Uma distância de apenas 14 quilômetros separa os dois escândalos recentes da política nacional que envolvem dois senadores por Minas Gerais, o ex-presidente do Cruzeiro, Zezé Perrela (PDT) e o candidato a presidente Aécio Neves (PSDB).
A pista de pouso e decolagem construída durante o governo de Aécio
Neves em Cláudio, no Centro-Oeste mineiro, em um terreno que pertenceu a
fazenda do tio avô do candidato tucano fica distante 14 quilômetros de
Sabarazinho, um povoado de Itapecerica, também no Centro-Oeste
Mineiro, onde o helicóptero da empresa Limeira Agropecuária, da família
do senador Zezé Perrela, fez uma parada para reabastecimento carregado
com 445kg de pasta base de cocaína, em novembro do ano passado.
A parada em um ponto de Sabarazinho aconteceu três horas e meia antes
da apreensão da aeronave por policiais militares e federais em um sítio
em Afonso Cláudio, no Espírito Santo. O valor da carga é estimada em
R$ 10 milhões, podendo multiplicar por dez com o refino. Segundo o
inquérito da PF, o carregamento foi feito em Pedro Juan Cabalero, no
Paraguai, e tinha como possível destino Amsterdam, na Holanda, o que
configura tráfico internacional.
No dia 20 do mês passado, reportagem do jornalista Lucas Ferraz, da “Folha de S.Paulo”, revelou que Aécio Neves construiu a pista na fazenda que pertenceu a seu tio-avô, além de ficar próxima a uma propriedade da família do candidato.
Na última semana, Aécio Neves admitiu que já usou a pista, mesmo o
espaço ainda não tendo sido homologado pela Agência Nacional de Aviação
Civil.
O investimento do governo mineiro para a construção da pista foi de R$
14 milhões. Cláudio tem 25 mil habitantes e está distante 50
quilômetros de Divinópolis, onde já existia uma pista de pouso e
decolagem.
O cruzamento dos dois escândalos — do helicóptero e da pista — é
comprovado pelos documentos considerados sigilosos do inquérito da
Polícia Federal (PF), que este repórter teve acesso.
A PF constatou, com base no rastreamento do GPS do helicóptero e nas
anotações do plano de vôo dos pilotos, ambos apreendidos e examinados
pela perícia técnica, que o helicóptero carregado com quase meia
tonelada de pasta base de cocaína parou em um ponto próximo ao povoado
de Sabarazinho.
Segundo o inquérito da PF, no dia 24 de novembro de 2013, às 14h17,
aproximadamente três horas e meia antes do helicóptero ser apreendido
pela polícia no município de Afonso Cláudio, no Espírito Santo, a
aeronave ficou parada por trinta minutos numa fazenda do povoado, onde
duas pessoas aguardavam o pouso com galões de combustível.
A localidade fica a 14 quilômetros da pista de Cláudio e também das
fazendas da família Tolentino, onde nasceu Risoleta Neves, esposa de
Tancredo Neves e avó de Aécio Neves.
O município de Cláudio chega, inclusive, a ser citado no inquérito na
análise das mensagens telefônicas dos pilotos, que foram captadas pelas
Estações de Rádio Base (ERB), que são os equipamentos que fazem a
conexão entre os telefones celulares e a companhia telefônica.
Mapa mostra distância entre a pista de pouso e o local em que o helicóptero parou para reabastecimento |
Detalhe do inquérito da PF, com o local de parada do helicóptero em Sabarazinho |
Suspeita que não foi desvendada
O helicóptero foi apreendido no dia 24 de novembro. Três dias depois, 27 de novembro, após a apreensão ganhar destaque na mídia, o proprietário da terra fez uma denúncia para a Polícia Militar de Divinópolis. Segundo a PM, tal denúncia foi feita de maneira “anônima”. O proprietário afirma que avistou um helicóptero sobrevoando a região em baixa altitude e depois encontrou em suas terras 13 galões, de 20 litros cada, com substância semelhante a querosene.
O helicóptero foi apreendido no dia 24 de novembro. Três dias depois, 27 de novembro, após a apreensão ganhar destaque na mídia, o proprietário da terra fez uma denúncia para a Polícia Militar de Divinópolis. Segundo a PM, tal denúncia foi feita de maneira “anônima”. O proprietário afirma que avistou um helicóptero sobrevoando a região em baixa altitude e depois encontrou em suas terras 13 galões, de 20 litros cada, com substância semelhante a querosene.
Como o Boletim foi realizado após a apreensão do helicóptero, o
delegado da Polícia Federal em Divinópolis, Leonardo Baeta Damasceno,
afirma no inquérito não descartar o envolvimento de pessoas da região e
recomenda como imprescindível uma diligência sigilosa no local, para
saber quem são o dono do terreno e as pessoas que tem livre acesso ao
local.
Porém, ainda de acordo com o inquérito que esse repórter teve acesso a
diligência não foi realizada. Em outra página do inquérito, o
proprietário é inocentado sem explicação convincente, dessa vez por
documento assinado pelo agente da PF, Rafael Rodrigo Pacheco Salaroli,
que afirma: “A total isenção da propriedade e de seu proprietário na
empreitada criminosa, restando, portanto, a terceiros sem ligação com o
local, a atuação delituosa de reabastecimento da aeronave”.
Trecho do inquérito descartando a investigação no local do abastecimento em Sabarazinho |
Parente é serpente
Tancredo Aladim Rocha Tolentino é primo de Aécio Neves e filho de Múcio Guimarães Tolentino, o tio-avô do candidato tucano que teve a terra desapropriada para a construção da pista em Cláudio. Quêdo, como é conhecido, é o responsável, segundo o jornal Folha de São Paulo, por controlar a chave do aeroporto público de Cláudio, que fica distante seis quilômetros da fazenda frequentada por Aécio Neves.
Tancredo Aladim Rocha Tolentino é primo de Aécio Neves e filho de Múcio Guimarães Tolentino, o tio-avô do candidato tucano que teve a terra desapropriada para a construção da pista em Cláudio. Quêdo, como é conhecido, é o responsável, segundo o jornal Folha de São Paulo, por controlar a chave do aeroporto público de Cláudio, que fica distante seis quilômetros da fazenda frequentada por Aécio Neves.
Em 2012, Quêdo tentou se candidatar a prefeito de Cláudio, mas foi
impedido pela lei da Ficha Limpa devido a pendências judiciais. Meses
antes, Quêdo foi preso na operação “Jus Postulandi”, da Polícia
Federal, por participar de uma quadrilha especializada na venda de
habeas corpus para traficantes de drogas.
Quêdo, segundo a denúncia, fazia a intermediação do negócio. Ele
recebia a quantia, que variava entre R$ 120 mil e R$ 240 mil dos
traficantes, ficava com uma parte do dinheiro e repassava o restante ao
desembargador Hélcio Valentim, que determinava a expedição de alvará
de soltura dos presos.
Em três casos descritos na denúncia realizada pelo
subprocurador-geral da República Eitel Santiago, as liminares foram
negociadas para favorecer presos por tráfico de drogas. Um dos
beneficiários foi preso em flagrante, em julho de 2010, num sítio do
distrito de Marilândia, também pertencente a Itapecerica, com cerca de
60 quilos de pasta-base de cocaína.
O processo será julgado no STJ e Quêdo responderá por formação de
quadrilha e três vezes por corrupção, duas delas “ativa qualificada”.
Trechos da denúncia do procurador Etiel Santiago, que acusa o primo de Aécio Neves de participar de uma quadrilha de venda de habeas corpus para traficantes de drogas |
Leonardo Dupin, jornalista e doutorando em Ciências Sociais na Unicamp.
No Blog do Juca Kfouri
Do Blog CONTEXTO LIVRE.
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