Imagine esta história. Em depoimento, diretor de um banco internacional
revelou (!) que barões da mídia embolsaram US$ 10 bilhões para derrotar
Dilma Rousseff. Combinou-se mandar às favas o decoro, o ridículo. Uma
parte da bufunfa, aliás, serviu para imprimir cartazes tipo "Foda-se a
Venezuela", "Fora PT, queremos Cartier" etc., desde que empunhados por
sobrenomes endinheirados. Esse delator não apresentou provas — nem lhe
foram pedidas! — sobre a negociata.
O advogado do meliante disse desconhecer as declarações. Esse
jornalista, infelizmente, não tem condições de confirmar ou desmentir o
depoimento. Pouco importa: a eleição bate às portas. Sabe apenas que,
assim como um doleiro da moda, Alberto Youssef, tal diretor exibe um
prontuário parecido.
O executivo internacional, segundo rumores, já havia feito uma delação
premiada à época da crise de 2008. Aquela que incinerou no fogo do
desespero milhões e milhões de famílias pelo mundo afora. Para salvar a
pele, o diretor prometeu virar um santo. Mas o apego à roubalheira e à
patifaria foi mais forte do que ele... Diagnóstico semelhante ao do
Ministério Público sobre Youssef, reincidente de delações premiadas:
"Mesmo tendo feito termo de colaboração com a Justiça (...), Youssef
voltou a delinquir, indicando que transformou o crime em verdadeiro meio
de vida." Meio de vida!
Bem, na falta de medidas populares, tal história misturando ficção,
desejo e mentira explica boa parte da derrota de Aécio Neves. Lavra, ao
mesmo tempo, o atestado de óbito do pseudojornalismo difusor de
"notícias" sem nenhuma veleidade de investigar, apurar, checar —
respeitar o leitor. Por coincidência ou não, Ben Bradlee, o célebre
editor que conduziu as investigações de Watergate que derrubaram Nixon
nos EUA, morreu antes de presenciar momento tão degradante. Compare-se o
conjunto de reportagens daquela época e a tentativa desesperada de
criar agora, no papel, um novo atentado da rua Toneleros, que levou
Getúlio ao suicídio em 1954. É a mesma distância que separa o ar puro do
odor de esgoto.
Nada contra liberdade total para que mídias, conservadoras ou
progressistas, tragam à luz fatos comprovados e opiniões diversas. Mas
não incomoda perceber que, mesmo tendo em mãos o contraditório de Lula
às denúncias de Youssef, este não tenha sido levado ao ar no mesmo
Jornal Nacional da TV Globo a poucas horas da eleição? A triste
realidade: bandoleiros de gravata, travestidos de "bem informados",
tentam dar credibilidade a histórias oriundas de porões. A forma e o
conteúdo, mais uma vez, andaram de mãos dadas.
A vitória de Dilma traz outras lições. Movimentos populares despertaram
na reta final para assegurar conquistas. Essa fatura tem que ser paga
pelo novo governo, sob pena de esvaziar sua vitória. A política de
acender velas a Deus e ao Diabo já encontrou seu limite. No campo da
democracia, as desigualdades devem ser combatidas às custas dos que têm
mais. Inexiste outro jeito. E, para isso, é dispensável descer a
baixarias em restaurantes, espalhar boatos criminosos e a outros tantos
expedientes fartamente utilizados pela turma de azul. Basta recorrer ao
povo.
No que interessa à civilização, não se trata apenas de ganhar eleições. É
usar a vitória para melhorar a vida dos brasileiros. O país não está
dividido. Sempre esteve, e sempre o estará, enquanto predominar um
sistema baseado na sobrenomecracia, no dinheiro fácil e na valorização da usura sobre o trabalho.
Além do combate implacável à corrupção e de uma reforma política, a
tarefa de democratizar os meios de informação, sem dúvida, está na ordem
do dia. Sem intenção de censurar ou calar a liberdade de opinião de
quem quer que seja. Mas para dar a todos oportunidades iguais de falar o
que se pensa. Resta saber qual caminho Dilma Rousseff vai trilhar.
Ricardo Melo
No fAlha
Ainda do Blog CONTEXTO LIVRE.
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