Luciano Nascimento
Repórter da Agência Brasil
A Comissão Nacional da Verdade informou que a tortura passou a ser
prática sistemática da ditadura militar logo após o golpe, em 1964.
Durante o balanço de um ano de atividades, os integrantes da comissão
desmentiram a versão de que a prática tenha sido efetivada em resposta à
luta armada contra a ditadura, iniciada em 1969.
“A prática da tortura no Brasil como técnica de interrogatório nos
quartéis é anterior ao período da luta armada, ela começa a ser
praticada em 1964”, disse a historiadora Heloísa Starling, assessora da
comissão. "O que é importante notar é que ao contrário do que supunha
boa parte da nossa bibliografia, o que nós temos é a tortura sendo
introduzida como padrão de interrogação nos quartéis em 64 e explodindo a
partir de 69," argumentou.
O balanço divulgado pela comissão considera que o uso da violência
política permitiu ao regime construir um Estado sem limites repressivos.
“Fez da tortura força motriz da repressão no Brasil. E levou a uma
política sistemática de assassinatos, desaparecimentos e sequestros.”
A comissão revelou ainda que a Marinha ocultou informações sobre mortes
na ditadura, quando foi questionada em 1993 pelo governo Itamar Franco.
De acordo com levantamentos da Comissão da Verdade, cerca de 50 mil
pessoas foram presas só no ano de 1964, em operações nos estados da
Guanabara (atual Rio de Janeiro), de Minas Gerais, de Pernambuco, do Rio
Grande do Sul e de São Paulo. A comissão identificou prisões em massa
em navios-presídios.
A comissão também relatou ter identificado 36 centros de tortura em sete
estados, inclusive em duas universidades - na Universidade Federal do
Recife e na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. “Nós
identificamos que as pessoas foram presas dentro dos campus da
universidade e as práticas de violência ocorreram dentro do campus”,
disse Heloísa Starling.
A historiadora disse que a comissão está no caminho de desmontar a tese
de que a tortura foi praticada sem o consentimento do alto escalão
militar. Ela apresentou um organograma de 1970, ano de criação do Centro
de Operações de Defesa Interna (Codi), que mostra que as informações
sobre o que ocorria no órgão eram de conhecimento do alto escalão do
Exército, da Marinha e da Aeronáutica.
Toda a bibliografia, segundo a assessora, mostra que a estrutura de
comando vai até o segundo nível, onde está o Centro de Informações da
Aeronáutica (Cisa), Centro de Informações do Exército (CIE) e o Centro
de Informações da Marinha. “É muito pouco provável que o general Médici
[presidente Emílio Garrastazu Médici] não recebesse informações do seu
ministro mais importante, que era o ministro do Exército, Orlando
Geisel”, disse.
Edição: Carolina Pimentel
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