Em uma eleição sem ânimo, desprovida de toda emoção esperável de uma
disputa pela Presidência da República, foi nas pesquisas eleitorais que
os cidadãos encontraram motivo para sentir alguma sensação mais densa.
Em duas ocasiões subsequentes. A primeira, com o pasmo ao deparar os
erros incompreensíveis das expectativas criadas pelas pesquisas finais. E
logo a segunda, a dúvida e a perda de confiança nas esperadas
pesquisas do segundo turno.
Há um mal-estar disseminado com as pesquisas. E, da outra parte, o que
tanto pode ser algo como descaso das entidades pesquisadoras, em
coerência com sua presunção de donos do saber oracular; como pode ser
compreensível dificuldade de proporcionar explicação convincente para os
erros.
Datafolha e Ibope foram excessivamente contidos sobre o que ocorreu ao
retratado neste título de o "O Globo": "Em nove estados, pesquisas longe
da realidade", e o complemento: "Datafolha de sábado e boca de urna do
Ibope tiveram imprecisões de mais de dez pontos percentuais". Ao
problema dos Estados, juntem-se as pesquisas finais e os resultados para
a Presidência.
No mesmo jornal, Mauro Paulino, diretor do Datafolha, fez uma
consideração valiosa sobre as pesquisas: "Até por marketing, nós mesmos,
dos institutos de pesquisa, tratamos esses números divulgados na
véspera da eleição como prognósticos, mas, na verdade, eles são
diagnósticos. Eles refletem uma realidade que já passou".
Não é fato, mesmo, que as pesquisas não sejam apresentadas como
previsão, como antecipação. E é por se apresentarem assim que suscitam
interesse, sempre, e ansiedade quando previstas. Há pouco adotaram mais
um elemento fortalecedor do modo como se apresentam, acrescentando um
"percentual de acerto": 95%! Para o público, pouco compreensível, mas
impressionante.
Ainda mais importante na caracterização dada às pesquisas eleitorais, é
dessa artificialidade que vem a sua influência modificadora do voto
original de muitos eleitores. Poder em geral negado pelos pesquisadores,
mas tão real que gerou, a partir de pesquisas remotas do Ibope, o
conceito e a prática do "voto útil".
A influência eleitoral das pesquisas recebeu reconhecimento implícito em
uma das possíveis causas, citadas na Folha (7.out, "Eleições 2014",
pág. 11), da diferença entre o último Datafolha e a votação para
presidente: (...) "a própria repercussão do resultado da pesquisa da
véspera nos telejornais de sábado à noite e nos jornais do domingo",
porque esta pesquisa trazia Aécio à frente de Marina.
O problema das discrepâncias se agrava por nada provar que as
transferências de votos se deram, de fato, nas últimas horas. É possível
que a inconsistência não estivesse no eleitorado, mas em partes das
pesquisas. Ou em ambos. Datafolha e Ibope já se desentendiam de longe e
em vários Estados, com a óbvia conclusão de que cada um já estava mais
certo ou mais errado aqui ou ali. Nada a ver, nessas diferenças às
vezes bastante grandes, com mudanças no eleitorado. Questão em aberto,
pois.
Deixar sobre todas as pesquisas as cautelas que algumas das empresas
pesquisadoras podem merecer é, sem dúvida, muito ruim para o eleitor. O
questionamento não é à moralidade, é a possíveis procedimentos e aos
resultados. Há, portanto, o que repassar e o que explicar, como a
confiança conquistada pelas principais pesquisas justifica. E há o que
pensar para que as futuras pesquisas se apresentem, em respeito ao
leitor/ouvinte, de maneira mais proporcional à dimensão tão relativa das
suas verdades.
Janio de Freitas
No fAlha
Mais uma vez do Blog CONTEXTO LIVRE.
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