A RESPOSTA É MAIS DEMOCRACIA
Não enxergar o elo entre as ruas e o ciclo histórico costuma
ser
fatal às lideranças de uma época. Acreditar que o elo, no caso dos
recentes protestos em São Paulo, está no aumento de 20 centavos sobre
uma tarifa de transporte congelada desde janeiro de 2011, é ingenuidade.
Supor que a ordenação entre uma coisa e outra poderá ser restabelecida
à base de cassetetes e pedradas é o passaporte para o desastre.
Desastre progressista, bem entendido. A lógica conservadora nunca
alimentou dúvidas existenciais ou políticas quanto a melhor forma de
manter o caos nos eixos. O colapso do trânsito, inclua-se nesse
desmanche o custo e o tempo despendidos nos deslocamentos, é o
termômetro mais evidente de um metabolismo urbano comatoso. Cerca de 1/3
dos paulistanos, aqueles mais pobres, residentes nas periferias
distantes, levam mais de uma a até mais de duas horas no trajeto da casa
ao trabalho. Os tempos indicados são referentes à ida; não consideram
o gasto no retorno. Não se produz uma irracionalidade desse calibre sem
um acumulo deliberado. O Brasil tem a taxa de urbanização mais alta
em uma América Latina que lidera o ranking mundial, diz a ONU. Isso se
fez sob a chibata de uma ditadura militar e não poderia ter sido feito
exceto assim. Não é figura de retórica dizer que esses ingredientes
acionam o pino de cada bomba de gás lacrimogênio e faíscam o pavio de
cada enfrentamento irrefletido nas batalhas campais registradas em São
Paulo nos últimos dias. Carta Maior saudou a vitória de Fernando Haddad
em 2012 por entender,como entende, que ele representa o resgate do
cimento da democracia na reconstrução de São Paulo. O trunfo do
prefeito é ter sido eleito para isso. Ele tem legitimidade para subtrair
espaços à engrenagem opressora e devolve-los a uma cidadania há muito
alijada das decisões referentes ao seu destino e ao destino do seu
lugar. A capacidade de erguer essas linhas de passagem terá um peso
decisivo nas disputas em curso na vida brasileira. (LEIA MAIS AQUI)
Em dia de maior repressão da PM, ato em SP termina com jornalistas feridos e mais de 60 detidos
Rodrigo Vianna: A baderna é da polícia!
Qual o nome para o que a Polícia Militar fez em São Paulo durante mais
uma manifestação contra o aumento das passagens de ônibus e metrô?
Proibiu carros de som e megafones nas ruas, agrediu jornalistas e
fotógrafos, encurralou manifestantes, atirou bombas a esmo, pisoteou a
Democracia.
Desacostumado com manifestações públicas, o brasileiro aceitou a versão
da velha mídia, após os atos da semana passada, que classificou os
manifestantes como simples “baderneiros”?
Dessa vez, quem tentou impedir uma manifestação pacífica em São Paulo?
Como se pode nomear as cenas protagonizadas pela polícia (e devidamente
registradas e espalhadas em tempo real pelas redes sociais)? Baderna ou
barbárie?
A polícia tentou cercear o direito à manifestação. Atacou a liberdade de
expressão. Isso se chama “subversão”. Sim, a PM paulista subverteu a
ordem democrática.
A Polícia Militar foi baderneira e subversiva!
E pra completar: manifestantes foram presos com base numa lei que trata
ativistas sociais como “quadrilheiros”. O mais chocante: o PT e outros
partidos de esquerda, as centrais sindicais mais representativas e os
movimentos sociais importantes estão ignorando a garotada que foi pra
rua enfrentar a barbárie. É preciso dizer: não aceitamos que o
governador de São Paulo trate manifestantes como “quadrilha”. Movimento
social não é quadrilha. O próximo passo, disse-me há pouco o colega
blogueiro Renato Rovai, é tratar movimento social como “terrorismo”.
Aliás, acompanhe cobertura ao vivo da Revista Fórum, sob coordenação do Rovai.
Alckmin tenta se cacifar junto a conservadorismo paulista. Ele sabe bem o
que está fazendo. É chocante ouvir por aí – na classe média
supostamente bem educada – que “essa gente tem é que levar borachada”. É
a base alkmista. Mas o mais chocante é perceber que o petismo e as
bases lulistas ficam sem saber o que dizer. Talvez à espera do sinal dos
“líderes”, à espera dos cálculos que submetem tudo, absolutamente tudo,
à lógica eleitoral.
Humildemente, lembro que há questões inegociáveis. E uma delas é o
direito à manifestação. Ah, mas esses atos são convocados por
“radicalóides” do PSTU e do PSOL! Então, façamos com que sejam mais do
que isso, mais amplos. Ah, mas há provocadores que vão pra rua depredar e
atirar pedras! Ora, desde que o mundo é mundo, isso é assim. Não há
manifestação com mais de 2 mil ou 3 mil pessoas em que não surja gente
disposta apenas a tumultuar.
Mas volto a insistir. Manifestação não é baderna, nunca foi e nunca
será. Baderna, isso sim, é polícia que dá tiro em manifestante
ajoelhado, baderna é governador usar a cavalaria na avenida Paulista,
baderna é partido de esquerda (ou, ao menos, com bases de esquerda)
submeter-se à lógica eleitoral e não vir a público denunciar o fascismo
social que se tenta implantar em São Paulo.
Isso tudo, sim, é baderna pura! É um Pinheirinho no centro de São Paulo. Um Pinheirinho na avenida Paulista.
Há erros na ação dos manifestantes? Parece que sim. Mas há um mérito
inequívoco na atitude deles: retirar da letargia jovens que, na última
década, foram acostumados com a idéia de que nenhuma ação coletiva faz
sentido.
Nenhum comentário:
Postar um comentário