08/10/2014
Minas tornou-se a pedra no meio da língua de Aécio. Quanto mais ele ataca Dilma e o PT, mais complicado fica explicar a derrota no seu estado.
Saul Leblon
Aécio Neves festejou a virada sobre Marina Silva, cujo encolhimento franqueou ao tucano a vaga de adversário de Dilma Rousseff no 2º turno da eleição presidencial deste ano.
A virada sobre a candidata do PSB, de fato expressiva (pesquisas de véspera davam a Aécio 21% das intenções de voto e ele chegou a 33,5%), precisa ser qualificada para não ser subestimada, nem mistificada.
Aécio cresceu menos por seus méritos, mais pela polaridade estabelecida entre Marina e Dilma, que praticamente monopolizaram o 1º turno.
Se o embate entre as duas deixou a candidatura tucana no limbo por um período, contribuiu também para preservá-la de um escrutínio mais duro de propostas e dissecação histórica.
À medida que Marina perdeu o magnetismo inicial, setores que a apoiavam migraram em debandada de volta a Aécio, que arrebanhou, ademais, os votos temerosos de uma vitória de Dilma no 1º turno.
Isso ficou nítido na votação significativa do tucano no quartel-general do conservadorismo brasileiro: no estado de São Paulo ele obteve mais de 10 milhões de votos, contra 5,9 milhões de Dilma.
Mesmo assim, a vantagem que Dilma leva agora para o 2º turno (41,5% × 33,5%, 8% e cerca de 8 milhões de votos) é muito semelhante à dianteira relativa e absoluta que carregou contra Serra, em 2010 (48% × 40%).
Se é óbvio que desfrutará do apoio uníssono do jornalismo isento, tucano não disporá mais do abrigo de ostracismo agora que personifica o polo antagônico do projeto de construção de uma democracia social no Brasil.
Não só.
Será difícil para quem se propõe a “consertar o país”, explicar por que os eleitores do seu estado natal, que vivenciaram essa habilidade ao longo de dois mandatos sucessivos do candidato, rechaçaram solenemente a sua continuidade no domingo, dia 5.
Aécio foi duplamente derrotado em Minas. Não qualquer dupla derrota.
O candidato do ex-governador foi derrotado logo no 1º turno da disputa estadual; não por uma margem estreita, mas por 52% contra 43%. E não por qualquer adversário: pelo PT.
O mesmo partido que ele acusa de haver demolido o Brasil e assaltado a Petrobrás.
Minas tornou-se a pedra no meio da língua de Aécio. Quanto mais ele ataca o PT, mais complicado fica explicar a sua derrota em Minas.
Como um partido tão ruim foi capaz de derrotar um ciclo tão bom de administrações comandadas por ele?
E para que não haja qualquer tentativa de confundir a derrota emblemática com questões locais, Minas enviou um segundo torpedo ao Brasil.
Embrulhado no ditado “só quem não conhece que te compra”, deu a Dilma 43,46% dos votos, contra 39,77% para Aécio Neves.
Nada disso deve ser confundido com otimismo ingênuo diante da virulenta batalha do 2º turno que começou na segunda-feira, dia 6.
Mas é preciso qualificar o adversário que o conservadorismo tentará vender nos próximos dias com o mesmo celofane da “unanimidade mudancista”, com que revestiu Marina Silva, quando ela chegou a ostentar 10% de vantagem no 2º turno sobre Dilma (50% a 40%).
Despida a mística do proficiente governador chega-se ao núcleo duro da disputa, aquilo que – realmente importa e está em jogo.
Serão três semanas de confronto duro entre dois projetos de país e duas estratégias de enfrentamento da crise mundial, que está longe de acabar.
Uma, preconiza desarmar a sociedade e amesquinhar o Estado. Liberado o campo – de que faz parte derrotar o PT – entrega-se a economia à lógica do arrocho, esfarelando direitos, empregos, renda e soberania, para dessa forma canalizar riqueza aos mercados encarregados de reordenar o país, a economia e os pilares do crescimento.
É a mesma lógica da “contração expansiva” (contração dos de baixo para abrir caminho à expansão dos do alto) aplicada na Europa há quatro anos, com os resultados sabidos.
A outra estratégia envolve uma obstinada negociação política das linhas de passagem para um novo ciclo de desenvolvimento.
Ancora-se em quatro patas: avanço da igualdade, salto na infraestrutura, impulso industrializantes do pré-sal e reforma política com democracia participativa.
Nessa repactuação de metas, prazos, concessões, sacrifícios, ganhos e salvaguardas, a voz dos mercados não poderá sem impor, nem abafar a da sociedade, que para isso requisita canais adicionais que a vocalizem.
Esse é o jogo, cujo 2º tempo começa agora.
Como diz Lula, não é o tipo do jogo que se ganha em gabinetes. Mãos à obra. E pés nas ruas.
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