MIRIAM LEITÃO - As classes D e E até sabem quem é ela, mas acham que ela fala difícil e não se preocupam com ela |
O que devemos analisar bem é que o
carro-chefe da manipulação exercida pela velha grande mídia não poderia
ser o noticiário político que é amplamente criticado pelos analistas de
esquerda. Essa crítica é pertinente, correta e coerente, mas o
noticiário político é apenas um recurso menor que a mídia grande utiliza
para manipular a opinião pública.
Afinal,
pergunte para um camelô, uma empregada doméstica, um trabalhador rural
quem são Miriam Leitão, Merval Pereira, Reinaldo Azevedo e Eliane
Catanhede. Ou eles conhecerão de forma vaga ou genérica - a não ser
quando os proletários são politizados o bastante para observar as
entranhas da velha mídia - , ou simplesmente os desconhecerão.
Esses
"calunistas" e "urubólogos" não falam para o grande público. E nem
poderiam falar. Seu discurso tem um quê de rebuscado, mal-humorado e
claramente elitista. Seria muita ingenuidade que achemos que o povão
consiga entender, apavorado, as declarações "trevosas" desses
comentaristas da velha imprensa.
Quem
os identifica é a intelectualidade realmente de esquerda, não aquela
que se rende ao espetáculo brega-popularesco, mas os esquerdistas
sérios, que não têm ilusões quanto aos mecanismos da ditadura midiática.
A
intelectualidade classe média de esquerda é que a critica, porque os
"calunistas" e "urubólogos" despejam seu reacionarismo explícito, mas de
um tom elitista que os fazem incapazes de falarem com o grande público.
"Calunistas" e "urubólogos" falam para eles mesmos e para seu "seleto"
público altamente conservador e febrilmente reacionário.
O
que manipula o "povão" é o brega-popularesco. É a "cultura popular" sem
qualidade, feita para o mero consumismo momentâneo, e que vemos que não
produz conhecimento nem valores sociais (quando muito, os nivela para
baixo), e seu valor artístico é muito duvidoso.
Isso
nem de longe é preconceito, afinal está a olhos vistos que seus
cantores e músicos, seus jornalistas e celebridades, comprometidos com a
hegemonia do "mau gosto", exibem uma mediocridade e uma vulgaridade
gritantes, para a qual todo relativismo sucumbe quase sempre à
condescendência acrítica e subserviente.
No
brega-popularesco, a identidade cultural regional é enfraquecida, mas
mesmo os elementos culturais estrangeiros assimilados são sempre de cima
para baixo, pelo poder da televisão aberta e do rádio FM controlados
por oligarquias. Se isso atrai o grande público, não é por isso que deva
atribuir a ele a responsabilidade por essa "cultura", articulada até de
forma evidente por executivos, latifundiários, políticos, publicitários
e burocratas.
Vê-se que o povo
pobre é tratado com um estereótipo pior do aqueles exibidos em programas
humorísticos. Mas como esse estereótipo é trabalhado de forma
"positiva" e "alegre", ainda que deixe latente uma espécie de bullying
midiático contra as classes populares, ninguém desconfia. Não há
questionamentos, muito pelo contrário.
A
intelectualidade chega mesmo a defender esses estereótipos como se
fosse "o verdadeiro povo", e ainda é aplaudida por seus pares, num
discurso que nada tem de objetivo, mas de persuasivo. E ainda cria
argumentos confusos, mas que tocam na emoção mais frágil. Intelectuais
assim viram "deuses", e, por mais que sejam preconceituosos, eles gozam
da visibilidade e do prestígio que pensadores muito mais coerentes não
conseguem ter.
Afinal, o Brasil,
país novo, ainda desconhece muitas coisas complexas que pensadores
europeus e norte-americanos já conhecem. Lá, a pseudo-cultura "popular"
já teve seu esquema jabazeiro desvendado, as "louras burras" de lá -
equivalentes intelectuais das "popozudas" brasileiras, só que muito mais
atraentes e charmosas que estas - foram fartamente contestadas, e nem o
gangsta rap que há muito deturpou o hip hop consegue convencer com seu
arremedo de "cultura das ruas".
Mas
aqui, ainda se pensa que são os comentaristas políticos que manobram o
povo pobre. Quanta ingenuidade. Seria o mesmo que dizer que Muammar
Kadafi era uma ameaça à população do sertão nordestino. É preciso que se
coloquem os pingos nos "ís", porque existem vários modos de manipulação
e controle social.
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