Por Cid Benjamin(*)
1. O aumento das passagens de ônibus foi
o detonador de uma insatisfação represada com o governo estadual e a
prefeitura. Coisas como as maracutaias vinculadas à Copa do Mundo, a
entrega da cidade às odebrechts e eikes da vida, os serviços públicos de
péssima qualidade, a sensação de que Cabral e Paes enriquecem fazendo
negócios no governo, tudo isso acabou explodindo quando do aumento das
passagens. Lembremo-nos de que o processo que culminou na passeata dos
Cem Mil, em 1968, começou com a luta na universidade por mais verbas
para o ensino público (na época ainda não havia isso de o governo
financiar faculdades privadas, comprando bolsas de estudo). A repressão
policial ajudou a politizar o movimento, num quadro em que a
insatisfação com a ditadura já era intensa.
2. É ridículo a imprensa falar em mil ou
dois mil manifestantes ontem. Embora estivesse na passeata, não tive
uma visão de conjunto dela, mas é evidente que havia entre cinco e dez
mil pessoas quando o cortejo chegou à Cinelândia.
3. A manifestação foi organizada à
revelia dos partidos políticos e, muito mais ainda, das entidades que
tradicionalmente organizam as lutas dos jovens. Aliás, me pareceu
patético que a UNE, transformada numa entidade chapa-branca, tenha
estendido, no fim da passeata, uma faixa na escadaria do Teatro
Municipal em apoio ao movimento. Ela é inteiramente aparelhada por um
partido que apóia integralmente Paes e Cabral, e ocupa cargos de
importância em seus governos. Aliás, penso que, se a UNE continuar nesse
processo de apelegamento, vai ser inevitável o surgimento de outras
entidades de representação estudantil, a exemplo do que ocorre no
movimento sindical.
4. Foi um erro grave parte da
manifestação ter seguido até a Alerj. Ao chegar à Cinelândia, o recado
tinha sido dado, com sucesso absoluto e sem qualquer problema com a
polícia. Alguém no carro-de-som, certamente empolgado com o sucesso, pôs
em votação a esticada da passeata. A proposta venceu, mas mesmo quem
votou nela não prosseguiu. No grupo menor que continuou, os provocadores
(que, a serviço ou não de órgãos policiais, estavam desde o início, mas
até então não tinham tido espaço para agir) cometeram vandalismos. Era o
que a PM queria para reprimir e o que os jornais esperavam para dar
destaque nas matérias de hoje. Basta ver a edição de hoje do Globo.
5. O movimento está crescendo e comporta
um desdobramento semana que vem. Acho que outra manifestação lá para o
meio da semana pode levar às ruas mais de dez mil pessoas. Mas penso que
é preciso uma proposta clara para ser apresentada à prefeitura. Algo
como, por exemplo, a suspensão do aumento e a abertura da contas das
empresas de ônibus para que seja feita uma auditoria independente, que
apresente seus resultados em, digamos, 60 dias.
*Cid Benjamin é jornalista e foi preso político durante a ditadura.Do Blog Quem tem medo da democracia?
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