quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Miguel Nicolelis fala sobre estudo publicado na Nature

Ilustraçao de Katie Zhuang
Estadão

O estudo publicado hoje na Nature demonstra com macacos que é possível recriar a sensação de textura através de microestimulação no córtex cerebral. Pode explicar como isso funcionaria em seres humanos?

A ideia é criar um sexto sentido. Ele vai possibilitar que o paciente recobre a sensação táctil ao usar uma veste robótica, podendo identificar o tipo de terreno que está pisando ou a textura de um objeto que segura com uma mão biônica. Nós treinamos o cérebro de dois macacos a aprender um novo código, para reconhecer texturas.

Como a nova descoberta será integrada à veste robótica que pode possibilitar que quadriplégicos voltem a andar?

A veste terá sensores de pressão que criarão um padrão, e esse padrão será traduzido em um estímulo elétrico proporcional a textura dos terrenos ou objetos. Tudo isso é entregue ao cérebro, que funciona como um reconhecedor de padrões e associa a nova sensação. Partindo da mesma lógica, outras pesquisas podem levar identificação da temperatura, por exemplo, tornando as próteses biônicas mais sensíveis.

O nosso experimento provou pela primeira vez que é possível criar uma interface cérebro-máquina-cérebro, possibilitando que criemos um exoesqueleto robótico para que pacientes paralisados possam receber feedbacks do mundo exterior e com isso recobrarem a sensação táctil através de sensores. Já havíamos feito uma previsão teórica de que isso era possível, mas ainda não havíamos feito uma demonstração que provasse, e isso muda com o estudo publicado na Nature. Vencemos um grande desafio tecnológico: os estímulos são enviados ao cérebro ao mesmo tempo em que registramos a atividade elétrica do córtex. Ao mesmo tempo que os sinais elétricos do cérebro podem ser usados para controlar o avatar do corpo, o órgão pode receber um feedback do que esse avatar encontra no espaço virtual.

Na pesquisa, os macacos controlaram com os sinais elétricos dos seus cérebros um cursor em um tela, que movimentaram e usaram para indicar padrões de textura. Houve algum estranhamento dos animais na interação direta com o computador?

Pelo contrário. Agora nós temos a evidência de que os animais assumem esses corpos virtuais como se fosse o corpo deles. Em poucos minutos eles já sentem que estão habitando esse novo corpo. Eles conseguiram identificar os padrões muito rapidamente, por isso acreditamos que seres humanos devem ter uma resposta ainda mais rápida. O cérebro gera um modelo que incorpora todas as ferramentas que ele usa e molda o corpo que é reconhecido como sendo próprio. Temos a confirmação disso com esse estudo, pois o animal passa a usar o corpo virtual realmente como se fosse o deles.

O que tudo isso muda no projeto Walk Again e no plano de fazer um tetraplégico dar o pontapé inicial da Copa do Mundo de 2014?

Estou propondo ao governo e tenho sinalização de eles querem participar de um projeto de seis anos para demonstrar o projeto Walk Again para o mundo, envolvendo a Copa do Mundo e as Olimpíadas a ser realizadas aqui no Brasil. Queremos fazer demonstrações gradualmente mais complexas do exoesqueleto robótico desenvolvido no Walk Again e que fará um tetraplégico voltar a andar.

Quais os próximos passos para a concretização do projeto?

O governo federal deve anunciar nos próximos dias um apoio para trazermos o projeto para Natal, para Campus do Cérebro. Lá nós já temos um avatar realístico do corpo completo de um macaco, agora teremos que criar um modelo igual para o ser humano. Com ele poderemos e treinar os pacientes quadriplégicos a interagir com um avatar do corpo. Será como o 'Flight Simulator' (jogo de simulação e treino para pilotos de avião) do avatar que será usado depois pela pessoa.

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