domingo, 30 de junho de 2013

“Chega”, de Seu Jorge, é a pior canção de protesto de todos os tempos?

As manifestações ficaram órfãs de uma boa música-tema (o que talvez não seja uma má notícia).
 
Nenhuma música captou o espírito das manifestações.
A que ficou mais vinculada a elas, ironicamente, é um jingle da Fiat cantado por Falcão, do Rappa. “Vem Pra Rua” foi composta para a Copa das Confederações, portanto, antes das passeatas. Acabou ligada, de alguma maneira, aos protestos – mas não que fosse a trilha sonora de fato. Na verdade, se as multidões entoavam algum verso, eram os do Hino Nacional e olhe lá.
Na tentativa de ocupar esse espaço, Latino compôs “O Gigante Acordou”. Padrão Latino, ou seja, abaixo da crítica. Apesar disso, ninguém bate o trio formado por Seu Jorge, Gabriel Moura e Pretinho da Serrinha. Na quarta-feira, 26 de junho, eles lançaram no YouTube “Chega (Não é Pelos Vinte Centavos)”.
Não é só o timing que é equivocado. A composição é um primor de falta de noção. Desde Agepê ninguém rimava “respeito” com “direitos”, “cara” e “rara”, “saúde” e “atitude”, “impunidade” e “desigualdade” com essa desfaçatez.
Seu Jorge e Moura eram colegas no grupo Farofa Carioca, banda cult elogiada sobretudo por quem nunca a ouviu. Pretinho da Serrinha, novo protegé de Caetano Veloso, parece constrangido entre os dois colegas. É evidente que, apesar de seus esforços, eles não entenderam o que aconteceu – e, se bobear, assistiram as manifestações da sala do apartamento.
Como no caso de Pelé, que entrou de forma desastrada no debate, alguém podia tê-los aconselhado a ficar calados: “Olha, legal a ideia, bonita a intenção, mas o momento já é outro. Não dá pra mandar todo mundo pra rua se o pessoal está voltando pra casa. É ou não é, galera? Que tal o ‘Samba do Impeachment’? Hem, hem?”. Num caso extremo de ninguém concordar, talvez fosse o caso de quebrar um cavaquinho e simular um enfarto.
“Chega” é a pior canção de protesto de todos os tempos. Falta-lhe de tudo um pouco: uma letra que retrate de modo original o que acontece no Brasil; uma melodia assobiável; uma boa interpretação; a hora certa.
Esse movimento não consagrou nenhuma canção. Não houve uma “Pra Não Dizer que Não Falei das Flores”, uma “Vai Passar” ou algo do tipo. Não chega a ser, obviamente, um problema. Além do mais diante das alternativas apresentadas.
Kiko Nogueira
No DCM

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