduzirá diretamente o Banco Central.
Neste contexto, devemos esperar as próximas semanas para ver se Marina conseguirá manter-se em segundo lugar e consolidar uma terceira via eleitoral, rompendo a polarização entre PT e PSDB que marca a política brasileira nos últimos 20 anos. É um tempo necessário também para observar se suas intenções de voto estão apenas momentaneamente anabolizadas pela morte de Eduardo Campos ou se aquele trágico evento a catapultou em definitivo para a condição de protagonista da disputa presidencial.
Será um tempo necessário também para a consolidação da influência dos programas e comerciais de TV e rádio nas intenções de voto dos eleitores. Novos debates, sabatinas, entrevistas e eventos de campanha, onde veremos se Marina está mesmo preparada para encarnar a figura de uma nova liderança política, capaz de se afirmar como uma real alternativa de poder, apesar das gritantes contradições e divisões internas entre o PSB e sua Rede Sustentabilidade.
Os próximos dias, portanto, serão de muitas emoções, articulações e ações políticas, que poderão confluir para quatro possíveis cenários. Um deles apenas com a definição no primeiro turno e os outros três prevendo a realização do segundo turno, que agora é mais do que uma forte tendência.
Segundo turno entre Dilma e Marina
Com a exibição do horário eleitoral, a tendência é ocorrer uma melhora na avaliação do governo, o que naturalmente pode levar a uma melhora no desempenho eleitoral de Dilma. Nesse cenário, Dilma poderá chegar e até superar os 40% de intenção de voto, ficando, talvez, um pouco abaixo do desempenho petista nas últimas três eleições presidenciais, em primeiro turno, (46, 48, 46% em 2002, 2006 e 2010 respectivamente). Neste cenário, Dilma iria para o 2º turno em 1º lugar.
Segundo turno entre Marina e Dilma
Neste cenário, que é uma variação do primeiro, temos a inversão nas colocações do primeiro turno, com a candidatura de Marina incorporando definitivamente quem quer qualquer mudança (pouca, média ou muita mudança), avançando sobre uma parte do eleitorado tradicional da oposição (PSDB) e sobre os ainda indecisos e ultrapassando Dilma, indo para o 2º turno, contra o PT, em 1º lugar.
Segundo turno entre Dilma e Aécio
Neste cenário, Dilma fica em torno de 40%, Marina recuaria para a casa dos 20% e Aécio recuperaria o eleitorado que perdeu com a entrada de Marina na disputa, retomando o segundo lugar com algo acima de 20% dos votos. Para ocorrer este segundo turno entre Dilma e Aécio, será necessário que o candidato tucano, contando com a ajuda de setores da grande mídia, consiga desconstruir parte do discurso e propostas de Marina. Não bastará à candidatura de Aécio ficar batendo em Dilma, no PT e no Governo. Se desconhecer Marina e mantiver o ataque focado em Dilma, a candidata do PSB pode crescer e fortalecer o segundo cenário descrito. O PSDB sabe disso e não foi à toa que a primeira pergunta que Aécio fez no debate foi dirigida a Marina, questionando sua coerência política.
Vitória de Dilma no primeiro turno
Neste cenário, uma parte do eleitorado que estaria pensando em votar na oposição, vendo a desidratação eleitoral de Aécio e diante da insegurança política e econômica representada pelas contradições da candidatura de Marina, com medo do desarranjo institucional que pode vir, opta por votar no projeto atual de desenvolvimento do país, capitaneado pelo PT, já conhecido e mais seguro para o Brasil seguir melhorando.
Nesta hipótese, a candidatura de Dilma seria beneficiada por um voto útil enrustido, que viria de setores da elite econômica e da oposição em geral, que tem criticas a sua conduta, mas temem, sobretudo, as incertezas que Marina Silva representa para a economia e para e estabilidade política. Este movimento atrairia um percentual de eleitores suficiente para dar a vitória no 1º turno a Dilma, impedindo o 2º turno entre ela e Marina, que seria uma derrota humilhante para Aécio e seu PSDB.
No CAf


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