César Antonio Martín - Jornalista argentino e editor do Blog da Dilma
Vitória esmagadora, horizonte latino-americano.
O
histórico triunfo da primeira mulher re-eleita como presidente da
Argentina imprime um sinal de continuidade sobre a integração
latino-americanista daquele país.
Durante
a passada segunda-feira 24 de outubro, Argentina expunha resultados
eleitorais com números avassaladores. A Presidenta Cristina Fernández de
Kirchner, advogada pratense de 58 anos de idade, conquistava sua
re-eleição com 53 por cento da totalidade dos votos, e uma margem de 38
pontos de diferença sobre seu segundo colocado, o radical Ricardo
Alfonsín.
Dessa forma, o movimento Frente para a
Vitória, criado originalmente pelo falecido ex-presidente Néstor
Kirchner (1950-2010) consagrou sua continuidade com a proposta de um
modelo nacional e integrador, que não deixa de estar circundado pelas
denúncias de corrupção e enriquecimento ilícito dos seus principais
membros (a família presidencial teria aumentado seu patrimônio pessoal
em mais de um 500% desde 2004). Assim mesmo, o kirchnerismo como
movimento apoiado pelas classes populares, médias e parte do
empresariado argentino, aposta ao crescimento diversificado da economia,
articula ações de assistência social, integra as cúpulas sindicais para
o diálogo e mantêm a moeda local (o “peso”) numa relação com o dólar
mais conveniente para o mercado interno. Isto tem gerado a oposição
violenta dos poderosos setores agro-exportadores, principalmente dos
grupos comerciantes de soja e trigo, junto com os setores
tradicionalistas e os simpatizantes da última ditadura militar argentina
(1976-1983) para cujos principais líderes a Justiça Federal tem ditado
sentenças de cadeia perpétua, dentro da nova política kirchnerista de
revisão histórica dos direitos humanos e do terrorismo de Estado.
O
contexto atual da América do Sul demonstra que, através de seus líderes
populares e populistas, as nações continuam agindo para manter a
integração política e econômica da região, através de diversos acordos
político-comerciais e de blocos como o MERCOSUL e o Pacto Andino. Ao
respeito, a contundente vitória de Cristina Kirchner já começou a
manifestar atitudes que demarcariam uma continuidade de laços fortes com
os governos venezuelano, boliviano, colombiano, equatoriano, uruguaio
e, claramente, com o atual movimento petista brasileiro. De fato, no seu
primeiro discurso depois de confirmada como re-eleita “Cristina”
expressou em primeiro lugar agradecimentos aos demais presidentes e
governos americanos, ressaltando o “amor fraternal” da própria Dilma
Rousseff.
O novo projeto de
governo argentino, manifesto minuciosamente pela mídia oficial, inclui
ratificações dos convênios de desenvolvimento estrutural internacional,
pontualmente nas áreas da sustentabilidade energética, do abastecimento
do petróleo e da circulação de alimentos básicos. Neste sentido, Bolívia
e Venezuela manteriam os fortes planos de intercâmbio, podendo-se abrir
o jogo inclusive para novos atores tais como o México, quem estuda
desde o 2008 uma inserção nos mercados sul-americanos, destilando no
processo dúvidas sobre o compromisso político para com os líderes da
região. Contudo, há economistas que se exprimem negativamente sobre uma
relação mais estreita entre o país dos maias e a Argentina; situação que
poderia deixar ao Brasil sem um aliado estratégico de grande porte na
predominância do biopoder continental. Sobre este ponto, a longa amizade
dos Kirchner com o ex-presidente Lula e agora com Dilma garantiria, ao
menos extra-oficialmente, o apóio incondicional entre as nações. Mas
essas e outras simpatias sul-americanas não têm impedido a Kirchner de
se aproximar cada vez mais das autoridades européias, procurando atrair
novos investimentos e outras praças para a produção argentina no Velho
Continente. Chaves estratégicas manifestas nas visitas ao país do
Presidente espanhol José Luis Zapatero e do Rei Juan Carlos, assim como
nas missões comerciais argentinas que possuem agendados encontros na
Alemanha presidida por Ângela Merkel, e na França de Nicolas Sarkozy.
Para
com a nação lusófona, o governo de Cristina enfatiza o interesse
argentino pelo Brasil por vínculos nas esferas da energia não-renovável e
nuclear, assim como de produtos de inserção mercantil, e na a área da
defesa. Desde o passado mês de julho estaria confirmada uma visita de
Cristina Kirchner ao Brasil para o próximo mês de Setembro, visando
discutir assuntos de fortalecimento bi-lateral e aproveitamento
ideológico do grande momento político dos governos das duas potências do
MERCOSUL.
A fluente
movimentação de produções industriais originadas principalmente no eixo
Curitiba- São Paulo- Porto Alegre para as costas do Rio da Prata, seria
parte da compensação pelo apóio e as facilidades que o Brasil brinda às
exportações alimentícias e à indústria turística dos “hermanos”. Os
viageiros relatam surpresos da colossal quantidade de visitantes e
moradores brasileiros que ocupam as ruas “portenhas” e que há tempo se
destacam em instituições e empresas argentinas de forte posicionamento
internacional.
Uma rápida
leitura da re-eleição presidencial na Argentina fornece tanto idéias de
continuidade latino-americanista e de comunhão com os condutores
nacionais latinos deste Século XXI, quanto numa marcada estilística do
tradicional peronismo argentino, que se manifesta no forjamento de um
estado forte e gerador de empregos, com um estilo de governo que se
baseia na articulação das instituições públicas, mas elencando o
vertical protagonismo presidencial. Os desafios políticos argentinos dos
últimos 10 anos permanecem: manter a estabilidade econômica perante uma
sustenida inflação nos preços, incorporar de forma movimentista a
industrialização local com as classes médias e trabalhadoras perante os
adversários da aristocracia autoritária, a mídia privada e o modelo
agro-exportador, e reafirmar os fundamentais laços financeiros e
multilaterais com o resto da América do Sul (pontualmente, com aquela
que não assinou o ALCA).
Assim, a
continuidade das boas relações entre a Argentina e o Brasil, fora das
partidas de futebol, se estabelece como um fator fundamental de
posicionamento internacional para ambos os atores. Tanto como suportes
da manutenção ideológica do chamado “novo-latinoamericanismo” localista,
assim como nos papéis de nova potência mundial em surgimento,
acompanhada de um aliado estratégico fundamental.
Fontes fotográficas: www.aldeiagaulesa.net / www.noticias.terra.br
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