A hipocrisia, como a desonestidade ou a corrupção, não admite gradação. Não há maior ou menor hipocrisia, assim como inexiste desonestidade mínima ou máxima, corrupção de grande ou de pequeno porte. A hipocrisia da nossa mídia, por exemplo, não é maior nem menor do que as que ela denuncia na política. A sua desonestidade é tão grande quanto qualquer outra quando sonega informações ou trata com privilégios certos pontos de vista sem a apresentação equivalente do contraditório. E ela é cúmplice da corrupção quando, em nome de interesses políticos, elege a dedo um caso e deixa de lado, acintosamente, todos os demais , que têm como protagonistas os seus aliados.
É por isso, é só por isso, que defendo a democratização dos meios de
informação – sempre lembrando que alguns deles são concessões públicas
- , de modo a impedir que meia dúzia de famílias brasileiras – afinadas
ideologicamente em torno de interesses que não são os nacionais -
detenham o monocórdio poder de distorcer fatos ao seu bel prazer.
Não vivemos o melhor dos mundos no Brasil de hoje. Mas ninguém vive o
melhor dos mundos na Terra de hoje. Sem precisar ser um especialista,
qualquer bom leitor do planeta pode perceber os sérios problemas que
envolvem, hoje, os caminhos da humanidade. Se nos voltarmos para a
economia, veremos a derrocada de grandes países da Europa, com seus
índices expressivos de desemprego, a estrondosa desaceleração do império
norte-americano, a previsível falência desse sistema integrado de
mercados que vincula os descalabros das grandes corporações bancárias à
infelicidade dos cidadãos do mundo inteiro.
Não vivemos o melhor dos mundos no Brasil, mas vivemos melhor, no
Brasil, que o mundo em geral. Só a desfaçatez dos manipuladores da
informação consegue não enxergar isso. Só essa preocupação mórbida com
as previsões catastróficas e terroristas pautadas pelos patrões
midiáticos faz com que alguns profissionais trabalhem sempre com meias
verdades, repletas de parcialidade. Temos a “imprensa do tomate”, aquela
que preconizou uma inflação galopante a partir de um problema sazonal
que envolvia um único produto da mesa do brasileiro. Temos a imprensa
de analistas e especialistas escolhidos a dedo para repetir os mantras
da turma que até hoje não engoliu três derrotas seguidas afirmadas pelo
maior dos ícones da democracia: o voto.
Afirmei e afirmo minha independência quanto a partidos políticos, nesse
conturbado sistema que obriga a governabilidade a criar “sacos de
gatos” em que os princípios ideológicos cedem a pragmatismos de ocasião.
Afirmo, aqui, inclusive, minha insatisfação em ver, “aliados” do atual
Governo, os atores de sempre – aqueles mesmos que povoaram gabinetes
repressores da ditadura, salões colloridos pouco respeitáveis ou festas
da privataria tucana. Reafirmo aqui meu desconsolo com agremiações
partidárias, cuja integridade é incompatível com o sistema político
vigente.
Nada disso, porém, me impede de posicionar-me a favor de medidas que se
voltem para a diminuição das desigualdades sociais, para o combate à
miséria, para a dignidade do ser humano, para a afirmação cidadã.
Cético em relação a utopias, aplaudo, no entanto, tudo que se aproxima
da justiça social. Nesse sentido é que me coloco a favor de muitas das
medidas tomadas pelos últimos governos, os que sucederam ao
neoliberalismo clássico dos tucanos.
Como ignorar os inéditos e baixíssimos índices de desemprego entre nós,
na contramão do panorama de grandes potências do planeta? Como não
aplaudir as significativas quedas na mortalidade infantil, o aumento das
expectativas de vida, ou os níveis de redução do trabalho escravo?
Como ignorar que esses governos tiraram algumas dezenas de milhões de
pessoas da pobreza, através de programa consagrado no mundo inteiro?
Como não valorizar o acesso de milhões de pessoas a bens e serviços de
que não dispunham, a ponto de constituírem uma “nova classe média”? Como
não nos orgulharmos da ascensão internacional do país, cuja voz hoje é
respeitada e interfere no cenário mundial? Como colocar-se contra um
programa que pretende levar médicos a quem não tem, em nome de
corporativismos perversos?
Críticas sempre haverá. Eu ainda penso que os bancos brasileiros
continuam deitando e rolando com seus lucros astronômicos , penso que é
preciso alavancar, e muito, os índices de saúde, educação e moradia do
povo, penso que agências reguladoras devem abandonar uma certa
cumplicidade perversa com os malfadados planos de saúde e as
oportunistas empresas de telecomunicações (orgulho dos privatistas),
penso que as nossas tarifas de celular não podem ser as mais caras do
mundo, penso que o Governo deveria insistir na criação da Lei dos Meios,
penso, enfim, que há muito por fazer. Mas, se você prestar bem atenção
e não quiser aderir cegamente às manipulações que andam por aí,
perceberá que o neoliberalismo não tem nenhuma resposta a dar para
esses problemas e, pelo contrário, só tende a acentuá-los.
A mais recente falácia dessa turma – agora acumpliciada com “novos
velhos atores” que, convenientemente, renegaram apoios e convicções
antigas - foi a crítica ao modelo de leilão de Libra, o do pré-sal.
Tudo sempre pode ser melhor. É o caminho natural das coisas. Mas Dilma
está certa quanto ao modelo. Não dá para a Petrobras, sozinha, bancar a
monumental exploração desses recursos. É preciso contar com parcerias
sólidas, mas mantendo a ingerência nacional no negócio pactuado. O
entreguismo de sempre preferiria tirar a Petrobras da jogada e, em nome
dessa coisa pérfida chamada mercado, alienar o patrimônio do país à
saga do lucro internacional. O que se está fazendo é bem diferente do
processo neoliberal de privatizações. É preciso ser hipócrita,
intelectualmente desonesto, para não enxergar isso. Ou, então, estar a
serviço de outros interesses...
Bom, cada um põe os pingos nos is do jeito que acha melhor. O meu jeito
é esse. Tem gente que põe e tira, e fica “enredado”, em cima do muro.
Tem gente que nunca escreve os is com os devidos pingos...
Rodolpho Motta Lima
No DR
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