O anti-petismo tem alcançado as raias da histeria coletiva nesses
últimos meses. Os xingamentos a Dilma na abertura da copa por parte de
grupos sociais privilegiados que jamais votaram no PT e o
descontentamento com os gastos escorchantes na construção dos estádios
para a copa arranhou ainda mais a imagem de Dilma e do PT, apenas
alguns meses depois de vários figurões do partido terem sido presos por
causa do mensalão. Entre denúncias e ânimos inflamados quem tem se
beneficiado de tudo isso sem precisar dizer uma só palavra é Aécio
Neves e o PSDB. Diante dos acontecimentos recentes, o PT poderia até
perder a eleição em um segundo turno, mas para si mesmo, e não porque
seus adversários apresentem qualquer proposta razoável de
governabilidade; e não poderiam, porque eles não têm. Por este motivo,
vale a pena elencar algumas razões pelas quais o PSDB não deve voltar à
presidência:
1. A sigla PSDB quer dizer Partido da Social Democracia
Brasileira. Só que de social democrata o partido não possui
absolutamente nada. Historicamente, a social democracia está ligada a
movimentos políticos de esquerda e embora seus programas tenham sofrido
alterações dependendo da época e do lugar, após a Segunda Guerra,
passou a identificar-se com projetos de redistribuição de riqueza
através de programas sociais e investimentos governamentais em grandes
empresas. Com o advento do neoliberalismo na década de 1980 essa
doutrina entrou em crise e cedeu lugar à redução do papel do Estado em
políticas sociais e à privatização de empresas. Isso beneficiou
grandemente os conglomerados internacionais e a retirada do Estado da
vida social ampliou os bolsões de pobreza, o desemprego e reduziu o
poder aquisitivo dos trabalhadores, especialmente nos países não
desenvolvidos. Quando o PSDB chegou ao poder em 1994, no auge da crença
internacional de que as ideologias de esquerda estavam falidas, essa
era a cartilha a ser seguida. E foi.
2. Como consequência disso, a desigualdade e a concentração de
renda caíram mais no primeiro mandato do governo Lula do que em oito
anos de governo FHC. Em 2007, uma pesquisa da FGV mostrou que somente
no primeiro governo Lula, a taxa de miséria caiu quase 8,5 por cento,
mais do que o dobro do que ocorreu nos dois mandatos de FHC, que ficou
em 3,1% [1].
3. O PSDB é o partido do grande empresariado e dos arrochos
salariais. As políticas econômicas do governo FHC estabilizaram a
economia, mas em detrimento do poder aquisitivo dos trabalhadores. Com
FHC, a inflação era de 9,2% ao ano, com Lula e Dilma, é de 5,9% [2].
Não por acaso, em 1996 a Folha noticiou que o governo FHC foi
considerado péssimo por 25% da população [3]. Curiosamente, até os mais
ricos demonstraram insatisfação com essa política desastrosa do
ex-presidente, segundo a mesma matéria.
4. O PSDB é o partido das filas de desempregados. De acordo com o
IBGE, o índice de desemprego mais do que dobrou durante os dois
mandatos de FHC como presidente: de 4,5 milhões no final de 1994, foi
para 11,5 milhões no final de 2000 [4]. Quem não se lembra que quase
diariamente os jornais noticiavam filas quilométricas de desempregados
nas grandes capitais do país apinhando quarteirões, se submetendo a
mal-estares resultantes do calor e de muitas horas de espera, além de
inúmeras humilhações para conseguir uma vaga de emprego?
Já o governo petista bateu recordes de redução do desemprego. Segundo
edição de maio da revista Exame, no último mês de abril o desemprego
recuou quase cinco por cento e em março o índice de desempregados
chegava a 1,1 milhão de pessoas [5].
5. Para quem acredita que a corrupção somente passou a existir
nos últimos doze anos no Brasil, vai aí uma informação bombástica: O
governo FHC foi marcado por casos de corrupção não menos escandalosos.
Um deles foi a extinção da Comissão Especial de Investigação (CEI),
logo após assumir o poder em 1995, órgão criado durante o governo
Itamar Franco para investigar denúncias de corrupção no governo
federal. De acordo com a Carta Maior, “foi a primeira experiência de
controle social, externo, da corrupção, em contraposição ao controle
corporativo. Era independente e com amplos poderes para ajudar a sanear
a administração Pública Federal. Instalada em 4 de fevereiro de 1994,
tinha poderes para determinar suspensão de procedimentos ou execução de
condutas suspeitas, recomendar investigações, auditorias e
sindicâncias e propor ao presidente da República providências,
inclusive legislativas, para coibir fatos e ocorrências contrárias ao
interesse público [6]“. Além disso, os desvios de verbas na SUDAM e na
SUDENE (extintas somente quase no final de seu mandato, em 2001)
somaram quase R$ 4 bilhões [7], além da existência de caixa dois para
reeleição e denúncias de compra de votos de parlamentares para
aprovação da emenda da reeleição.
6. O PSDB é o partido dos apagões e do racionamento de energia.
Basta ver o que o governo Alckimin faz agora em São Paulo, sobretaxando
consumidores e impondo racionamentos para termos uma ideia do que
virá, ou melhor, do que voltará, se Aécio Neves se tornar presidente:
em 2001 uma crise energética fez o governo pressionar a sociedade a
reduzir em vinte por cento o consumo de energia [8] e apagões passaram a
se tornar constantes no país. Já o governo petista contornou esse
problema, evitou novos racionamentos e apagões e durante a gestão Dilma
foi construída a hidrelétrica de Estreito, no Maranhão, com capacidade
para abastecimento de quatro milhões de pessoas [9].
7. O PSDB é o partido do sucateamento das universidades
públicas. Durante o governo FHC, o ensino superior privado foi
beneficiado em detrimento do público. Além disso, historicamente o
acesso à universidade sempre foi prerrogativa das elites brancas,
acostumada a ver o pobre na favela, limpando para-brisas de carros em
avenidas nas grandes cidades ou em longínquas escolas públicas de baixa
qualidade. Contra esse apartheid social, o governo Lula, além de ter
ampliado e fortalecido as universidades federais, também criou
mecanismos para ampliar o acesso da população de baixa renda, como o
Sisu e o sistema de cotas sociais e raciais. E para os que dizem que a
informação de que no governo Lula aumentaram as matrículas nas
universidades federais é uma farsa, remeto o leitor a esse importante
texto do reitor da Universidade Federal da Bahia: educação superior em Lula x FHC.
8. O PSDB é o partido do encolhimento dos direitos trabalhistas.
No final de seu segundo mandato, FHC propôs um projeto de alteração da
CLT, como a flexibilização de direitos trabalhistas como o 13º
salário, licença maternidade, FGTS, entre outros, além de uma reforma
sindical e uma proposta de tratamento diferenciado a pequenas empresas
[10]. Já o governo petista, além de não ter subtraído direitos aos
trabalhadores, ainda os estendeu a categorias historicamente
marginalizadas, como as empregadas domésticas, que passam a ser
assistidas pela legislação trabalhista.
9. O PSDB é o partido da repressão aos movimentos sociais. Quem
não se lembra do massacre de Eldorado de Carajás, no sul do Pará,
ocorrido em 1996? Por outro lado, as políticas de reforma agrária de
FHC determinavam o não assentamento de famílias que participavam de
ocupação de terra [11] e quando concorreu à presidência em 2002, José
Serra prometia em seus programas eleitorais que não permitiria invasões
de terras durante seu governo. Que métodos ele usaria pra isso é algo
que jamais esclareceu. Felizmente, Serra foi derrotado naquele ano. Em
doze anos, o governo petista caracterizou-se por um profícuo diálogo
com movimentos sociais e pela ampliação de políticas afirmativas a
minorias sociais.
10. O PT se manteve esses doze anos no poder porque conseguiu
aglutinar interesses diversos, do empresariado e do povo. O PT se
mostrou o único partido que se aproxima de uma social-democracia ao
ampliar as políticas sociais e a renda média dos trabalhadores para
reduzir o abismo social que historicamente caracterizava o fosso
intransponível entre nossas elites e as camadas mais pobres da
sociedade: Em 2004, Tarso Genro observou o seguinte: “Ao potencializar
este programa [o bolsa família], o governo Lula permitiu em quase dois
anos, a distribuição média, de R$ 75,00, por família, atingindo cerca
de 6 milhões e quinhentos mil lares, enquanto no governo FHC, a soma
dos programas incorporados pelo Bolsa Família (Bolsa Escola, Bolsa
Alimentação, Cartão Alimentação e Auxílio Gás), distribuiu em seus
últimos dois anos a média por família de R$27,00, atendendo a cerca de 5
milhões e setecentos mil lares [12]“. A ampliação das políticas de
redistribuição direta de renda como o bolsa família foram importantes
tanto para empresários como para consumidores, porque aqueceu a
economia, facilitou a abertura de pequenas empresas, ampliando o número
de empreendedores e de empregos diretos. Geralmente os que julgam os
programas sociais como “esmola” ou “ação eleitoreira” ignoram sua
importância e seu alcance: para termos uma ideia, a extrema pobreza,
que era de 12% em 2003, caiu para 4,8% em 2008, o que implica melhorias
substanciais na qualidade de vida dessa parcela da população [13] e
teve impacto importante na redução da mortalidade infantil [14]. Além
disso, muitos beneficiados abandonaram voluntariamente a bolsa após
melhorarem de vida [15]. O governo tucano focou no empresariado,
manteve as políticas sociais num nível modesto e, como já foi
observado, não conseguiu reduzir de forma significativa as elevadas
taxas de desemprego e extrema pobreza no país.
Conclusão: Em geral, os peessedebistas não gostam de
comparações com o governo Lula ou Dilma. O fato é que qualquer
comparação evidencia o quanto essas duas últimas gestões foram mais
eficientes em termos de política social. Não há dúvida de que agora as
pessoas vivem melhor do que há quinze ou vinte anos atrás. Hoje, o PT
sofre muitas críticas não pelo que fez, mas pelo que deixou de fazer.
Ainda precisamos de uma reforma política, tributária e de melhorias na
infraestrutura do país (esse pacote de investimentos tão prometido
antes da copa e não cumprido). É a precariedade de nossa
infraestrutura, somada aos elevados impostos que pagamos que ainda
entravam o crescimento do país. Mas se isso não tem acontecido com o
PT, tampouco acontecerá sem ele. O PAC foi lançado pra isso, mas a
corrupção dos gestores impede que seja cumprido com êxito. Quanto às
melhorias em saúde e educação, vivemos em uma República federativa e os
investimentos nessas áreas são de responsabilidade de Estados e
municípios, que recebem as verbas para isso. O PT pode ter cometido
muitos erros no poder, mas acertou mais do que errou e a popularidade
Lula ao deixar o poder em 2010 prova isso. Hoje não temos mais filas de
desemprego e reduzimos bastante a miséria. Reeleger o PSDB é correr o
risco de um retrocesso.
Notas
[1]http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Economia/Pobreza-cai-mais-com-Lula-do-que-com-FHC-diz-pesquisa/7/13821
[2]http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/165812-governo-segura-tarifas-para-conter-inflacao-diz-ministro.shtml
[5] http://exame.abril.com.br/economia/noticias/taxa-de-desemprego-no-brasil-cai-a-4-9-em-abril-diz-ibge-2
[6]http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/FHC-foi-mais-omisso-que-Lula-e-extinguiu-comissao-de-investigacao/4/11757
[13]http://www.jornalimpactoonline.com.br/brasil/bolsa-familia-reduziu-a-48-parcela-em-extrema-pobreza
[15]http://noticias.r7.com/brasil/em-dez-anos-12-dos-beneficiarios-do-bolsa-familia-deixaram-o-programa-apos-renda-melhorar-17102013
No Bertone Souza
Do Blog CONTEXTO LIVRE.
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