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Capa e contracapa do material distribuído no Rio de Janeiro. |

Jean Wyllys, CartaCapital
Assustador! O esgoto eleitoreiro
já começa a vazar na reta final de campanha. Na zona oeste do Rio de
Janeiro, um exército de fiéis recrutados como voluntários por igrejas
evangélicas fundamentalistas está distribuindo um material de campanha
bizarro criminoso assinado pelas campanhas de Marina Silva para
presidenta, Ezequiel Teixeira para deputado federal e Édino Fonseca para
deputado estadual. São milhares de revistas de 24 páginas em cores
acompanhadas de um DVD com mentiras acerca de LGBTs, estimulando o ódio e
a violência contra estes, além de trazer deturpações sobre as pautas
dos movimentos feministas e negro para prejudicar a candidatura da
presidenta Dilma. Fonseca é quem se responsabiliza formalmente pelo
material, assinando-o com seu CNPJ eleitoral: 20583168000184.
Para quem está duvidando dessa sujeira, ele pode ser baixado na íntegra (o link está no final deste artigo).
É o mesmo material que usarei como prova para acionar a justiça
eleitoral no intuito de que essa porcaria seja apreendida e seus
responsáveis sancionados de acordo com a lei.
Na capa, a revista com Fonseca, Teixeira
e Marina anuncia: "Veja os planos do anticristo: nova ordem mundial
contra a família e a igreja" (a palavra "Veja" é escrita com a mesma
tipografia usada pela revista da editora Abril), e depois enumera:
"eutanásia, mercado do feto, prostituição de menores, carícias de
homossexuais em lugares sagrados...", etc.
O panfleto mistura um discurso religioso
da época da Inquisição (com repetidas alusões ao "anticristo") e uma
linha argumentativa que lembra a propaganda nazista contra os judeus. No
caso, contudo, em vez dos judeus, o "inimigo" apontado é composto por
homossexuais, prostitutas, ateus, comunistas, "abortistas", usuários de
drogas e o governo Dilma. A partir dessa premissa, a publicação descreve
uma conspiração satânica internacional para a criação de uma "nova
ordem mundial" que pretende "se rebelar contra Deus" e "dominar a mente
do povo com a legalização das drogas", acusa o governo do PT de querer
legalizar a eutanásia para "matar os mais velhos" e o aborto para
provocar um "extermínio" e comercializar os órgãos dos fetos abortados.
O delírio é tal que a revista traz uma
tabela de preços do "mercado do feto" e diz que a legalização do aborto
provocará um aumento da pedofilia, porque as meninas estupradas serão
obrigadas a abortar para esconder o crime.
Nas páginas seguintes, a revista ataca a
regulamentação da prostituição, relacionando-a também, com extremo
cinismo e má fé, à pedofilia (como se o abuso sexual de crianças pudesse
ser equiparado à prostituição exercida por pessoas adultas); diz que a
criminalização da homofobia permitirá que os gays pratiquem sexo dentro
das igrejas; refere-se a gays, lésbicas e transexuais como doentes
mentais; ataca com argumentos igualmente toscos a proposta de
legalização da maconha e até diz que existe um plano do "anticristo"
para dominar a água e os alimentos.
Quase todas as páginas da
publicação são dedicadas a atacar meus projetos e os de outros
parlamentares progressistas e comprometidos com os direitos humanos,
embora não nos mencione expressamente. O principal alvo da publicação é o
governo Dilma, que seria, de acordo com a publicação, o principal
representante no Brasil da “rebelião mundial comandada por Satanás”.
A publicação faz uma relação direta
entre o "plano do anticristo" e as eleições de 5 de outubro: para
impedir a vitória do Demônio, os eleitores deveriam votar em Marina
Silva para presidenta e em Teixeira e Fonseca para os parlamentos
federal e estadual. Na última página, a publicação traz uma foto em
cores dos três candidatos, com a logo da campanha de Marina destacada no
centro.
A pergunta é: quem pagou por tudo isso?
Eu gostaria de saber se Marina
Silva sabe que seu nome está sendo usado nessa campanha suja. Fonseca é
candidato pelo PEN, uma legenda de aluguel de ultra-direita que faz
parte da coligação de Aécio Neves, da mesma forma que o partido
Solidariedade, formado por parlamentares que decidiram sair das legendas
pelas quais se elegeram, entre eles Teixeira. Ambos fazem parte,
também, da coligação estadual que apoia o governador Pezão, que por sua
vez é do PMDB, aliado à presidenta Dilma, mas que também faz campanha
por Aécio. Contudo, Fonseca e Teixeira fazem campanha por Marina — e
juntos, apesar de suas candidaturas proporcionais não estarem coligadas.
Além de ser incompreensível e
causar confusão a qualquer eleitor, essa esquizofrenia eleitoral também é
ilegal, já que um candidato proporcional (ou seja, a deputado federal
ou estadual) não pode citar em seus materiais de campanha o nome de um
candidato majoritário (ou seja, presidente ou governador) que não seja o
de seu partido ou coligação. Porém, para as gangues da velha política
corrupta do nosso querido país, vale tudo.
Será que Marina, ou sua
coordenação de campanha, concordaram com essa sujeira e "deixaram" que
ela fosse feita porque, na reta final, tudo o que servir para somar
votos é bem-vindo, mesmo que provenha do esgoto político?
Ou será que Fonseca e Teixeira
estão usando o nome de Marina sem a anuência dela porque acham que a
figura da candidata do PSB pode ser mais atraente para o eleitorado
evangélico fundamentalista que pretendem conquistar que o do liberal
Aécio?
Seja como for, Marina deveria se
perguntar por que o nome dela é associado a esse discurso fascista. Será
por que seu discurso, em vez de questionar, à esquerda, as falências do
governo Dilma, como muitos dos seus eleitores progressistas de 2010
esperavam, é cada dia mais reacionário, aproximando-a da linha
discursiva da revista Veja (que essa semana saiu em defesa dela), do
Círculo Militar (que se declarou esperançoso com a sua candidatura), dos
pastores que pregam discurso de ódio contra a população LGBT e dos
setores mais conservadores da sociedade, que podem se sentir
representados pela propaganda de Fonseca e Teixeira?
Marina deveria preparar um café,
sentar no sofá e, com calma, refletir sobre o que está fazendo ou sobre o
que estão fazendo com o nome dela. E você, eleitor, eleitora, deveria
pensar com qual Brasil você sonha. O fundamentalismo está aí, virando a
esquina, e dá medo."
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